Os governos da Grécia e do Reino Unido vivem momentos de tensão depois que Londres cancelou uma reunião entre o primeiro-ministro grego, Kyriakos Mitsotakis, e o premiê britânico, Rishi Sunak, marcada para estar terça-feira (28/11).
No centro do problema estão esculturas do Partenon — também conhecidas como Mármores de Elgin – atualmente em exibição no Museu Britânico, em Londres.
O governo grego está em uma campanha para recuperar as peças, mas até a véspera do encontro entre os premiês, o gabinete de Rishi Sunak acreditava ter garantias de que Mitsotakis não falaria publicamente sobre o assunto durante a sua visita ao Reino Unido.
Uma fonte do governo grego, porém, negou a informação. E, no domingo (26/11), o primeiro-ministro grego falou sobre as esculturas em entrevista à BBC.
Segundo Mitsotakis, ter parte das esculturas em Londres e o restante em Atenas é como “cortar a Mona Lisa ao meio”.
Na segunda-feira (27/12), o governo britânico cancelou a reunião.
O premiê grego afirmou estar “profundamente desapontado pelo cancelamento abrupto” e recusou um encontro com o vice-premiê do Reino Unido.
“Aqueles que acreditam firmemente na correção e justiça das suas posições nunca hesitam em se envolver em argumentação e debate construtivos”, disse.
“As nossas posições sobre a questão das esculturas do Partenon são bem conhecidas. Esperava me envolver em uma discussão com o meu homólogo britânico sobre esta questão, bem como abordar desafios globais significativos, como as situações em Gaza e na Ucrânia, a crise climática, e migração.”
As esculturas
Os frisos do Partenon foram levados da Grécia no início do século 19 por Thomas Bruce, mais conhecido como o conde de Elgin — por isso, também são chamados de mármores de Elgin.
No total, são 15 painéis e 17 esculturas de mármore que fizeram parte da decoração original do Partenon, construído há cerca de 2,5 mil anos, e que muitos gregos apontam como o principal patrimônio cultural do país.
Estima-se que o Partenon tenha sido concluído em 430 a.C. e sempre despertou admiração entre o povo local e estrangeiros.
No entanto, com o passar dos anos, deixou de ser um templo para a adoração de Atena e se tornou uma área de ruínas.
A impressionante estrutura sofreu grandes avarias ao longo do tempo, sobretudo durante os séculos 16 e 17, quando a Grécia era governada pelo Império Otomano.
O monumento foi atingido pela guerra Otomano-Veneziana, no final do século 17, quando recebeu um tiro de canhão que causou uma grande explosão e destruiu seu teto.
Depois, ao longo do século 18, grande parte das peças restantes foram gradualmente destruídas ou saqueadas.
E é exatamente no início do século 19 que entra em cena o conde de Elgin. Naquela época, ele era o embaixador britânico no Império Otomano, que controlava o território grego.
Segundo a versão apresentada por vários diretores do Museu Britânico, Lorde Elgin conhecia não só o imenso valor artístico dos frisos, como também a sua história, e queria levá-los ao Reino Unido no intuito de protegê-los da destruição.
Dessa maneira, ele negociou com as autoridades otomanas a permissão para levar os frisos e capitéis para Londres.
O processo de transferência foi feito a duras penas — várias obras sofreram danos significativos durante o trajeto até o Reino Unido. Demorou quase quatro anos para chegarem a Londres.
Na verdade, a iniciativa foi criticada por alguns no Reino Unido desde o início: o famoso poeta Lord Byron (1788-1824) se opôs à ideia de retirar os famosos mármores da Grécia e chamou Elgin de “vândalo”.
Em 1805, também foram encontradas contradições no discurso de Elgin, como apontam vários historiadores.
O conde havia dito aos otomanos que um dos motivos para a retirada dos frisos da Grécia era para serem apreciados por pessoas de todo o mundo.
Mas a primeira coisa que Elgin fez foi levar as famosas esculturas para casa.
O enorme custo da transferência e um divórcio levaram o conde à falência — e ele se viu obrigado a vender os frisos ao Museu Britânico por US$ 438 mil em 1816.
E é lá onde estão em exibição desde 1839.
Vale esclarecer, no entanto, que não são as únicas peças do Partenon que estão expostas fora de Atenas.
Em 2022, o então primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, se reuniu com Kyriakos Mitsotakis e disse que não cabia ao governo do Reino Unido decidir devolver os frisos do Partenon em exposição no Museu Britânico, em Londres — mas, sim, à instituição.
Outro argumento que vem sendo repetido em Londres há décadas é que a Grécia não tinha um local adequado para guardar os famosos mármores. Mas a alegação perdeu força com a inauguração do moderno museu da Acrópole, em 2009.
O esforço atual promovido por Mitsotakis contempla uma espécie de intercâmbio entre obras que nunca saíram da Grécia para serem expostas no Museu Britânico em troca da devolução dos frisos.
Até a renomada advogada de direitos humanos Amal Clooney fez recomendações sobre como o país poderia exigir a devolução dos frisos, apelando para o direito internacional.
Mas a Grécia disse anteriormente que não entraria com nenhum processo judicial e que se limitará aos esforços diplomáticos para chegar a uma decisão sobre o futuro dos cobiçados frisos.
Disputa interna
No plano de fundo da disputa diplomática está ainda a rivalidade política entre os conservadores e os trabalhistas sobre o futuro dos Mármores de Elgin.
O Partido Trabalhista, da oposição, descreveu a disputa como “patética”.
Keir Starmer, líder do Partido Trabalhista, se encontrou com Mitsotakis, o que já foi suficiente para provocar incômodo.
Keir também afirmou não se oporia a um empréstimo temporário das esculturas à Grécia, se isso fosse acordado entre o Museu Britânico e Atenas.
Uma fonte do alto escalão do Partido Conservador, de Rishi Sunak, afirmou à BBC que “se tornou impossível prosseguir com a reunião após comentários sobre os Mármores de Elgin”.
“Nossa posição é clara: os Mármores de Elgin fazem parte da coleção permanente do Museu Britânico e devem ficar aqui. É imprudente para qualquer político britânico sugerir que isso está sujeito à negociação.”
*Com reportagem de Chris Mason, Henry Zeffman e Harrison Jones, da BBC News
Fonte: BBC
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