O que acontece quando você ganha um Grammy?
Depois de enxugar as lágrimas e agradecer sua mãe, você pode esperar fazer ainda mais sucesso. Até mesmo um grande hit global como 21 de Adele registrou um aumento de 207% nas vendas após ser eleito melhor álbum em 2012.
A vitória também te oferece uma vantagem nas salas de reunião, diz o presidente da Recording Academy, que organiza o Grammy, Harvey Mason Jr..
“Isso afeta sua capacidade de atrair atenção, obtendo então melhores negócios, melhores contratos”, disse ele à revista americana Billboard no início deste ano.
Mas os efeitos não param por aí.
Um novo estudo sugere que os vencedores do Grammy são mais propensos a experimentar novos sons e fazer inovações estilísticas no álbum seguinte.
“Pense no Fleetwood Mac indo do (álbum) Rumours para Tusk“, diz Giacomo Negro, coautor da pesquisa.
“As composições são mais esparsas, e você ainda tem influências do pós-punk. É um álbum muito diferente.”
“Ou veja o caso do U2, que ganhou álbum do ano por Joshua Tree [em 1988]. Seu próximo grande álbum foi Achtung Baby, que tinha elementos de dança e krautrock (termo usado para descrever bandas experimentais alemãs que surgiram no final dos anos 1960 e meados dos anos 1970).”
“Então, ganhar um Grammy tem consequências tangíveis tanto para os artistas quanto para o público.”
A equipe estudou cinco décadas de cerimônias do Grammy para chegar a esta conclusão. Mas também fez uma segunda descoberta, mais surpreendente.
Os artistas que são indicados a um prêmio, mas não ganham, seguem na direção oposta, fazendo discos menos originais, com uma sonoridade mais próxima da música existente no mesmo gênero.
“Implicitamente, o sistema de premiação aparentemente exerce um impacto assustador na diferenciação artística”, o estudo sugere.
“Mesmo que as intenções dos patrocinadores do prêmio sejam muitas vezes o inverso.”
Cinco vencedores do Grammy que exploraram novos sons
1) The Beatles
Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, que ganhou como álbum do ano em 1968, reescreveu as regras do rock com seus experimentos musicais barrocos e psicodélicos.
Em vez de se repetir, no entanto, os Beatles abandonaram as orquestrações exuberantes de Pepper em prol de uma estética despojada e de vanguarda.
As guitarras distorcidas de Helter Skelter pressagiavam o heavy metal, enquanto a colagem sonora Revolution 9 introduziu a arte radical no mainstream.
O trabalho resultante, o chamado Álbum Branco, é um de seus trabalhos mais ecléticos e celebrados.
2) Christina Aguilera
O álbum de estreia de Christina Aguilera rendeu à estrela o prêmio de artista revelação em 2000.
Na sequência, ela fez um álbum corajoso e ousado sobre autoidentificação e independência.
Enquanto a maioria dos álbuns pop da época se apegava a um único som, Aguilera abraçou o rock (Fighter), as baladas românticas (Beautiful), o hardcore club music (Dirrrty) e o pop latino (Infatuation); enquanto suas letras cruas e cheias de vulnerabilidade inspiraram futuras estrelas como Rihanna, Ariana Grande e Miley Cyrus.
3) Billy Joel
Quando Billy Joel ganhou o prêmio de disco do ano em 1977, por Just The Way You Are, ele estava farto de ser descrito como o rei das baladas de soft rock.
Ao mesmo tempo, ele estava lotando estádios — e percebeu que precisava de músicas mais intensas para tocar nestes espaços.
Ele acelerou então o compasso da música, aumentou as guitarras e emplacou sua primeira música número um nos Estados Unidos com It’s Still Rock and Roll To Me.
“Eu poderia ter lançado um disco que teria garantido uma certa quantidade de vendas, fazendo algo semelhante”, disse ele em 2010.
“Francamente, eu teria ficado entediado. Teria sido um tiro no pé, em termos de carreira. Você tem que descartar um público para conquistar outro.”
