O ex-ministro da Educação Milton Ribeiro foi preso pela Polícia Federal (PF) na manhã desta quarta-feira (22/6). Além de Ribeiro, outros dois pastores, suspeitos de operar um “balcão de negócios” no Ministério da Educação (MEC) e na liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) foram alvos da operação, batizada de ‘Acesso Pago’.
O FNDE é um órgão ligado ao MEC e controlado por políticos do chamado “centrão”, bloco político que dá sustentação ao presidente Jair Bolsonaro. Esse fundo concentra os recursos federais destinados a transferências para municípios.
A ação investiga a prática de “tráfico de influência e corrupção para a liberação de recursos públicos” do FNDE.
Ribeiro e pelo menos um dos pastores, Gilmar Santos, já foram detidos.
No mandado de prisão de Ribeiro, o juiz Renato Borelli, da 15ª Vara Federal em Brasília, enumera os crimes investigados e que teriam sido cometidos pelo ex-ministro: corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência.
O magistrado também ordenou que Ribeiro seja transferido para a superintendência da PF no Distrito Federal.
A PF também cumpre mandados de busca e apreensão em endereços de Ribeiro, de Santos e de outro pastor, Arilton Moura.
Ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL), os pastores são apontados como lobistas que atuavam no MEC.
Questionado por jornalistas sobre a prisão de Ribeiro, Bolsonaro disse que ele deve responder por seus atos. “Ele que responda pelos atos deles.”
Segundo o presidente, o ex-ministro mantinha “conversa informal demais com pessoas de confiança dele” e, em sua opinião, isso pode tê-lo prejudicado.
Bolsonaro acrescentou que a operação da PF é um sinal de que a corporação atua sem interferência política em seu governo.
“Se a PF prendeu, tem um motivo”, disse.
A declaração contrasta com seu posicionamento quando Ribeiro pediu demissão do cargo, no fim de março. À época, Bolsonaro saiu em defesa do ex-ministro ao dizer que “estão fazendo uma covardia” com ele.
“O Milton… coisa rara de eu falar aqui… Eu boto minha cara no fogo pelo Milton”, afirmou o presidente, em transmissão ao vivo pela internet na ocasião.
Operação
Foram mapeados indícios de crimes na liberação de verbas do FNDE com base em documentos, depoimentos e um relatório da CGU (Controladoria-Geral da União).
Ao todo, estão sendo cumpridos 13 mandados de busca e apreensão e cinco de prisões em Goiás, São Paulo, Pará e Distrito Federal.
Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura são considerados figuras-chave no esquema criminoso descoberto dentro do ministério, então sob o comando de Ribeiro.
Eles negociavam com prefeitos a liberação de recursos federais mesmo sem ter cargo público, segundo mostrou o jornal Folha de S. Paulo.
Esses recursos vinham do FNDE, órgão ligado ao MEC e controlado pelo centrão.
Contrariando sua promessa de campanha, o presidente recorreu ao apoio desses parlamentares quando se viu ameaçado por uma série de pedidos de impeachment.
A contrapartida geralmente se dá via troca de cargos e repasses de verbas federais.
Pedidos de propina até em ouro foram relatados por prefeitos.
Ao menos desde janeiro de 2021, os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura negociavam a liberação de empenhos para obras de creches, escolas, quadras ou para compra de equipamentos. Os recursos são geridos pelo FNDE.
Eles tinham livre trânsito no governo, organizavam viagens do ministro com lideranças do FNDE e intermediavam encontros de prefeitos na própria residência de Ribeiro.
Ambos tinham, em um hotel de Brasília, uma espécie de QG para negociação de recursos. Ali, recebiam prefeitos, assessores municipais e também integrantes do governo.
A atuação deles junto ao MEC havia sido revelada inicialmente pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Em áudio revelado pelo jornal Folha de S. Paulo, Ribeiro afirma que sua prioridade no MEC são as prefeituras que mais precisam e, em seguida, “todos que são amigos do pastor Gilmar”. Segundo o ex-ministro, isso atendia a uma solicitação do presidente Jair Bolsonaro.
“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o ministro na conversa da qual participaram prefeitos e os dois religiosos.
Na gravação, o ministro acrescenta que o pedido de apoio não é segredo e que visa a construção de igrejas.
Uma semana após a revelação pela Folha, Ribeiro deixou o cargo, no fim de março.
Outro lado
Em nota divulgada à época da revelação do escândalo, o ministro negou ter operado qualquer esquema de favorecimento a pastores. Ribeiro também negou ter sido orientado pelo presidente Bolsonaro neste sentido.
“O presidente da República não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem”, disse o ministro em comunicado à imprensa.
“Da mesma forma, recebo pleitos intermediados por parlamentares, governadores, prefeitos, universidades, associações públicas e privadas. Todos os pedidos são encaminhados para avaliação das respectivas áreas técnicas”, declarou.
“Ressalto que não há qualquer hipótese e nenhuma previsão orçamentária que possibilite a alocação de recursos para igrejas de qualquer denominação religiosa.”
Ribeiro afirmou que “não há nenhuma possibilidade de o ministro determinar alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou Estado”.
Na carta em que pediu para ser exonerado do cargo, entregue ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no fim de março, Ribeiro também negou irregularidades.
“Tenho plena convicção que jamais realizei um único ato de gestão na minha pasta que não fosse pautado pela correção, pela probidade e pelo compromisso com o erário. As suspeitas de que uma pessoa, próxima a mim, poderia estar cometendo atos irregulares devem ser investigadas com profundidade”, escreveu o ministro, no documento.
Anteriormente, Ribeiro admitiu em sua conta no Twitter ter autorizado a produção de Bíblias com a sua imagem e a distribuição gratuita delas em um evento de cunho religioso. Ele disse, porém, ter desautorizado a posterior distribuição das obras em outros eventos sem a sua aprovação.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, as obras com a foto de Ribeiro teriam sido distribuídas a convidados de evento do Ministério da Educação (MEC) em Salinópolis, no Pará. O encontro reuniu prefeitos e secretários municipais do Estado, além do titular da pasta e os pastores.
Em seu pedido de demissão, o ministro destacou o objetivo de afastar do governo federal o escândalo de suspeita de corrupção.
“Decidi solicitar ao presidente Bolsonaro a minha exoneração do cargo, com a finalidade de que não paire nenhuma incerteza sobre a minha conduta e a do Governo Federal, que vem transformando este país por meio do compromisso firme da luta contra a corrupção”, escreveu Ribeiro.
“Meu afastamento é única e exclusivamente decorrente de minha responsabilidade política, que exige de mim um senso de país maior que quaisquer sentimentos pessoais”, completou.
Quem é Milton Ribeiro
Pastor de uma igreja presbiteriana em Santos (SP), Milton Ribeiro foi nomeado para o Ministério da Educação em julho de 2020, após a demissão de Abraham Weintraub.
Ele foi o terceiro ministro da Educação do governo Bolsonaro.
Sua nomeação foi considerada um aceno à base religiosa (evangélica) que apoia o governo.
Em meio ao escândalo envolvendo a divulgação do áudio, deixou o cargo em 28 de março deste ano.
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