- Natalie Sherman
- Repórter de negócios, Nova York
Em um movimento relativamente inesperado, funcionários de cerca de 220 lojas da rede de cafeterias Starbucks, nos Estados Unidos, votaram pela sindicalização da categoria.
Mas a mobilização veio em um momento desafiador, à medida que a economia desacelera e a empresa responde furiosamente.
Joselyn Chuquillanqui trabalhava para a Starbucks há quase sete anos quando a empresa a demitiu, no mês passado.
A jovem de 28 anos sabia que isso podia acontecer.
Embora gostasse do trabalho como barista, que oferecia a ela flexibilidade para cuidar da sobrinha, Joselyn estava frustrada com a postura da empresa diante das licenças médicas durante a pandemia de covid-19 — e havia tentado mobilizar os colegas de trabalho em Nova York a se filiarem a um sindicato.
Logo depois, ela diz que o chefe começou a puni-la por infrações que não geravam punição a outros funcionários, como chegar alguns minutos atrasada para o início do seu turno que começava às 5h30.
Em julho, ela perdeu a chave da loja, a qual acabou sendo encontrada dentro do estabelecimento. E, embora tenha informado imediatamente ao gerente, parece ter sido a gota d’água.
No aviso prévio da demissão, a Starbucks citou que havia um “padrão de atrasos” e o incidente com a chave.
“Foi definitivamente algum tipo de retaliação. Nunca vi ninguém ser demitido por estar menos de cinco minutos atrasado”, diz Joselyn, que era supervisora de turno, com um salário de mais de US$ 22 por hora, e trabalhava para a Starbucks desde 2015.
Líderes sindicais dizem que o caso de Joselyn foi parte de uma repressão nacional, em que mais de 75 ativistas sindicais foram demitidos e algumas lojas fecharam suas portas enquanto a empresa, que se considera um local de trabalho progressista, tenta impedir que o movimento trabalhista ganhe força.
A Starbucks, que possui quase 9 mil lojas nos EUA e licencia outras milhares, nega retaliação. A empresa diz que respeita o direito dos trabalhadores se sindicalizarem e fechou as lojas com base em relatórios de segurança.
Mas não há dúvida de que a companhia vê o sindicato como uma ameaça.
“Não acreditamos que terceiros devam liderar nosso pessoal e, por isso, estamos em uma batalha pelos corações e mentes. E seremos bem-sucedidos”, disse o CEO da Starbucks, Howard Schultz, durante uma conferência em junho.
‘Valores fundamentais’
Nascido em uma família da classe trabalhadora do Brooklyn, Schultz acompanhou vários movimentos trabalhistas na empresa ao longo de sua primeira gestão como CEO de 1987 a 2000, e novamente por cerca de uma década após a crise financeira de 2008, à medida que a pequena cadeia de Seattle se transformava em uma rede gigante reconhecida internacionalmente.
Quando o CEO da empresa, Kevin Johnson, se aposentou em abril deste ano em meio à campanha sindical, Schultz voltou como CEO interino, prometendo reparar o relacionamento da empresa com seus funcionários e “reinventar o papel e a responsabilidade de uma empresa de capital aberto”.
A alta cúpula da empresa organizou dezenas de reuniões sobre o assunto, com o objetivo de conhecer as reclamações e convencer os funcionários de que a companhia pode responder melhor sem um sindicato.
A companhia também anunciou mais de US$ 1 bilhão em investimentos em aumento de salários, treinamento adicional e outras melhorias, elevando o salário mínimo da empresa nos EUA para US$ 15 por hora, e a média para cerca de US$ 17.
Quando os aumentos salariais entraram em vigor em 1º de agosto, a empresa deliberadamente não estendeu o reajuste aos funcionários das lojas sindicalizadas, dizendo que uma mudança nos benefícios deve ser negociada como parte de um contrato mais amplo.
“Compartilhar o sucesso por meio de vitórias e benefícios com nossos parceiros está entre nossos valores fundamentais, e tem sido assim há 50 anos”, disse Schultz em maio.
