- Author, Norberto Paredes
- Role, BBC News Mundo
- Twitter, @NorbertParedes
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O Baluchistão é uma região partilhada pelo Paquistão, pelo Irã e pelo Afeganistão, com uma história marcada por conflitos.
O local é o lar de uma insurgência de longa data, travada por balúchis nacionalistas contra o governo paquistanês, que deixou milhares de vítimas de ambos os lados.
Agora, a região passou a ser um epicentro de tensões regionais. Irã e Paquistão se acusam mutuamente de abrigar “terroristas” separatistas balúchis.
Na quinta-feira (18/1), o governo paquistanês lançou um ataque sem precedentes contra o que chamou de “esconderijos terroristas” na província iraniana Sistão-Baluchistão – a parte iraniana do Baluchistão – no qual nove pessoas foram mortas.
Dois dias antes, o Irã atacou alvos ligados a um grupo militante no Baluchistão paquistanês.
Duas crianças foram mortas e outras três ficaram feridas no ataque, segundo as autoridades paquistanesas.
Esses ataques preocupam a comunidade internacional e aumentam os receios de que um conflito armado mais amplo possa eclodir na região.
Embora as relações entre o Irã e o Paquistão tenham sido historicamente complicadas, ambos os países sempre mantiveram um certo nível de cordialidade.
As nações compartilham problemas semelhantes em uma zona fronteiriça de intensa atividade de combatentes balúchis rebeldes. Especialistas no tema descrevem o local como uma “terra sem lei”, onde reina o caos.
O Baluchistão, que cobre 44% do Paquistão, possui enormes reservas de ouro, cobre e gás, que estão entre as mais importantes da Ásia.
Mas, paradoxalmente, o local continua a ser um território remoto e, em certo sentido, esquecido.
Trata-se da província mais pobre e menos desenvolvida do Paquistão.
Uma insurgência que começou após a divisão da Índia
Acredita-se que a região tenha recebido o nome por causa das tribos balúchis que habitam a área há vários séculos.
É provável que o local fosse anteriormente conhecido por outro nome, porque não existem registros desta cidade em fontes pré-islâmicas.
As insurreições militantes de grupos que lutam por um Estado independente para o povo balúchi começaram em 1948, após a divisão da Índia britânica, que levaria à criação da Índia, do Paquistão e de Bangladesh.
Desde então, os separatistas insistem que o povo balúchi se sente abandonado pelo governo paquistanês, e que tem pouca representação no Estado, apesar de ser a maior região do país.
Foi ali, sob o vasto deserto, que há mais de duas décadas o governo do Paquistão realizou os seis testes que fizeram do país o sétimo do mundo a desenvolver e testar com sucesso armas nucleares.
Os testes foram realizados em maio de 1998 no distrito de Chagai, sob a liderança do então primeiro-ministro Nawaz Sharif, e resultaram em condenação internacional e sanções contra o país.
“Nunca quisemos participar dessa corrida nuclear”, declarou Sharif à época. Ele alegou que os testes com dispositivos subterrâneos foram em resposta a então recentes testes nucleares da Índia.
Ataques a militantes
O Irã afirma que o ataque realizado na última terça-feira (16/1) teve como alvo “terroristas” do Jaish al Adl, um grupo separatista balúchi que também luta pela independência do Sistão-Baluchistão, a parte iraniana da região.
O governo de Teerã afirma que os militantes do grupo estão escondidos em solo paquistanês. O Paquistão nega.
Na quinta-feira (18/1), o Paquistão disparou mísseis contra o território iraniano. As autoridades argumentaram que o alvo do bombardeio foram duas frentes dos grupos militantes separatistas do Baluchistão que supostamente estão escondidas no Irã.
A verdade é que muitos grupos militantes atuam no Baluchistão, incluindo grupos talebãs paquistaneses, o grupo extremista muçulmano sunita Lashkar-e-Jhangvi e a facção separatista conhecida como Exército de Libertação do Baluchistão, que teria sido o alvo do ataque do Paquistão.
Em 2020, quatro homens do Exército de Libertação do Baluchistão invadiram a Bolsa de Valores de Karachi, a mais importante do Paquistão. Armados com espingardas e granadas, eles mataram dois seguranças e um agente da polícia e feriram outras sete pessoas antes de serem mortos.
Uma região importante para a China
O mesmo grupo também realizou um ataque em 2019 no hotel Zaver Pearl-Continental, na cidade portuária de Gwadar, no sul do Baluchistão. Os alvos eram investidores chineses e outros indivíduos que habitualmente se reúnem ali.
O complexo hoteleiro é visto por alguns grupos separatistas como o centro de operações do Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC), um megaprojeto anunciado em abril de 2015.
Com um investimento estimado em cerca de US$ 62 bilhões (R$ 305 bilhões) — um valor que supera o PIB de alguns países — o objetivo da iniciativa é construir uma rede de estradas, ferrovias e gasodutos ligando os dois países aliados.
Os militantes se opõem veementemente ao investimento chinês, argumentando que ele não traz qualquer benefício à população local.
“No Baluchistão, existem vários tipos de nacionalismo. Alguns se opõem a tudo o que o Paquistão faz, porque simplesmente querem se tornar um país independente”, avalia Saqlain Imam, jornalista do serviço urdu da BBC.
“Outros grupos sentem que o governo do país é dominado pelo Punjab — a província mais populosa do país e a segunda maior em área depois do Baluchistão — e não permite que o povo balúchi tenha voz nos projetos.”
Relatos de abuso e repressão
O Exército de Libertação do Baluchistão é apenas um dos seis grupos separatistas armados da região que já realizaram ataques.
Os Estados Unidos e o Reino Unido classificam a organização como “terrorista”.
O Baluchistão é atualmente uma província de difícil acesso para jornalistas e grupos de direitos humanos.
No entanto, vários abusos e alegações de repressão em grande escala por parte de militares paquistaneses foram documentados ao longo dos anos.
As autoridades locais negaram as acusações em diversas ocasiões.
Em 2023, dez soldados e agentes de segurança paquistaneses foram mortos em três ataques diferentes no Baluchistão, que foram atribuídos a combatentes separatistas.
Segundo os relatos, os ataques foram comandados por grupos que fazem operações a partir do Irã.
Especialistas e ativistas de grupos de direitos humanos estimam que as tensões entre os governos de Paquistão e Irã com os diferentes grupos separatistas balúchis continuarão até que as partes cheguem a algum tipo de acordo.
Fonte: BBC
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