O Brasil abriga cerca de 60 jornalistas estrangeiros, que fazem coberturas sobre o país para o exterior, de acordo com os cálculos feitos por entidades que reúnem profissionais da área.
Naturalmente, diante das últimas notícias envolvendo o assassinato do colega britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira, muitos dizem estar “em choque e consternados”.
Para o jornalista italiano Carlo Cauti, que trabalha no país desde 2012 e é o atual presidente da Associação dos Correspondentes Estrangeiros de São Paulo (ACE), as notícias envolvendo Phillips e Pereira tiveram “um impacto muito pesado e muito ruim” na comunidade de profissionais de imprensa de outros países.
“No começo, quando surgiram as primeiras informações sobre o desaparecimento, a gente torcia para que eles tivessem se perdido na floresta e logo fossem encontrados”, conta.
“Com o passar do tempo, muitos correspondentes começaram a achar que o pior tinha realmente acontecido”, completa.
Jornalistas ameaçados
Cauti, que trabalhava para revistas e agências de notícias da Itália e hoje é editor da Exame, avalia que, entre jornalistas estrangeiros, “o Brasil nunca foi considerado um lugar tranquilo de trabalhar, especialmente em algumas regiões da Amazônia”.
Ele também aponta que a repercussão internacional do caso, especialmente na mídia do Reino Unido, vai impactar a forma como os correspondentes atuam no país.
“O Brasil não é um Iraque ou um Afeganistão, mas nunca foi visto como um lugar tranquilo para jornalistas”, reforça.
Para sustentar esse ponto de vista, ele lembra da quantidade de profissionais da imprensa brasileiros que são assassinados todos os anos no país.
“Quantos jornalistas morreram e nem viraram notícia? Geralmente, eles trabalham em veículos locais de pequenas cidades e são a única fonte de informação independente”, observa.
“Daí eles fazem alguma cobertura que desagrada um mandatário local, ou um cacique político, e acabam mortos.”
“O Brasil registra um total de 60 mil homicídios por ano. Muitos jornalistas acabam mortos e Dom Phillips foi um deles. Ele fazia parte de uma categoria inteira que está sob ataque”, complementa.
Isso coloca o país no décimo lugar do ranking de nações com mais assassinatos entre profissionais da imprensa, atrás de México (61 mortos), Afeganistão (51), Síria (34), Iêmen (24), Iraque (23), Paquistão (23), Índia (22), Somália (18) e Filipinas (16).
Além do risco à vida, repórteres e editores que trabalham no Brasil também estão expostos a ameaças e agressões: segundo um levantamento da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), foram registrados 145 casos de violência não letal com profissionais da área somente em 2021.
Os tipos de ataques mais comuns são ofensas (53 casos), agressões (34), intimidações (26), ameaças (12) e atentados (8).
Para Cauti, existem formas de evitar que novos episódios como o de Dom Phillips aconteçam.
“A primeira coisa que precisa ser feita pelas autoridades é garantir uma punição exemplar aos responsáveis por essa barbárie”.
O presidente da ACE considera ser difícil garantir totalmente a segurança dos profissionais de imprensa em todo o país.
“Não é factível pensar em 100% de segurança em áreas tão remotas, onde não existe qualquer possibilidade de contar com policiamento por motivos financeiros, logísticos ou legais”, analisa.
“Mas se um caso desses recebe uma punição exemplar, isso se transforma num sinal claro de que algo assim não pode acontecer nunca mais no país”, diz.
Choque e consternação
Além da ACE, de São Paulo, existe uma segunda entidade representativa dos jornalistas internacionais que atuam no país: a Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira no Brasil (ACIE), sediada no Rio de Janeiro.
Nas redes sociais, o grupo se manifestou logo após os anúncios de quarta-feira (15/6), quando a Polícia Federal confirmou que suspeitos confessaram o assassinato de Phillips e Pereira.
No texto divulgado, os responsáveis pela ACIE afirmam que “toda a comunidade de correspondentes estrangeiros no Brasil se encontra em choque e consternada”.
“Embora ainda estejamos aguardando as confirmações definitivas, essa é uma matéria que nunca gostaríamos de escrever. Dom foi da diretoria da ACIE por 4 anos e era amigo pessoal de muitos de nossos associados. Bruno era uma referência para qualquer jornalista internacional que fosse a trabalho para a região do Vale do Javari, no Estado do Amazonas. Os dois eram profissionais muito experientes, competentes e com uma paixão em comum: a floresta amazônica e a defesa dos povos indígenas.”
A nota ainda diz que os profissionais de imprensa estrangeiros estão “muito apreensivos e cobram providências urgentes das autoridades competentes”.
“Pedimos, com muita veemência, que a justiça seja feita.”
“Também expressamos nossa indignação diante do crescente aumento da violência contra jornalistas em todas as regiões do Brasil. A liberdade de expressão e de imprensa são garantias constitucionais e devem ser respeitadas no país”, finaliza o texto.
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