- Author, Andrea Díaz Cardona
- Role, BBC News Mundo
“Eu queria denunciar porque o que o monge havia feito era uma crime, mas meus pais tinham medo.”
Esse é o relato de Miguel Hurtado sobre seu longo e doloroso caminho até ser reconhecido como vítima de abuso sexual por um monge de um mosteiro católico localizado no entorno de Barcelona quando tinha 16 anos.
“A minha mãe acreditava que o grupo católico de jovens escoteiros da Abadia de Monserrat era muito seguro, mas infelizmente era muito mais perigoso do que parecia”, explica o psiquiatra catalão, hoje com 41 anos, que passou metade da vida buscando justiça.
Há mais de duas décadas que Miguel tenta quase de tudo para denunciar o que sofreu: gravações secretas, um documentário, um livro, um encontro com o papa Francisco, um abaixo-assinado e, claro, fazer terapia e contar sua história às autoridades e à imprensa.
A perseverança tornou seu casoum dos mais emblemáticos de abuso da Espanha.
Recentemente, a Defensoria Pública espanhola publicou um relatório elaborado por uma comissão independente sobre a pedofilia na Igreja Católica no país. É o primeiro do gênero e inclui a história de Miguel.
O relatório estima que 1,13% da atual população adulta espanhola tenha sofrido abusos cometidos por monges.
Os dados contradizem a versão da Igreja, que durante anos afirmou que o país era uma exceção ao restante do mundo.
E embora a instituição tenha inicialmente reagido ao relatório de forma fragmentada e sem um consenso claro, recentemente a Conferência Episcopal Espanhola anunciou que os bispos trabalharam “no primeiro rascunho do plano abrangente de reparação para as vítimas de abusos”.
A Conferência Espanhola de Religiosos (CONFER), por sua vez, agradeceu, em um comunicado, o trabalho realizado pela Defensoria Pública, comprometendo-se a estudar as recomendações do relatório e pedindo desculpas às vítimas.
A investigação oficial espanhola foi feita após em 2022 vários partidos políticos solicitarem a criação de uma comissão para analisar o tema.
Entre os argumentos estava o fato de, ao contrário de países vizinhos, como França e Portugal, e de muitos outros, a Espanha não ter investigado formalmente os abusos cometidos pela Igreja.
A BBC conversou com Hurtado para falar sobre o relatório, mas também sobre sua história, seu ativismo e sobre o complexo processo que as vítimas de pedofilia dentro da Igreja Católica devem enfrentar para denunciar e fazer justiça.
O abuso
“O que eu pensava era: se aconteceu comigo, pode ter acontecido com outros. Temos que encontrar uma maneira de detê-los.”
Miguel tinha 17 anos quando chegou a essa conclusão.
Seu agressor foi o monge Andreu Soler, que liderava há mais de 40 anos um grupo de jovens escoteiros na emblemática Abadia de Montserrat, um ícone da cultura catalã.
Eles tinham se conhecido havia alguns anos, naquele grupo, e o monge foi aos poucos tornando-se um guia espiritual em quem o jovem Miguel tinha bastante confiança.
Tanta que confessou sua angústia ao saber que era homossexual.
“Eu disse a ele que era gay, que estava aceitando isso, que meus pais não sabiam e que estava preocupado com como contar a eles.”
A partir daquele momento, o comportamento do monge começou a deixar Miguel confuso.
Por um lado, era um homem respeitado pela comunidade, carismático, muito preocupado com o bem-estar dos jovens e que, além do mais, demonstrou interesse em ouvi-lo e o orientava.
Mas, por outro lado, era um homem de 65 anos que procurava ficar sozinho com ele à noite e que lhe disse que se “trabalhassem juntos, os impulsos homossexuais poderiam ser curados”.
“Para mim ele era uma figura paterna e seu discurso era: assim como me interesso pelo seu bem-estar e procuro te dar conselhos sobre família, sobre amigos, também dou conselhos sobre educação sexual.”
Mas esses conselhos passaram a incluir toques que foram subindo de nível.
“Quando ele me beijou de língua fiquei petrificado. Cerrei os dentes com muita força porque não queria que ele fizesse isso comigo. Não estava gostando do que estava acontecendo e fiquei em choque. Não consegui reagir.”
