• Marcia Carmo
  • De Buenos Aires para a BBC News Brasil

Crédito, EPA/Carlos Ortega

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Gustavo Petro foi eleito presidente da Colômbia com 50,50% dos votos no segundo turno

A esquerda e centro-esquerda se uniram, pela primeira vez, para que Petro, que era candidato à Presidência pela terceira vez, chegasse ao palácio presidencial.

Segundo analistas, o ineditismo da derrota da direita no país marca uma guinada política na Colômbia, iniciada com os protestos de 2019 e 2020.

O outro candidato, o empresário do setor da construção Rodolfo Hernández, da Liga de Governantes Anticorrupção, recebeu 47,3% dos votos.

Crédito, EPA/Mauricio Duenas Castaneda

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Petro será o primeiro presidente de esquerda do país

No seu discurso da vitória, o presidente eleito ratificou sua proposta de realizar um acordo nacional com as diferentes linhas políticas do país, incluindo a extrema direita.

Petro convidou os eleitores de Hernández para que o visitem na Presidência, chamada de ‘Casa de Nariño’ (leia-se Casa de Narinho).

“Fazer a paz na Colômbia significa que os mais de dez milhões de eleitores de Hernández são benvindos. Não vamos trabalhar destruindo o opositor. Todos serão ‘benvindos’ para dialogar no palácio presidencial”, disse Petro.

Seus eleitores reagiram gritando: “Não à guerra”.

Ele entende que somente através “do diálogo, do amor e sem ódio e vingança” será possível realizar as reformas necessárias para que o país seja mais igualitário e inclua também os indígenas, os afrodescendentes (como sua vice-presidente, Francia Márquez) e os que foram e são vítimas da violência.

O professor colombiano de políticas públicas e internacionais da Universidade de Columbia, dos Estados Unidos, José Antonio Ocampo, acredita que este “acordo nacional” é decisivo.

“Esperamos e devemos apoiar o acordo nacional (que Petro propôs). O acordo é essencial para que sejam superadas as profundas divisões sociais e regionais dos últimos anos e deste processo eleitoral colombiano”.

Reforma agrária e sem petróleo

Petro pretende implementar a reforma agrária, desacelerar a produção de petróleo e de carvão e ampliar as energias limpas.

Suas ideias contam com respaldo dos seus simpatizantes, mas também com a rejeição do setor empresarial (e petroleiro) que associa suas iniciativas “à cartilha da esquerda dos anos setenta”, como disse um deles.

A Colômbia não é, como a sua vizinha Venezuela, um país petroleiro, como observou o professor de economia da universidade Javeriana, de Bogotá, Jorge Restrepo, mas é, disse o analista, “dependente” dos recursos financeiros gerados pela produção do combustível fóssil.

Este promete ser um dos grandes debates da Colômbia na era Petro-Francia e que já está sendo acompanhado com atenção pelos investidores e mercados financeiros.

A eles, o presidente também tem dito que as mudanças serão feitas através do diálogo e “não expropriará empresas” e “respeitará a Constituição”.

Petro, porém, tem dito que não é de esquerda, mas que sua política é “política da vida”. Alguns setores o definem como sendo de centro-esquerda ou “socialdemocrata do século 21”. Ele diz que é capitalista, mas com a consciência da importância dos cuidados com o meio ambiente e os efeitos do clima.

Para críticos e opositores, o desafio de Petro, de 62 anos, será mostrar que sua vida de guerrilheiro ficou há muito tempo para trás, quando era jovem nos anos 1980.

Crédito, EPA/Pablo Rodriguez

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Eleitor de Gustavo Petro celebra eleição com bandeira do grupo guerrilheiro M-19

Dois dias antes do segundo turno da eleição presidencial, a tradicional revista Semana, de Bogotá, publicou na sua capa: “Ex-guerrilheiro ou engenheiro?”, em referência as opções do eleitorado entre Petro e Hernández, que é engenheiro civil.

O presidente eleito reagiu à capa, dizendo: “quero lembrar que sou economista”.

Guerrilheiro do grupo M-19, quando tinha pouco mais de vinte anos, ele conta que, na época, foi preso e torturado. Era quando usava o pseudônimo de “Aureliano”, inspirado em um dos personagens do livro Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Márquez.

Em 2016, Petro apoiou o acordo de paz que levou grande parte da guerrilha a entregar as armas, após 50 anos de conflito.

Mas, apesar de sua trajetória política, de ter sido prefeito de Bogotá e senador e de seus diplomas em economia com especializações em meio ambiente e administração de empresas, seus opositores e críticos continuam ressaltando aquele seu período na guerrilha.

Um dos maiores desafios do novo presidente será a negociação que terá de conduzir no Congresso Nacional para realizar as mudanças que planeja. A expectativa do seu eleitorado é grande, observam analistas. Outro será o de lidar com a criminalidade e a violência policial. No seu discurso de vitória, uma mãe apareceu ao seu lado, no palanque, carregando a foto de um filho jovem morto.

‘Invisíveis’

Crédito, REUTERS/Vannessa Jimenez

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Francia Márquez é a primeira afrodescendente a chegar ao cargo de vice-presidente no país

A Colômbia, como o Brasil, foi um porto de intenso desembarque de pessoas escravizadas. Petro disse que a população negra (cerca de 10% do país), os indígenas (várias comunidades) e os mais pobres terão atenção especial em sua gestão.

Em seu discurso de vitória, a vice-presidente eleita Francia Márquez, primeira afrodescendente a chegar ao posto, enfatizou o lema de inclusão do novo governo e disse que a Colômbia, depois de 214 anos, terá um governo voltado aos “invisíveis”.

A atual taxa de desemprego do país é de 12%. A conjuntura econômica e social inclui a preocupação crescente dos colombianos com a inflação. Até abril do ano passado, a inflação anual era de 1,8%. Em abril deste ano, o índice foi de quase 10%.

A alta de preços está entre as principais preocupações dos latino-americanos, após a pandemia do coronavírus e da invasão da Rússia na Ucrânia.

Mas antes mesmo da pandemia, como ocorreu no Chile, no Equador e em outros países da região, a Colômbia viveu ondas de protestos que evidenciaram a insatisfação dos colombianos.

Insatisfação que acabou refletida nas urnas, com a exclusão, do segundo turno da eleição, dos partidos tradicionais de direita e centro-direita que governaram o país durante décadas.

Administrar esta herança econômica deixada pelo atual presidente Iván Duque, de direita, será outro dos grandes desafios de Petro.

Amazônia

No âmbito internacional, a expectativa é de que Petro retome as relações diplomáticas da Colômbia com a Venezuela – os demais candidatos tinham prometido o mesmo. A Colômbia é um dos principais países de chegada de venezuelanos e os dois países têm, historicamente, um forte fluxo comercial.

Na seara externa, Petro já disse que buscará uma relação diferente com os Estados Unidos, com quem a Colômbia tem acordo de livre comércio e há anos compartilha sua política de combate às drogas.

Petro anunciou que também pretende incluir a questão do meio ambiente na agenda da relação com os Estados Unidos.

Para ele, a Amazônia (também colombiana) é um assunto regional, assim como a necessidade de políticas conjuntas contra a mudança do clima.

O presidente eleito da Colômbia acha que os colombianos devem enfatizar que são latino-americanos e aumentar a relação com seus vizinhos.

Mas um analista ressaltou que na Colômbia as classes mais favorecidas sempre estiveram mais ligadas aos Estados Unidos – e que esta é uma relação que não deveria ser alterada. Outro desafio para Petro, Francia e sua equipe.

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