Para se destacar nas Olimpíadas, um atleta precisa de várias coisas: bom condicionamento físico, muito treino, resiliência, foco e… ter nascido na ‘época certa’ do ano.
Pesquisadores analisaram o futebol na Inglaterra, o hóquei no gelo no Canadá e os competidores da Olimpíada de Pequim, em 2008, para tirar conclusões sobre o impacto das datas de nascimento dos atletas nos resultados.
Em 2009, as escolas de esportes profissionais de jovens ingleses com idades entre 16 e 20 anos eram compostas em sua maior parte por jogadores com datas de nascimento que cobriam um período de três meses.
Os resultados mostram que 57% dos jovens haviam nascido em setembro, novembro ou dezembro, enquanto apenas 14% comemoravam o aniversário em junho, julho ou agosto.
Não se trata de um caso isolado. Em um recente Campeonato Europeu de Sub-17, 75% dos jogadores de futebol haviam nascido em uma janela de quatro meses.
Resultados semelhantes foram detectados no hóquei no gelo canadense e nas Olimpíadas de Pequim em 2008.
O efeito da idade relativa
Esta observação é conhecida como o “Efeito da Idade Relativa”. Ela é determinada pela data limite para a competição por faixa etária.
No futebol inglês, como acontece na escola, as crianças são colocadas em grupos anuais com base no fato de terem nascido antes ou em 1º de setembro — que é quando começa o ano letivo no Reino Unido.
As crianças nascidas em setembro têm uma vantagem sobre as crianças que vieram ao mundo em agosto porque têm quase um ano inteiro a mais para crescer e se desenvolver.
Isso é exacerbado nos primeiros estágios da puberdade, quando as crianças podem se desenvolver bastante em um único ano.
Trazendo essa lógica para o Brasil, crianças nascidas nos primeiros meses do ano (entre janeiro e março), período em que começa o ano letivo, teriam uma vantagem competitiva sobre aquelas que nascem no quarto trimestre (entre outubro e dezembro).
Ainda segundo essa linha de raciocínio, os adultos infelizmente muitas vezes acreditam que as vantagens de tamanho e coordenação — que naturalmente se desenvolvem mais cedo em crianças nascidas no início do ano letivo — se traduzem em melhores desempenhos.
Os treinadores de futebol e hóquei no gelo que precisam selecionar o time muitas vezes confundem talento com idade e, muitas vezes sem perceber, escolhem um time com jovens maiores, mais desenvolvidos e com maior probabilidade de vencer.
O efeito cumulativo
“Crianças nascidas imediatamente após o ponto de corte em seu esporte ou país específico são geralmente maiores e, portanto, são mais propensas a serem escolhidas em seus primeiros anos, o que leva a uma vantagem cumulativa”, concorda Ben Oakley, professor de Educação de desempenho esportivo da The Open University, no Reino Unido.
Imagine, então, que aos 10 anos, você é selecionado para uma equipe e identificado com um “talento”. Seus pais ficam radiantes de orgulho e os treinadores investem mais tempo em seu progresso; você obtém mais atenção, prática e oportunidades para jogar.
Em pouco tempo, essa vantagem da maturidade se amplia. Além disso, você se sente mais confiante de que é bom em alguma coisa.
E há uma coisa que todos nós sabemos sobre a psicologia do desempenho: é provável que você persista em algo novo quando percebe alguma forma de sucesso precoce.
Pode ser um elogio de alguém que você respeita, resultados em competições, convocações para seleções, domínio de uma nova habilidade ou sentir-se parte de um grupo.
O jogador menor e menos desenvolvido, portanto, precisa ser resiliente às reviravoltas que provavelmente experimentará, o que não é fácil para uma criança de 10 anos.
Eventualmente, depois de alguns anos, elas costumam ficar desanimadas e podem deixar o esporte.
No Canadá, o mesmo processo ocorre no hóquei no gelo. No entanto, como a data limite da seleção de hóquei por lá é o ano regular (ou seja, 1º de janeiro), atletas nascidos nos meses de janeiro, fevereiro e março são os mais favorecidos.
Esportes olímpicos
As implicações do “Efeito da Idade Relativa” para os esportes olímpicos são mais complexas.
Para começar, a data limite para muitos dos esportes olímpicos é novamente 1º de janeiro.
Além disso, há grupos classificados por peso, como boxe, luta livre, taekwondo e judô.
No entanto, alguns resultados interessantes surgiram quando alguns pesquisadores se aplicaram à tarefa monumental de analisar as datas de nascimento de todos os 18.132 competidores dos Jogos Olímpicos de 2008, realizados em Pequim.
No geral, havia mais competidores do sexo masculino e feminino nascidos no primeiro trimestre do ano do que em qualquer outro trimestre.
Claro que há muitas exceções a essas descobertas, mas a ideia geral é que as crianças nascidas imediatamente após o ponto de corte em seu esporte ou país específico são geralmente maiores e, portanto, mais propensas a serem escolhidas em seus primeiros anos, o que gera uma vantagem cumulativa.
Compreender o “Efeito da Idade Relativa” ajuda os pais e treinadores a refinar o que eles percebem como marcadores de talento.
Na Olimpíada Paris 2024, os brasileiros que ganharam medalhas em modalidades individuais até agora confirmam em parte essa tendência do mês de nascimento observada nos estudos.
Quatro atletas medalhistas nasceram no primeiro trimestre do ano:
- Caio Bonfim – prata na marcha atlética – 19 de março de 1991;
- Larissa Pimenta – bronze no judô – 1º de março de 1999;
- Willian Lima – prata no judô – 31 de janeiro de 2000;
- Rayssa Leal – bronze no skate street – 4 de janeiro de 2008.
Três nasceram no mês de maio:
- Rebeca Andrade – ouro, duas pratas e um bronze (por equipes) – 8 de maio de 1999;
- Beatriz Souza – ouro no judô – 20 de maio de 1998;
- Tatiana Weston-Webb – prata no surfe – 9 de maio de 1996.
As exceções da lista são Bia Ferreira, bronze no boxe, nascida em 9 de dezembro de 1992, e Gabriel Medina, bronze no surfe, que veio ao mundo em 22 de dezembro de 1993.
Fonte: BBC
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