“Nossos valores não são e nunca foram resultado de demandas ou interferências de qualquer entidade externa.”
Em nível mundial, os sindicatos representam uma pequena parcela do quadro de funcionários da empresa, principalmente no Chile.
Sindicato Starbucks
Os militantes pró-sindicato afirmam que as recentes melhorias anunciadas pela Starbucks são resultado de seus esforços, que incluem cerca de 60 greves de trabalhadores nos EUA.
A causa deles foi reforçada por um mercado de trabalho incomumente aquecido, que acabou empoderando os trabalhadores a se manifestarem em empresas nos EUA, incluindo Apple e Amazon.
Mas, à medida que a economia mostra sinais de desaceleração, essas condições podem estar mudando. Ao mesmo tempo, a resposta da Starbucks se intensifica, e os organizadores enfrentam pressão para negociar um contrato bem amarrado.
Evan Sunshine, de 20 anos, trabalhava em uma loja da Starbucks em Ithaca, Nova York, que votou pela sindicalização em abril e foi recentemente fechada pela companhia, alegando dificuldade em consertar a caixa de gordura da cozinha que havia transbordado.
Evan dá crédito ao sindicato por ajudá-lo a transferir seu emprego para outro local, mas adverte que “muitos trabalhadores estão começando a se cansar, e os trabalhadores de outras lojas que não se sindicalizaram podem até querer, mas têm medo por causa de toda essa retaliação”.
O sindicato Workers United acusou a Starbucks de violar a lei trabalhista, apresentando dezenas de queixas contra a companhia no National Labor Relations Board (NLRB), o órgão de fiscalização dos direitos trabalhistas do governo.
O NLRB apresentou 16 queixas por conta própria depois de investigar as reivindicações e, em alguns casos, buscou ordens judiciais para reintegrar funcionários demitidos imediatamente — um passo incomumente proativo.
A Starbucks, que está lutando contra as acusações, apresentou suas próprias queixas acusando o sindicato e as autoridades reguladoras de má conduta.
E pediu que as dezenas de eleições sindicais pendentes sejam suspensas enquanto suas reclamações são investigadas. A empresa também barrou recentemente um pedido do NLRB para reintegrar trabalhadores em caráter de emergência no Arizona.
Independentemente da maneira como essas disputas forem resolvidas, Risa Lieberwitz, professora de direito trabalhista da Universidade de Cornell, nos EUA, e diretora do Worker Institute, diz que as empresas americanas muitas vezes ultrapassam os limites da lei, já que as proteções e penalidades por violá-las são notoriamente fracas.
Segundo ela, o risco mais sério para a empresa pode ser que o embate afete sua marca, já que pesquisas indicam que a aprovação dos americanos à organização sindical subiu para o nível mais alto em décadas.
Recentemente, um grupo de investidores socialmente conscientes enviou uma carta à Starbucks pedindo que a companhia adotasse uma postura mais neutra, observando que a empresa tem um longo histórico de cortejar clientes progressistas aliando-se a causas como Black Lives Matter.
“A opinião pública é sempre importante, principalmente quando você tem uma corporação muito grande e conhecida que gostaria de se apresentar como [progressista]”, afirma Lieberwitz.
“Quando surge esse tipo de contradição… pode realmente prejudicar a reputação da empresa.”
Por enquanto, parece que a Starbucks está disposta a correr esse risco.
Na loja de Joselyn, os funcionários optaram em maio por não se filiar ao sindicato em uma votação cujo placar foi de cinco contra seis.
O sindicato está contestando os resultados, alegando práticas desleais.
Joselyn disse que seu gerente espalhou rumores de que ela estava sendo paga por seu trabalho sindical, cortou suas horas e advertiu a equipe de que seriam negadas promoções e outros benefícios.
“Foi muito decepcionante”, diz ela.
“Eles mexeram com as vulnerabilidades das pessoas e me difamaram, foi assim que eles venceram.”
Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!
Você precisa fazer login para comentar.