- Leandro Machado
- Da BBC News Brasil em São Paulo
Os lagos da Amazônia são tão importantes para o meio ambiente que foram classificados como “guerreiros” na luta contra o aquecimento global e as mudanças climáticas.
Já a degradação de boa parte deles, principalmente por causa do desmatamento desenfreado da floresta, pode ter grande impacto no planeta.
Essas são duas das conclusões de um estudo produzido pelo geógrafo brasileiro Leonardo Amora-Nogueira, doutor pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e publicado pela revista científica Nature em julho.
Nos últimos anos, o pesquisador percorreu cerca de 1.200 km de floresta para analisar as condições de 13 lagos nos Estados do Pará, Rondônia e Amazonas.
Descobriu que essas águas, mesmo em áreas de relativamente pequeno porte, são capazes de armazenar e absorver grandes quantidades de carbono, um dos principais gases responsáveis pelo efeito estufa que causa o aquecimento global.
“Os lagos da Amazônia armazenam muito mais carbono do que a média de lagos de outros biomas, como as florestas temperadas e boreais, e as regiões polares e subpolares”, explica o geógrafo, que realizou o estudo com apoio da Faperj (Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro).
As análises mostraram que esses lagos acumulam cerca de 113,5 gramas de carbono por metro quadrado ao ano — taxa entre 3 e 10 vezes maior do que regiões alagadas de outros biomas.
O volume gira em torno de 79 milhões de toneladas de carbono por ano — equivalente a 27% das emissões de carbono na atmosfera, aponta a pesquisa.
Essas áreas alagadas na Amazônia, que compõem 3% de todos os lagos do planeta, estão próximas a grandes rios da região, como o Madeira, o Amazonas e o Negro.
São as águas deles que carregam a matéria que depois será “enterrada” no fundo dos lagos.
Ou seja, o gás carbônico é produzido pela decomposição do material orgânico da floresta: troncos de árvores, plantas mortas e outros tipos de sedimentos.
“Essa matéria produz muito carbono. Sem os lagos, esse gás iria para a atmosfera, aumentando o efeito estufa”, explica Amora-Nogueira, que estuda o tema desde seu trabalho de conclusão de curso na graduação em Geografia.
“Os lagos são fundamentais nesse ciclo de entrada e saída de carbono, pois o material decomposto gera o carbono que, em vez de ir para a atmosfera, fica ‘enterrado’ no fundo da água”, diz.
Tipos de água
Na Amazônia, há três tipos de águas que transportam e guardam matéria orgânica: clara, branca e preta. E a coloração de cada uma depende de sua capacidade de carregar esses sedimentos.
A água clara — dos rios Tapajós e Xingu, por exemplo — tem essa tonalidade porque recebe menos material da floresta. São rios que nascem na região central do Brasil.
Os rios de água branca — o Madeira, nascido nos Andes — têm força para levar grande volume de sedimentos, como enormes troncos de árvores que flutuam ao longo de seu curso.
Já os de água preta — o rio Negro, por exemplo — nascem dentro da própria Amazônia e, mais próximos da mata, recebem mais material orgânico das margens, ganhando uma coloração mais escura.
Segundo Amora-Nogueira, ainda são necessários mais estudos para entender como a diferença das águas impacta o armazenamento do gás carbônico na Amazônia.
Por outro lado, o estudo do geógrafo mensurou como o desmatamento afeta a qualidade do serviço de acumuladores de carbono prestado pelos lagos.
“Constatamos que os lagos de áreas desmatadas acumulam de 2 a 3 vezes menos carbono do que as regiões de floresta preservada”, explica o pesquisador.
Ou seja, quanto mais degradada for a área do entorno do lago, menos ele vai atuar e mais gás carbônico vai atingir a atmosfera, piorando o cenário de aquecimento do planeta.
Por causa dessa ação, o pesquisador apelidou os lagos de “guerreiros contra o aquecimento global”.
Para Humberto Marotta, professor de Geociências da UFF e orientador de Amora-Nogueira, o estudo aponta para a importância da conservação das áreas alagadas da Amazônia, muitas vezes deixadas de lado nas discussões sobre preservação da floresta.
“Os lagos amazônicos são grandes guardiões contra o aquecimento global. Então, precisamos pensar as áreas prioritária de conservação não apenas para as árvores em pé, mas também para áreas alagadas, que prestam um serviço importantíssimo para o planeta. É preciso pensar sistemas de preservação mais amplos”, diz.
Desmatamento
O problema é que o desmatamento da Amazônia continua em ritmo acelerado.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre agosto de 2021 e julho deste ano, os alertas de desmatamento alcançaram 8.590 km² da floresta, uma pequena queda de 2% em relação ao mesmo período de 2021.
Foi o terceiro ano seguido que o órgão registrou alertas em uma área superior a 8 mil km² de floresta.
O Pará é o Estado com maior devastação, de acordo com o Inpe. Nele, foram 3.072 km² desmatados no período, seguido pelo Amazonas (2.292 km²), Mato Grosso (1.433 km²) e Rondônia (1.179 km²).
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