Crédito, Mark Dyer

Legenda da foto, Muriel era casada com Alick McKay, que era vice de Rupert Murdoch

  • Author, Laurence Cawley, Jane MacSorley e Simon Farquhar
  • Role, BBC Investigations

A família de uma mulher que foi sequestrada e assassinada, mas cujo corpo nunca foi encontrado, conta que viveu a tortura de “mil mortes” após o desaparecimento dela.

Confundida com a então esposa de Rupert Murdoch, Muriel McKay foi levada de casa em Wimbledon em 1969 e mantida refém em Rooks Farm, em Hertfordshire, na Inglaterra, com um pedido de resgate de £ 1 milhão (ou cerca de R$ 7 milhões na cotação atual).

Às vésperas de uma nova escavação em busca dos restos mortais de Muriel começar esta semana, os filhos falaram sobre a “tortura” que viveram após o desaparecimento da mãe e das ligações incessantes de jornalistas, simpatizantes e trotes.

Arthur Hosein, que era o dono da Rooks Farm, e o irmão mais novo, Nizamodeen Hosein, foram posteriormente condenados à prisão perpétua pelo sequestro e assassinato de Muriel.

Em entrevista a Jane MacSorley e Simon Farquhar para o novo podcast da BBC Radio 4, Intrigue: Worse Than Murder (Intriga: pior que assassinato, em tradução livre), o filho de Muriel, Ian McKay, contou que vivia na Austrália e trabalhava com um artista em um projeto de livro quando soube do desaparecimento da mãe por meio de um “pequeno rádio”.

Descrevendo o retorno à casa da família, onde se juntou ao pai, Alick, e às irmãs Dianne e Jennifer, McKay disse: “Lembro-me claramente de entrar em casa e sentir a presença da minha mãe”.

“Não consigo explicar isso.”

McKay falou sobre as inúmeras ligações recebidas pela família, de jornalistas, desconhecidos e trotes.

E disse que todas as ligações eram atendidas: “Estávamos desesperados”.

“Tivemos todo tipo de maluco ligando e dizendo: ‘eu sei onde ela está ou algo assim’.”

Muitos dos desconhecidos que ligavam pediam dinheiro.

“Está além da nossa compreensão”, ele disse. “É realmente difícil acreditar que as pessoas possam se comportar de uma forma tão horrível.

“Estávamos morrendo mil vezes por dia porque cada ligação era uma esperança.

“Foi a experiência mais inacreditável e torturante que você pode imaginar – e não durou apenas alguns dias. Durou semanas.”

Os Hoseins foram presos no dia 7 de fevereiro de 1970 e inicialmente mantidos na delegacia de Kingston por causa da multidão de jornalistas reunida do lado de fora da delegacia em Wimbledon.

McKay contou sobre a conversa que teve, logo após as prisões, com o policial responsável pelo caso, o detetive superintendente Bill Smith, e o detetive sargento John Minors, na sala de jantar da casa da família.

“Eles disseram: ‘Olha, se você quiser ir até a delegacia… nós deixaremos você ir até as celas – você pode fazer o que quiser com eles e ninguém nunca ficará sabendo’.

“Fiquei bastante surpreso”, disse McKay. “Para mim, isso nem era uma consideração.”

Até hoje, McKay não tem certeza se a oferta foi genuína ou uma mistura de “bravata”, frustração (pelo fato de os irmãos não estarem respondendo às perguntas) e um sentimento de “lealdade” à família.

“Acho que eles sentiram a necessidade de provar para nós que fizeram tudo que era possível”, disse ele.

“E acho que eles (a polícia) simplesmente viram nossa dor.”

McKay contou que guardou apenas as duas últimas cartas das cerca de 120 enviadas pela mãe.

O resto, ele disse ter queimado por temer intrusão em sua vida privada caso elas caíssem em mãos erradas.

“Embora não houvesse nada secreto ali”, ele disse. “Era apenas algo incrivelmente pessoal.”

Será que os Hoseins poderiam ter sido pegos antes?

Para a filha mais velha dos McKays, Jennifer, uma evidência potencialmente vital que ela diz ter encontrado logo após o desaparecimento da mãe foi ignorada.

Ela contou de sua chegada a Londres, vinda de sua casa em Sussex, no dia seguinte ao desaparecimento de Muriel.

O pai, ela disse, estava “louco” de preocupação e “não sabia o que fazer consigo mesmo”.

A família não tinha ideia do que havia acontecido com Muriel.

“Pode ser o IRA (Exército Republicano Irlandês), pode ser a máfia, não sabemos o que é”, disse ela.

“Foi realmente fora do normal porque a casa estava cheia de policiais e repórteres, eles ficaram enfileirados na calçada do lado de fora por semanas.”

A polícia tinha vasculhado a casa em busca de evidências, mas Jennifer disse que queria ela mesma dar uma olhada.

“Eu queria andar pela casa silenciosamente”, disse. “Andei por todos os cômodos só para ver se conseguia sentir algo diferente.”

Debaixo de uma mesa, em uma sala pequena próxima à cozinha, ela encontrou uma fotografia no chão. A imagem, disse, era de um grupo de homens com um trailer.

Crédito, Dianne McKay

Legenda da foto, Dianne McKay entende que Hosein pode não estar dizendo a verdade, mas questiona qual motivo ele teria agora para não ser honesto

“É algo que não estava onde deveria estar”, ela disse.

E mencionou a descoberta ao Detetive Sargento Minors.

“E então entrei e disse que gostaria de mostrar algo que encontrei”, ela disse, acrescentando ter se sentido ignorada e tratada como uma “filha boba”.

“Ele olhou para a foto e disse ‘falo com você sobre isso mais tarde’, colocou-a no bolso e eu nunca mais a vi.”

“Ele nunca admitiu estar com ela (a foto) e esse foi o fim da história.”

Perguntada se acreditava que alguns dos que estavam na foto eram os irmãos Hosein, Jennifer disse: “Ah, sim, acredito. Definitivamente. Acho que eram Nizamodeen e outros dois.”

Arthur morreu após ser transferido da prisão para um hospital de alta segurança. Nizamodeen foi deportado para Trinidad, seu país de origem, após cumprir sua sentença.

Em janeiro, Dianne e o filho, Mark Randolph Dyer, voaram para Trinidad para encontrar Nizamodeen, que finalmente contou onde havia enterrado o corpo.

A decisão da Polícia Metropolitana de Londres de realizar outra busca no local da fazenda ocorreu após detetives voarem para Trinidad para conversar com Hosein em março.

Dianne disse que a família nunca conversou de fato sobre o desaparecimento de Muriel.

“Nenhum de nós jamais desabafou sobre a experiência que tivemos, que foi bem única, absolutamente avassaladora e horrível”, disse ela.

“Isso realmente me atrapalhou. Levei anos para voltar ao normal.”

Ela entende que Nizamodeen pode não estar dizendo a verdade sobre a localização do corpo da mãe. Mas questiona qual razão, após cumprir 20 anos de prisão, ele teria para mentir sobre o paradeiro dos restos mortais dela.

Já McKay disse não saber exatamente o que significaria para a família encontrar o corpo de Muriel, mas apoiou o esforço.

Ele disse que sentiu que a família “fez absolutamente tudo o que era possível fazer”.

“Acho que a honramos da melhor forma possível”, disse ele.