Novas pesquisas mostram que a água da chuva na maioria dos locais da Terra contém níveis de produtos químicos que “excedem muito” os níveis de segurança.
Essas substâncias sintéticas — poli e perfluoroalquil, conhecidas pela sigla PFAS em inglês — são usadas em produtos como panelas antiaderentes, espuma de combate a incêndio e roupas impermeáveis.
Apelidados de “produtos químicos eternos”, eles persistem por anos no meio ambiente.
Tal é a sua prevalência agora que os cientistas dizem que não há mais lugar na Terra onde se possa evitá-los.
Pesquisadores da Universidade de Estocolmo dizem que é “de vital importância” que o uso dessas substâncias seja rapidamente restringido.
Os cientistas temem que os PFAS possam representar riscos à saúde, incluindo câncer, embora a pesquisa até agora tenha sido inconclusiva. Eles estão cada vez mais preocupados com a proliferação de PFAS nos últimos anos.
Existem cerca de 4.500 desses compostos à base de flúor e são encontrados em quase todas as residências da Terra em centenas de produtos de uso diário, incluindo embalagens de alimentos, capas de chuva, adesivos, papel e tintas.
Preocupações de segurança sobre a presença dessas substâncias duradouras na água potável também foram levantadas.
Riscos ainda incertos
No início deste ano, uma investigação da BBC encontrou PFAS em amostras de água na Inglaterra em níveis que excederam os níveis de segurança europeus, mas não excederam o nível de segurança atual na Inglaterra e no País de Gales.
Uma nova pesquisa publicada na revista Environmental Science & Technology analisa quatro produtos químicos específicos da classe e indica que os níveis das substâncias na água da chuva em todo o mundo muitas vezes “excedem muito” os níveis recomendados para água potável nos EUA.
O solo em todo o mundo está contaminado da mesma forma, sugerem evidências.
As descobertas do estudo levam os autores a concluir que uma fronteira planetária foi ultrapassada – simplesmente não há espaço seguro na Terra para evitar essas substâncias.
“Argumentamos aqui que não estamos mais dentro desse espaço seguro, porque agora temos esses produtos químicos em todos os lugares”, disse o professor Ian Cousins, principal autor do estudo feito na Universidade de Estocolmo.
“Não estou dizendo que todos vamos morrer desses efeitos. Mas estamos em um momento no qual você não pode viver em nenhum lugar do planeta e ter certeza de que o meio ambiente é seguro.”
Embora isso seja, sem dúvida, motivo de preocupação, existem algumas ressalvas.
Muitos desses níveis de segurança em vigor são consultivos, o que significa que não são legalmente aplicáveis.
Outros cientistas consideram que a ações contra esses produtos químicos não devem ser tomadas até que os riscos à saúde sejam mais claramente comprovados.
Muita pesquisa foi realizada sobre os riscos à saúde representados pelos PFAS, e os cientistas dizem que a exposição a altos níveis pode estar associada a um risco aumentado de alguns tipos de câncer, problemas de fertilidade e atrasos no desenvolvimento em crianças.
No entanto, tais associações não provam causa e efeito e outros estudos não encontraram conexão entre PFAS e doenças.
Mas para aqueles que passaram anos trabalhando em funções que os faziam ter contato com PFAS, as evidências no novo trabalho de pesquisa sublinham a necessidade de uma abordagem preventiva.
“Na chuva, os níveis já são mais altos do que os critérios de qualidade ambiental. Isso significa que, com o tempo, teremos um impacto estatisticamente significativo desses produtos químicos na saúde humana”, disse Crispin Halsall, da Universidade de Lancaster. Ele não está envolvido com o estudo sueco.
“E como isso vai se manifestar? Não tenho certeza, mas veremnos com o tempo, porque estamos excedendo as concentrações que vão causar algum dano, por causa da exposição de humanos em sua água potável.”
A remoção dos produtos químicos do estudo da água potável nas estações de tratamento é possível, embora dispendiosa.
Mas ficar abaixo dos níveis de aconselhamento dos EUA é extremamente desafiador, de acordo com os autores.
À medida que os cientistas obtiveram mais conhecimento sobre PFAS nos últimos 20 anos, os avisos de segurança foram continuamente reduzidos.
O mesmo aconteceu com a presença desses produtos químicos no solo – e isso também está causando problemas.
Pressão econômica
Na Holanda, em 2018, o ministério da Infraestrutura estabeleceu novos limites para as concentrações de PFAS no solo e no material de dragagem.
Mas isso fez com que 70% dos projetos de construção envolvendo remoção de solo ou uso de material escavado fossem interrompidos. Após protestos, o governo relaxou as diretrizes.
De acordo com o novo estudo, esse tipo de relaxamento dos níveis de segurança provavelmente também acontecerá com a contaminação da água.
“Se você aplicasse essas diretrizes em todos os lugares, não seria capaz de construir em qualquer lugar”, disse o professor Ian Cousins.
“Acho que eles farão a mesma coisa com os avisos de água potável dos EUA, porque não são práticos de aplicar. Não é porque há algo errado com a avaliação de risco. É apenas porque você não pode aplicar essas coisas. É simplesmente impossível, do ponto de vista econômico, aplicar qualquer uma dessas diretrizes.”
O principal desafio com esses produtos químicos é sua persistência, e não sua toxicidade, dizem os autores do estudo.
Embora alguns PFAS prejudiciais tenham sido eliminados pelos fabricantes há duas décadas, eles persistem na água, no ar e no solo.
Uma maneira pela qual os PFAS percorrem o ambiente é na forma de pequenas partículas transportadas em spray do mar para o ar e depois de volta à terra.
Essa incapacidade de se decompor no meio ambiente significa que os PFAS agora são encontrados mesmo em áreas remotas da Antártida, conforme relatado pelo Halsall recentemente.
Embora haja movimentos a nível europeu para restringir o uso desses produtos químicos e encontrar substitutos mais benignos, também há esperanças de que a indústria afaste-se rapidamente do uso de PFAS.
“Precisamos de produtos químicos e substâncias persistentes, queremos que nossos produtos durem muito tempo enquanto os usamos”, disse o professor Cousins.
“E embora existam vozes conservadoras na indústria, também existem atores progressistas. Fico muito otimista quando vejo essas indústrias progressistas trabalhando juntas.”
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