- Alex Christian
- BBC Worklife
Quando o profissional de RH Chris foi procurado por uma empresa concorrente do setor de energia para liderar um novo projeto de administração, ele considerou que seria uma mudança de carreira que ele não podia recusar.
“Minha empresa atual ainda não estava pronta para isso”, afirma Chris, que mora em Calgary, no Canadá. “Era uma grande oportunidade de ganhar experiência fazendo algo que não teria sido possível de outra forma.”
A mudança ocorreu em 2020 e tudo saiu bem. Chris — cujo sobrenome é omitido para garantir sua segurança no emprego — assumiu o cargo e comandou o projeto. E, nos dois anos que se seguiram, ele acumulou técnicas e conhecimento mais profundos que o ajudaram a avançar rapidamente na carreira.
Até que, com um cargo mais alto e salário maior, Chris estava pronto para um novo desafio — que ele encontrou no seu antigo empregador.
Em 2022, ele se tornou um funcionário “bumerangue”, ao retornar para a mesma empresa de antes, mas em um cargo superior ao que ele tinha quando saiu.
Na verdade, foi uma promoção. “Fui convidado a voltar para um cargo maior e mais amplo devido às experiências que consegui ganhar nos dois anos em que estive fora”, explica ele.
Nos meses após o seu retorno, Chris afirma que conseguiu manter bom desempenho no cargo superior desde o início, devido ao seu conhecimento institucional.
Em vez de um passo para trás, voltar ao seu antigo ambiente de trabalho fez avançar sua carreira, permitindo alavancar redes de contato e relacionamentos pré-existentes na sua empresa, explorando ao mesmo tempo as experiências adquiridas na outra companhia.
“Foi ótimo — é como andar em uma bicicleta maior e mais incrementada, com mais recursos”, explica ele. “Eu saí inicialmente, não porque não gostasse do meu empregador; eu vi a chance de subir mais rapidamente e aproveitei.”
A maioria das pessoas que sai de um emprego termina definitivamente seu relacionamento com a empresa, mas nem sempre este é o caso. Na verdade, após a Grande Renúncia (a tendência que levou um grande número de profissionais americanos a deixar seus empregos durante a pandemia de covid-19), vem disparando o número de pessoas retornando para seus antigos ambientes de trabalho, como funcionários “bumerangues”.
Algumas empresas estão até incentivando essa prática, com redes de ex-funcionários especialmente projetadas para recontratações. E, embora o retorno a um cargo anterior possa ser motivado pelo arrependimento, em casos como o de Chris, é simplesmente a decisão lógica a ser tomada.
Como esses funcionários já saíram da empresa uma vez, faz sentido que eles retornem? E se as empresas começarem cada vez mais a tentar recontratar antigos funcionários, aonde isso nos levaria em relação à evolução do mercado de trabalho?
O aumento da recontratação
Décadas atrás, as empresas se ouriçavam com a simples ideia de recontratar antigos funcionários, especialmente com a estigmatização enraizada sobre funcionários que pulam de um emprego para outro.
“Algumas empresas tinham políticas formais proibindo as recontratações”, segundo J. R. Keller, professor de estudos de recursos humanos da ILR School da Universidade Cornell, em Nova York, nos Estados Unidos.
“Os gerentes responsáveis pelas contratações acreditavam que trazer esses funcionários de volta indicava que eles estariam recompensando a deslealdade e incentivaria outros empregados a sair.”
Mas as enormes reduções de pessoal depois da recessão no início dos anos 1980 abalaram essa mentalidade. Movimentar-se estrategicamente pelo mercado de trabalho para progredir na carreira tornou-se algo mais comum, segundo Keller.
“Quando se tornou padrão construir carreiras em diferentes empresas, os próprios gerentes de RH começaram a mudar de emprego ao longo do tempo”, conta ele.
“Por isso, menosprezar um grande candidato, simplesmente porque ele havia saído anteriormente para uma oportunidade melhor, parecia contraproducente.”
Essa mudança de mentalidade fez com que as recontratações aumentassem ao longo dos anos. Mas a Grande Renúncia fez surgir um pico.
No Reino Unido, dados da plataforma LinkedIn analisados pela BBC demonstram que 5% de todas as novas contratações em 2021 foram de ex-funcionários retornando. E, nos Estados Unidos, uma análise de cerca de 32 milhões de históricos profissionais de membros da rede social LinkedIn demonstra que esses profissionais representaram 4,3% de todas as contratações no ano passado, contra 2% em 2010.
