• Chris Impey e Daniel Apai
  • The Conversation*

Crédito, NASA/ESA/CSA/STScI

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O Quinteto de Stephan, um agrupamento de cinco galáxias, é a maior imagem capturada até o momento pelo telescópio James Webb

Os ingredientes da vida estão espalhados por todo o Universo.

A Terra pode ser o único lugar que conhecemos onde há vida, mas detectar vida fora do nosso planeta é um objetivo importante da astronomia moderna e da ciência planetária.

Somos dois cientistas que estudam exoplanetas e astrobiologia. Graças, em grande parte, aos telescópios de nova geração, como o James Webb, pesquisadores como nós logo serão capazes de medir a composição química da atmosfera de planetas que orbitam outras estrelas.

A esperança é que um ou mais desses planetas possam emitir a assinatura química da vida.

Crédito, NASA Ames/SETI Institute/JPL-Caltech/Wikimedia Com

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Existem muitos exoplanetas conhecidos em zonas habitáveis – órbitas não tão próximas de uma estrela a ponto de fazer a água entrar em ebulição, mas não tão distantes para que o planeta congele – assinaladas em verde na imagem para o nosso sistema solar e para o sistema da estrela Kepler-186, com seus planetas identificados pelas letras b até f

Exoplanetas habitáveis

Pode existir vida em lugares do sistema solar onde existe água líquida — como os aquíferos abaixo da superfície de Marte ou os oceanos de Europa, uma das luas de Júpiter. Mas procurar vida nesses lugares é incrivelmente difícil. Não é fácil chegar até lá e detectar a vida exigiria o envio de uma sonda para trazer amostras físicas.

Muitos astrônomos acreditam que há boas chances de existência de vida em planetas que orbitam outras estrelas – os exoplanetas. E é possível que ali seja encontrada vida fora da Terra pela primeira vez.

Cálculos teóricos indicam que existem cerca de 300 milhões de planetas potencialmente habitáveis somente na Via Láctea e diversos planetas habitáveis do tamanho da Terra a apenas 30 anos-luz do nosso planeta — em essência, vizinhos galácticos da humanidade.

Os astrônomos já descobriram mais de 5 mil exoplanetas, dos quais centenas são potencialmente habitáveis, usando métodos indiretos que medem como um planeta afeta sua estrela próxima. Essas medições podem fornecer aos astrônomos informações sobre a massa e o tamanho de um exoplaneta, mas não muito mais que isso.

Crédito, Daniele Pugliesi/Wikimedia Commons

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Todos os materiais absorvem luz com certos comprimentos de onda. O diagrama mostra os comprimentos de onda de luz absorvidos com mais facilidade por diferentes tipos de clorofila

Em busca de bioassinaturas

Para detectar vida em um planeta distante, os astrobiólogos estudarão a luz estelar que interagiu com a superfície ou a atmosfera de um planeta. Se a atmosfera ou a superfície houver sido transformada pela vida, a luz pode carregar uma indicação, conhecida como “bioassinatura”.

Na primeira metade da sua existência, a atmosfera da Terra não continha oxigênio, mesmo quando abrigava vida unicelular simples. Naquela era remota, a bioassinatura da Terra era muito fraca.

Mas tudo mudou de uma hora para outra 2,4 bilhões de anos atrás, quando evoluiu uma nova família de algas. Essas algas usavam um processo de fotossíntese que produz oxigênio livre (que não é quimicamente ligado a nenhum outro elemento).

A partir daquele momento, a atmosfera cheia de oxigênio da Terra passou a deixar uma bioassinatura forte e facilmente detectável sobre a luz que passa através dela.

Quando a luz é refletida pela superfície de um material ou passa através de um gás, alguns comprimentos de onda são mais provavelmente capturados pelo gás ou pela superfície do material do que outros. É devido a essa captura seletiva de comprimentos de onda de luz que os objetos têm cores diferentes.

As folhas são verdes porque a clorofila absorve particularmente bem a luz nos comprimentos de onda azul e vermelho. Quando a luz atinge uma folha, os comprimentos de onda azul e vermelho são absorvidos, deixando que principalmente a luz verde atinja os nossos olhos.

O padrão da luz faltante é determinado pela composição específica do material que interage com ela. Com isso, os astrônomos conseguem aprender algo sobre a composição da atmosfera de um exoplaneta ou da sua superfície, essencialmente medindo a cor específica da luz que vem do planeta.

