• Georgina Rannard e Esme Stallard
  • BBC News Clima e Ciência

Legenda da foto,

Quais nações assumiram postura de liderança e quais ficaram para trás desde a última Cúpula do Clima da ONU?

Em novembro de 2021, líderes globais se reuniram na Cúpula do Clima da ONU (COP26) em Glasgow, na Escócia, para acordar os próximos passos no combate às mudanças climáticas.

Mas especialistas em clima avaliam que o progresso em 2022 tem sido lento, com os governos de todo o mundo distraídos pelas crises globais de energia e econômica.

Na semana passada, a ONU (Organização das Nações Unidas) alertou que o mundo está caminhando para uma catástrofe. Mas há motivos para ter esperança — incluindo uma nova legislação dos EUA e uma mudança de governo no Brasil que pode frear a destruição da floresta amazônica.

Enquanto a COP27 acontece no Egito, analisamos sete atores-chave para avaliar quem está liderando o caminho e quem está ficando para trás no combate às mudanças climáticas.

Brasil: novo presidente, nova esperança?

O Brasil tem uma das chaves para combater as mudanças climáticas — sua enorme floresta amazônica, o pulmão do planeta, que absorve enormes quantidades de carbono.

Em uma eleição dramática no último dia 30, o presidente Jair Bolsonaro não conseguiu se reeleger, perdendo para Luiz Inácio Lula da Silva — o que potencialmente muda drasticamente o futuro da Amazônia.

“O Brasil está pronto para retomar sua liderança na luta contra a crise climática”, disse Lula.

Somente em 2021, o desmatamento aumentou 48%. Renata Piazzo, diretora executiva do Instituto Arapyau, diz que parte desse crescimento se deve ao fato de Bolsonaro defender mais mineração na Amazônia.

Desde Glasgow, as metas do Brasil têm sido criticadas como “menos ambiciosas” do que aquelas estabelecidas em 2016, e por não cumprir suas promessas.

Crédito, Reuters

Legenda da foto,

Um terreno recentemente desmatado na floresta amazônica, em Manaus

Historicamente, o Brasil vem usando hidrelétricas para produzir grandes quantidades de energia limpa — mas uma seca em 2021 afetou o nível de suas barragens. Ao mesmo tempo, o país tem investido em petróleo e gás, com previsões de que a produção de óleo aumente em 70% até 2030.

No entanto, a Agência Internacional de Energia prevê que a energia solar compensará a perda de energia hidrelétrica do país.

EUA: um líder climático novamente?

Os EUA deram um grande salto este ano quando aprovaram novas legislações abrangentes para enfrentar as mudanças climáticas.

Medidas dentro da Lei de Redução da Inflação podem reduzir as emissões de gases de efeito estufa dos EUA — aqueles gases que aquecem a atmosfera — em 40% até 2030.

“Este é o maior investimento em soluções climáticas na história dos EUA. É um grande sinal de progresso”, diz Dan Lashof, diretor americano do World Resources Institute, à BBC News.

O projeto de lei visa tornar a energia verde o padrão em grandes setores como o elétrico, transporte e indústria. O resultado mais óbvio para os consumidores é um crédito fiscal de cerca de US$ 7.500 (cerca de R$ 40 mil) para quem compra um carro elétrico.

Mas nem tudo são boas notícias. Depois que a democrata Nancy Pelosi realizou uma controversa visita a Taiwan, a China encerrou sua cooperação com os EUA sobre o clima — o que pode afetar seriamente as negociações internacionais sobre o tema.

E em resposta à crise de energia, o presidente Joe Biden liberou ao mercado 15 milhões de barris de petróleo das reservas americanas e aprovou novos arrendamentos para perfuração de petróleo e gás.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Joe Biden anuncia a liberação de 15 milhões de barris de petróleo da reserva estratégica dos EUA, em outubro

Os EUA também não entregaram sua parcela justa de financiamento para apoiar os países em desenvolvimento que mais sofrem com as mudanças climáticas, o que pode prejudicar relações na COP27.

Reino Unido: liderança e ‘vacilo’

O Reino Unido sediou a COP26, garantiu grandes metas globais e mostrou-se um líder climático internacional claro.

Mas o Reino Unido chega à COP27 “mais fraco” com liderança “decepcionante”, diz Alyssa Gilbert, diretora de políticas do Instituto Grantham do Imperial College London.

O primeiro-ministro Rishi Sunak recuou de sua decisão inicial de não ir ao Egito devido a outras prioridades — especialistas dizem que isso comprometeu o Reino Unido.

“Uma das principais coisas sobre a COP é a liderança política do topo. A hesitação do primeiro-ministro é ainda pior em um ano em que somos os presidentes da COP”, diz Gilbert.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Rishi Sunak mudou de ideia e decidiu participar da COP27

E o Reino Unido não aumentou sua ambição para fazer frente às mudanças climáticas, de acordo com análise do Climate Action Tracker, que acompanha os planos apresentados pelos países à ONU.