E a velocidade desse fenômeno também é crescente. O profissional “bumerangue” americano levou em média 17,3 meses para retornar a um antigo empregador em 2021, contra 21,8 meses em 2010.
Keller afirma que o crescimento pode ser atribuído, em parte, à recente agitação do mercado de trabalho. Em alguns casos, maior rotatividade geralmente indica que mais profissionais agora querem seus antigos empregos de volta ou estão interessados em retornar para um antigo empregador.
Em uma pesquisa realizada em 2022 pela empresa de recrutamento Robert Half, 29% dos empresários britânicos consultados relataram aumento do número de ex-funcionários pedindo para voltar para sua antiga empresa.
“Alguém pode ter saído de uma empresa e percebido que a grama do vizinho não é mais verde, ou ter sido forçado a sair por razões pessoais decorrentes da pandemia”, explica Keller. “Por isso, eles querem voltar ao cargo que ocupavam antes com bom desempenho e que eles apreciam ainda mais depois de passar um tempo fora. E, com as redes sociais, é mais fácil manter contato com um antigo patrão do que antes.”
Embora alguns profissionais tenham ficado com saudades dos seus antigos empregadores após a Grande Renúncia, a crise de contratação que se seguiu coincidiu com a busca de novos talentos pelos recrutadores, para preencher as vagas existentes. E, cada vez mais, as empresas se voltam para seus ex-funcionários.
Nicola Thomas, gerente de talentos da agência de marketing digital iCrossing, com sede em Brighton, no Reino Unido, afirma que acompanha ativamente seus antigos funcionários como fonte de recrutamento.
“Antes da crise de contratação, os ‘bumerangues’ não eram totalmente descartados, mas, agora, os recrutadores precisam pensar em novas formas de ampliar sua busca por talentos”, afirma ela. “O candidato perfeito pode muito bem ser um ex-funcionário; você nunca sabe quando alguém vai querer voltar”.
O porquê do retorno
Em alguns casos, os profissionais podem encurtar o caminho até o topo simplesmente ganhando uma promoção em outro lugar, para depois voltar para a empresa anterior com um cargo melhor e salário mais alto do que eles teriam se tivessem apenas permanecido.
“Se um ex-funcionário tiver saído de forma positiva, passado algum tempo fora e adquirido maiores conhecimentos e experiência em outro lugar, retornar para um cargo superior torna-se uma forte possibilidade”, afirma Thomas
Um desses profissionais é o diretor de otimização de mecanismos de busca da agência de marketing digital iCrossing, Cameron Lyall. Ele deixou a empresa por um curto período para chefiar um departamento em uma empresa concorrente, até retornar em cargo superior.
“O emprego não era o que eu esperava. Logo percebi que não tinha muitas oportunidades de progresso”, explica ele. “Por isso, entrei em contato com meu antigo gerente e perguntei se haveria uma oportunidade de voltar. Eu sabia que estavam sendo abertos novos cargos e tive a sorte de voltar em um cargo um pouco acima do que eu tinha quando saí.”
Além do progresso na carreira, Lyall acrescenta que voltar trouxe benefícios psicológicos. Ele é grato por estar de volta a um emprego do qual ele gosta.
“Eu realmente me senti energizado ao voltar. Retomei os mesmos clientes e contas que antes, mas com a visão renovada de como eu gostava de trabalhar na empresa”, diz.
Do ponto de vista de recursos humanos, contratar ex-funcionários em cargos superiores pode fazer sentido, financeiramente ou para a logística da empresa.
A pesquisa de Keller com mais de 2 mil funcionários “bumerangues” em uma empresa americana de assistência médica em 2021 demonstrou que o desempenho dos “bumerangues” superou de forma consistente o dos contratados externos, com benefícios mais evidentes nos dois primeiros anos da recontratação.
“Os ‘bumerangues’ podem ter bom desempenho a partir do momento em que chegam”, afirma Thomas.
“Eles já trabalharam para você, entendem sua cultura e seus valores e, provavelmente, têm também relacionamentos existentes dentro da empresa.”
O professor de administração John Arnold, da Universidade do Missouri, nos Estados Unidos, afirma que esse tipo de contratação faz sentido em cargos que, muitas vezes, exigem profundas qualificações e conhecimentos especializados, como a área de tecnologia.