Este método pode ser empregado para reconhecer a presença de certos gases atmosféricos associados à vida – como oxigênio e metano — pois esses gases deixam assinaturas muito específicas na luz. E pode também ser usado para detectar cores específicas sobre a superfície de um planeta.

Na Terra, por exemplo, a clorofila e outros pigmentos usados pelas plantas e algas para a fotossíntese capturam comprimentos de onda de luz específicos. Esses pigmentos produzem cores características que podem ser detectadas com uma câmera sensível ao infravermelho.

Se você observar essa cor refletida pela superfície de um planeta distante, isso pode significar a presença de clorofila.

Telescópios no espaço e na Terra

Crédito, Getty Images

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O telescópio James Webb foi enviado ao espaço em dezembro de 2021

É preciso um telescópio incrivelmente poderoso para detectar essas mudanças sutis da luz que vem de um exoplaneta potencialmente habitável. Atualmente, o único telescópio capaz dessa façanha é o novo Telescópio Espacial James Webb.

Ao iniciar suas operações científicas em julho de 2022, o James Webb fez uma leitura do espectro do exoplaneta gigante gasoso WASP-96b. O espectro exibiu a presença de água e nuvens, mas é improvável que um planeta grande e quente como o WASP-96b abrigue a existência de vida.

Esses dados iniciais demonstram que o James Webb é capaz de detectar assinaturas químicas fracas na luz proveniente de exoplanetas. Nos próximos meses, o Webb está programado para voltar seus espelhos em direção ao TRAPPIST-1e, um planeta do tamanho da Terra, potencialmente habitável, a meros 39 anos-luz do nosso planeta.

O Webb pode procurar bioassinaturas estudando os planetas enquanto eles passam em frente às suas estrelas e capturando a luz estelar filtrada através da atmosfera do planeta. Mas o telescópio não foi projetado para procurar vida, de forma que ele somente é capaz de examinar alguns dos mundos potencialmente habitáveis mais próximos.

O Webb pode apenas detectar alterações dos níveis atmosféricos de dióxido de carbono, metano e vapor d’água. Embora algumas combinações desses gases possam sugerir a existência de vida, ele não é capaz de detectar a presença de oxigênio livre, que é o seu indicador mais forte.

Os principais conceitos para os futuros telescópios espaciais, ainda mais potentes, incluem planos de bloquear a luz brilhante das estrelas para revelar a luz estelar refletida por cada planeta. Esta ideia é similar a usar a sua mão para bloquear a luz do sol, para enxergar melhor à distância.

Para isso, os telescópios espaciais do futuro poderão usar pequenas máscaras internas ou aeronaves externas grandes em forma de guarda-chuva. Bloqueando a luz estelar, fica muito mais fácil estudar a luz refletida por um planeta.

Existem também três enormes telescópios terrestres atualmente em construção que poderão pesquisar bioassinaturas. Eles são o Telescópio Gigante de Magalhães (GMT) e o Telescópio Europeu Extremamente Grande (E-ELT), ambos no Chile; e o Telescópio de Trinta Metros, no Havaí.

Todos eles são muito mais poderosos que os telescópios existentes atualmente na Terra. Por isso, mesmo com as dificuldades causadas pela atmosfera terrestre (que distorce a luz vinda das estrelas), esses telescópios podem conseguir sondar a atmosfera dos mundos mais próximos em busca de oxigênio.

Biologia ou geologia?

Mesmo usando telescópios mais poderosos nas próximas décadas, os astrobiólogos só conseguirão detectar bioassinaturas fortes, produzidas por mundos que já foram completamente transformados pela vida.

Infelizmente, a maioria dos gases liberados pela vida na Terra também pode ser produzida por processos não biológicos. O metano, por exemplo, pode ser liberado tanto pelas vacas quanto pelos vulcões. A fotossíntese produz oxigênio, da mesma forma que a luz solar, quando separa as moléculas de água em oxigênio e hidrogênio.

Por isso, existe uma boa possibilidade de que os astrônomos detectem falsos positivos durante sua procura por vida distante. Para ajudar a eliminar esses falsos positivos, eles precisarão entender um planeta de interesse o suficiente para saber se seus processos geológicos ou atmosféricos conseguem imitar uma bioassinatura.

A próxima geração de estudos sobre exoplanetas poderá fornecer as provas extraordinárias de que precisamos para comprovar a existência de vida fora da Terra. E os primeiros dados obtidos pelo Telescópio Espacial James Webb nos dão uma ideia do fascinante progresso que temos pela frente.

*Chris Impey é professor de astronomia da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.

Daniel Apai é professor de astronomia e ciências planetárias da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.

Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).

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