Logo ficou claro.
“A barreira da negação que tive durante tantos meses ruiu. Entendi que o que o monge estava fazendo não era parte de uma tentativa de fornecer educação sexual, mas sim um abuso.”
“O que aconteceu foi que ele tirou proveito dessa informação confidencial para começar a abusar sexualmente de mim.”
A denúncia
A primeira pessoa para quem Miguel contou sobre o abuso foi outro monge, que notou que ele estava estranho e resolveu perguntar o que estava acontecendo.
O monge foi empático e compreensivo no início, mas quando Miguel quis levar adiante sua denúncia e saber quais poderiam ser os próximos passos, deparou-se com o sigilo.
“Ele tinha uma atitude mais defensiva. Era como se tivesse sido uma brincadeira de criança. Uma brincadeira sem importância, que você dá um tapinha na mão para que não volte a acontecer e pronto.”
Miguel logo entendeu que a igreja não tinha vontade de levar o caso à polícia, nem de avisar seus pais ou os dos outros jovens, e muito menos de encontrar outras vítimas.
“Fiquei muito, muito chocado porque não esperava por isso. Uma pessoa falhar é difícil. Mas ter uma segunda pessoa e a instituição falhando com você é muito mais difícil.”
O próximo passo foi contar a seus pais, já que eram seus representantes legais.
Ao saber, a mãe de Miguel decidiu enviar uma carta ao abade principal queixando-se do ocorrido e de que nenhuma providência tinha sido tomada.
“O abade respondeu dizendo que o agressor havia sido transferido para um mosteiro no interior da Catalunha e que não haveria mais esse tipo de problema.”
“Ele foi caloroso, carinhoso, mostrou-se preocupado com o meu bem-estar e recomendou que a minha mãe não denunciasse, que era melhor que tratassem internamente porque senão teriam que procurar um advogado para o agressor.”
Naquele momento ficou claro, para Miguel, o acobertamento institucional.
“Eles tiveram a reação habitual. A princípio, a negação, fingindo que nada está acontecendo e, quando a denúncia atinge um certo nível e não há como contê-la, resolvem o problema deslocando o agressor para outro lugar dentro da rede de instituições da mesma Igreja Católica.”
Mas para Miguel já estava claro que o que tinha acontecido era um crime e ele queria denunciar às autoridades espanholas. O problema era convencer seus pais.
“Meus pais tinham medo das consequências, tinham medo da hostilidade social, tinham medo que ninguém acreditasse em mim. Eles estavam com medo de que a abadia contratasse uma boa equipe de advogados, que nos destruiria judicialmente.”
“Houve um choque e eles não me apoiaram na hora de fazer a denúncia. Na época eu era dependente financeiramente e meus pais não iam me apoiar. Tentei virar a página, focar nos estudos e seguir com a vida.”
A gota d’água
Miguel entregou-se por completo aos estudos de medicina e teve um alto desempenho acadêmico.
A intenção era esquecer o abuso até que em 2002, quando ele tinha 20 anos, surgiu o escândalo de pedofilia na Igreja Católica de Boston, nos Estados Unidos.
A investigação que o jornal The Boston Globe publicou em diversas reportagens mostrou não só que foram muitos os menores abusados por monges, mas que a Igreja era responsável por proteger e acobertar os abusadores.
“Isso mexeu muito comigo. Os estímulos do noticiário, da TV, fizeram emergir e vir à tona o trauma reprimido. Fiquei muito mal. Não conseguia dormir.”
Miguel procurou ajuda. Conhecia uma fundação que trabalhava com abuso sexual infantil e oferecia terapia de grupo. Decidiu então contactar novamente a abadia para pedir uma indenização.
“Escrevi-lhes uma carta, muito nervoso, na qual os criticava pela forma como lidaram com os fatos. Eu disse a eles que estava mal, que precisava de terapia, que não achava que meus pais tinham que pagar por isso e que precisava de uma compensação financeira para pagar os custos disso.”
Desta vez a instituição respondeu com uma carta do seu advogado em que solicitava uma reunião. Miguel compareceu na companhia de um advogado.
“Eles me fizeram explicar o abuso novamente. Acho que foi um confronto para comparar o que eu contava com o que escrevi e ver se o meu testemunho era crível.”