“Se uma empresa concentrar-se em contratar apenas bons ‘bumerangues’ e eles voltarem e apresentarem bom desempenho rapidamente, é uma grande vantagem — particularmente em setores com grande curva de aprendizado que exige muito tempo e treinamento”, explica Arnold.
Onde a mudança pode falhar
A recontratação pode geralmente parecer uma situação na qual todos ganham — o empregador e o funcionário que retorna. Mas a transição nem sempre é perfeita.
Para os profissionais que ficaram na empresa enquanto os colegas saíram, um ex-funcionário que retorna imediatamente para um cargo superior ou com salário mais alto pode prejudicar os ânimos.
“Nós não sabemos como os atuais funcionários reagirão à chegada dos ‘bumerangues’ à sua equipe, se poderá haver um sentimento de inveja que prejudique o apoio ou a ajuda”, afirma Keller.
E um funcionário que saiu para se afastar dos desafios da organização pode encontrar-se enfrentando os mesmos problemas que havia quando ele saiu, segundo Arnold.
A pesquisa de Arnold indicou que os funcionários “bumerangues” muitas vezes deixam seus empregos pelos mesmos motivos.
“Quando esses ‘bumerangues’ saem [da empresa] pela segunda vez, muitas vezes eles fornecem a mesma razão de antes”, explica ele.
“Às vezes, os profissionais acreditam que tudo será melhor na segunda vez, mas não é necessariamente o que acontece.”
Os profissionais “bumerangues” também costumam receber menos atenção. Retornar a um antigo empregador significa que existe maior pressão por desempenho em comparação com os recém-chegados.
“Os funcionários ‘bumerangues’ geralmente tendem a ter melhor desempenho, mas também são mais propensos a serem demitidos que os contratados externos — os gerentes esperam que ele conheçam a empresa assim que chegarem”, afirma Keller. “Enquanto os recém-chegados podem receber o benefício da dúvida, o recontratado que não atender às expectativas provavelmente será dispensado.”
Pode também existir uma janela de tempo limitada para retornar a um emprego. Os gerentes responsáveis por contratações podem receber funcionários depois de alguns anos fora da empresa, mas Thomas afirma que existe também um ponto de não retorno para os ex-funcionários.
“Quanto mais tempo houver passado desde a saída do candidato, maior a probabilidade de que ele esteja apegado a práticas mais antigas”, segundo ela. “A empresa pode ter mudado nesse período e agora ser uma organização onde ele não será mais capaz de adaptar-se.”
Implicações de longo prazo
Nicola Thomas afirma que tem havido uma mudança de geração no posicionamento das empresas com relação à estabilidade dos funcionários. E, por sua vez, os empregadores estão cada vez mais deixando a porta aberta para os funcionários que saem, um dia, poderem retornar.
“As pessoas agora querem ter experiência em diferentes empresas e subir a escada da carreira o mais rápido possível”, segundo ela. “Em um mundo onde existem mais cargos altamente técnicos com conhecimentos específicos, existe um limite para a quantidade de pessoas que você pode considerar — e descartar antigos funcionários pode significar a perda de uma enorme oportunidade.”
J. R. Keller afirma que o possível constrangimento causado pelo retorno ao emprego está diminuindo, tanto para o empregador quanto para o funcionário.
“À medida que vemos maior abertura entre as empresas para contratar ‘bumerangues’, também haverá menos estigmatização, do ponto de vista do funcionário, no seu retorno para um antigo empregador”, explica ele.
Keller acredita que, ao longo do tempo, esse tipo de funcionário ganhará mais importância no mercado de trabalho e será uma fonte de contratação mais relevante.
“A compreensão agora é que todos estão procurando melhores oportunidades”, afirma ele. “Se uma companhia quiser os melhores profissionais e, por acaso, eles forem ex-funcionários, elas devem abrir-se para eles.”
A forma como alguém sai de uma empresa define, em grande parte, o sucesso do seu retorno. Chris e Lyall, dois funcionários “bumerangues”, salientam a importância de sair de uma empresa em bons termos.
“Para ter sucesso, é importante não fechar nenhuma porta e manter uma relação forte e positiva [com os ex-empregadores]”, acrescenta Chris. “Voltar pode definitivamente fazer avançar uma carreira.”
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