(Elas são chamadas de Contribuições Nacionalmente Determinadas — parte do marco do Acordo de Paris, no qual os países prometeram aumentar regularmente a ambição para combater as mudanças climáticas).

A crise energética global também levou o Reino Unido a recuar nos compromissos de acabar com novas extrações de petróleo e gás no Mar do Norte e fechar usinas a carvão.

Essas mudanças podem não alterar fundamentalmente o equilíbrio energético do Reino Unido — mas “enviam o sinal errado”, explica Robert Falkner, professor de Relações Internacionais da London School of Economics.

União Europeia: pressionada pela Rússia

A União Europeia é historicamente progressista no combate às mudanças climáticas, mas a invasão da Ucrânia pela Rússia e o impacto no fornecimento de energia para a Europa minaram isso.

“Os líderes estenderam a vida útil das usinas a carvão e estimamos que as emissões europeias aumentaram cerca de 2% nos primeiros seis meses deste ano”, diz o professor Robert Falkner.

O Climate Action Tracker agora classifica as metas climáticas, políticas e financeiras da União Europeia como “insuficientes”, e a UE não atualizou a ONU com novos planos de Contribuições Nacionalmente Determinadas.

Mas o professor Falkner considera o retorno ao investimento em combustíveis fósseis um “revés temporário” e sugere que a UE pode aproveitar esta oportunidade para se tornar segura em termos de energia, investindo em fontes renováveis.

Um novo plano, o REPowerEU, busca aumentar a parcela de energia renovável da UE em 2030 de 40% para 45%.

Índia: grandes ambições prejudicadas pelo carvão

A Índia foi um dos poucos países a publicar metas climáticas atualizadas em 2022.

“É quase impossível falar sobre a Índia sem falar sobre progresso”, diz Kamya Choudhary, da London School of Economics.

O país promete reduzir a intensidade de suas emissões em 45% até 2030. Também planeja que 50% da energia instalada no país seja renovável.

Mas o plano da Índia de reabrir 100 minas de carvão (combustível fóssil mais poluente do mundo) pode ser uma barreira para essas ambições.

O professor Navroz Dubash, do Centro de Políticas Públicas e consultor climático da ONU, disse à BBC que as tarifas sobre o carvão ajudam a financiar infraestrutura essencial, e a perda dessa receita precisa ser compensada.

Crédito, AFP

Legenda da foto,

Trabalhadores carregam carvão no campo de Jharia em Dhanbad, no Estado de Jharkhand, na Índia

No entanto, como em outros países, Choudhary sugere que esta é uma medida de curto prazo para lidar com a crise energética.

O Climate Action Tracker diz que as promessas da Índia não são muito ambiciosas — elas podem ser alcançadas com ação limitada do governo.

Austrália: recuperando o terreno perdido

A política também mudou de cara na Austrália. Eleito em maio, o novo primeiro-ministro, Anthony Albanese, acelerou os planos climáticos, encerrando uma década de retrocessos.

O país apresentou novas metas à ONU, prometendo reduzir as emissões em 43% até 2030 — um grande salto em relação à meta anterior de 26%.

Mas Bill Hare, CEO da Climate Analytics, diz que isso só parece um progresso significativo devido a quão atrasada a Austrália estava.

Crédito, Reuters

Legenda da foto,

O novo primeiro-ministro Anthony Albanese se comprometeu a reverter a perda de biodiversidade na Austrália até 2030

“Até agora houve pouca mudança na política e certamente não na área de combustíveis fósseis”, diz ele.

Os Estados da Austrália lideraram o caminho no aumento do uso da energia renovável — mas o país continua entre os cinco maiores produtores de carvão do mundo.

Embora a Austrália tenha prometido na COP26 acabar com o desmatamento, foi classificada em 2021 como o único país desenvolvido que é um “ponto de atenção” para a perda de árvores — quase metade das florestas no leste da Austrália foram destruídas.

China: um ‘terrível’ poluidor investindo em energias renováveis

A China tem um papel complicado na ação climática global. Ao contrário dos países desenvolvidos, não é responsável pelas emissões históricas de gases de efeito estufa que os cientistas dizem ter causado as mudanças climáticas até agora.

Mas atualmente é um “terrível poluidor” devido ao seu crescimento econômico acelerado, explica Neil Hurst, membro sênior de políticas de energia e mitigação do Instituto Grantham. O país queima metade do carvão do mundo e reluta em reduzir isso devido à escassez de energia.

No entanto, a China também é, de longe, o maior investidor em energia renovável. Um quarto dos carros recém-emplacados na China são elétricos.

“Eles estão fazendo grandes esforços e estabelecendo metas exigentes, incluindo limitar o pico de suas emissões de carbono até 2030”, explica Hurst.

O país asiático tem grandes ambições em lidar com as emissões de carbono através do plantio de árvores. Em maio, o presidente Xi Jinping prometeu plantar 70 bilhões de árvores até 2030.

Reportagem adicional da equipe de Jornalismo de Dados.