4) Billie Eilish
Billie Eilish fez história quando ganhou todos os quatro maiores prêmios do Grammy em uma única noite com seu álbum de estreia, When We All Fall Asleep Where Do We Go?.
Sua visão singularmente distorcida da música pop poderia ter sido estendida para um segundo álbum, mas Eilish optou por evoluir.
Happier Than Ever, do ano passado, passeia pela bossa nova e pelo grunge, enquanto explora temas líricos mais maduros. E rendeu a ela uma segunda indicação de melhor álbum no início deste ano.
5) Stevie Wonder
Na década de 1970, Stevie Wonder protagonizou uma sequência incrível no Grammy, ganhando álbum do ano com três lançamentos consecutivos — Innervisions, Fulfillingness’ First Finale e Songs In The Key Of Life.
Cada vitória o encorajou a alçar voos cada vez mais altos, culminando em sua magnum opus — um extenso álbum duplo repleto de clássicos como Pastime Paradise, Sir Duke, Isn’t She Lovely e As.
Wonder, em seu auge criativo, lançou as bases para Prince e Michael Jackson nos anos 1980.
A pesquisa foi conduzida por três acadêmicos americanos, Giacomo Negro (da Universidade Emory), Balázs Kovács (Yale) e Glenn R Carroll (Stanford). E está prevista para ser publicada na American Sociological Review no próximo mês.
A equipe analisou todos os prêmios Grammy nas quatro categorias principais (melhor álbum, melhor artista revelação, disco e música do ano) desde o início da cerimônia, em 1959, até 2018, quando Bruno Mars foi o grande vencedor.
Eles também categorizaram mais de 125 mil álbuns por atributos como gênero, estilo, tom, compasso, energia, habilidade para dançar e acústica — usando tags do banco de dados de música online AllMusic, combinadas com os metadados que o Spotify usa para classificar músicas individuais.
Isso permitiu calcular o som “típico” de um gênero musical e, posteriormente, até que ponto um álbum se desviou desse som.
Curiosamente, a pesquisa mostrou que os vencedores do Grammy tendem a permanecer dentro dos limites do gênero escolhido. Só depois de vencer que o som deles muda.
Os autores sugerem que isso se deve à combinação da confiança e alavancagem que uma vitória proporciona — com artistas capazes de desafiar as demandas comerciais de suas gravadoras e exigir mais recursos para gravar músicas novas.
No entanto, Negro observa que estes discos mais experimentais geralmente têm um desempenho fraco, em comparação com seus predecessores.
“A música subsequente não necessariamente recebe mais elogios da crítica ou vende mais”, diz ele.
“É um enigma interessante, em que o artista vai por um caminho diferente, mas o público não necessariamente o segue.”
Em contrapartida, os indicados que perdem mantêm sua base de fãs fazendo músicas que soam familiares.
O estudo não consegue explicar por que os artistas se tornam mais conservadores depois de perder um prêmio, mas os autores especulam que isso pode acontecer devido a um fenômeno conhecido como “síndrome da medalha de prata”.
Proposto em 1892 pelo psicólogo William James, o conceito foi bem explicado pelo comediante Jerry Seinfeld, que uma vez disse que preferia ficar em último em uma corrida do que ganhar prata.
“Você ganha o ouro, você se sente bem. Você ganha o bronze, você pensa: ‘Bem, pelo menos eu consegui alguma coisa’.”
“Mas você ganhar a prata, é algo como: ‘Parabéns, você quase ganhou. De todos os perdedores, você ficou em primeiro neste grupo.”
“Você é o perdedor número um”, afirmou.
Esta reação negativa ao “quase sucesso” pode fazer com que os músicos duvidem de seus instintos ou até tentem copiar os “artistas consagrados”, diz Negro.
Ao final, os autores do estudo fazem uma pergunta provocativa: seria melhor para o mundo da música não divulgar a lista de indicados?
“Tal mudança no sistema não incentivaria mais o comportamento convencional dos artistas pré-selecionados”, eles sugerem.
“Por outro lado, divulgar uma lista de finalistas promove o artista, mesmo que ele ou ela não ganhe.”
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