“No final, a minha advogada e o advogado deles concordaram com uma compensação bem básica e baixa, de cerca de 7.200 euros para despesas com terapia. Eles não quiseram pagar diretamente, por transferência bancária, para não deixar vestígios. Fizeram três pagamentos em envelopes com notas de 500 euros.”
O processo serviu para que sua mãe se juntasse à causa.
“Quando a minha mãe viu que, ao pedir uma indenização, aquela mesma reação pastoral mudou e eles tomaram uma atitude tão hostil e legalista, mais típica de uma multinacional, ela percebeu que tinha sido enganada e usada.”
Miguel finalmente sentiu-se apoiado pela família, e a terapia foi o primeiro passo para começar a superar o trauma do abuso sexual.
Nesse processo compreendeu que o seu agressor tinha sido uma figura paterna, algo que lhe faltava num momento fundamental de sua vida.
Com o passar do tempo, no entanto, ele quis verificar se a igreja havia cumprido a promessa de isolar o agressor e decidiu procurá-lo online.
“Descobri que ele havia falecido. Mas também descobri que antes de morrer, a Abadia de Montserrat publicou um livro de suas memórias com prólogo de Jordi Pujol, ex-presidente do governo catalão.”
“Para mim isso foi a gota d’água, o último insulto, e percebi que tinha que fazer alguma coisa.”
Era 2011, Miguel já tinha 29 anos e conhecia melhor a instituição que enfrentava.
As provas
A primeira coisa que Miguel fez foi colocar em ação um plano para obter as provas que pudessem respaldar seu depoimento.
A essa altura ele sabia que o mais provável é que não acreditassem nele e que, pelo contrário, o desacreditassem.
Decidiu então contatar novamente os líderes da instituição católica. Enviou-lhes outra carta solicitando uma reunião, à qual decidiu comparecer com uma câmera escondida para registrar toda a conversa.
Ao longo de vários anos, Miguel marcou diversas reuniões com autoridades católicas que sabiam do seu caso, e gravou-as.
“O monge Josep María Sanromá, a quem contei sobre meus abusos quando ocorreram, justificou-se dizendo que havia explicado ao abade da época o que havia acontecido e que foi o abade quem decidiu não fazer nada.”
“Com o abade Josep María Soler, nomeado quando eu tinha 18 anos, tive duas conversas. Ele disse que meu agressor negou os fatos. Mas na década de 70 ouviram-se histórias, rumores de comportamentos sexuais inadequados quando ele era responsável por um grupo de jovens que se reuniam nos fins de semana para irem a um retiro católico.”
“Ele disse que não sabia se medidas haviam sido tomadas ou não, mas que quando eu, décadas depois, expliquei o que havia acontecido comigo, ele não foi pego de surpresa.”
“E a justificativa que ele me deu sobre o livro foi que ele não sabia, como abade, que havia sido publicado. Que a editora atuava de forma independente, mas que ele se comprometeria a retirá-lo de circulação e a destruir todos os exemplares.”
Com estas gravações, Miguel conseguiu obter provas de que os líderes católicos sabiam dos abusos que ele havia sofrido e que mesmo assim não denunciaram às autoridades.
Mas faltava um último passo: devolver o dinheiro que lhe tinham dado de maneira não oficial para a terapia e assim provar que as transações haviam ocorrido.
“Aproveitei para devolver o dinheiro e dizer que era dinheiro sujo, que eu não queria e que tinham me usado. Eu gravei enquanto devolvia.”
“E no final eu disse a eles que tinham me pedido insistentemente para ficar calado, mas que nessa situação já não podia garantir que o faria. Ele me pediu novamente para ficar em silêncio porque o abade da época, quando eu era menor e o abuso ocorreu, já era muito velho e isso o perturbaria e o afetaria muito.”
Foi nessa época que Miguel começou a contar seu caso, sob anonimato, a alguns meios de comunicação locais.
Contar tudo
“Agora que somos adultos empoderados podemos contar a história do abuso sexual de menores na Igreja Católica espanhola”, diz Hurtado.
Em 2019, aos 37 anos, Miguel contou sua história ao jornal espanhol El País. Nomeou seu agressor e aqueles que supostamente o encobriram, apoiado pelas provas que reuniu.
No mesmo ano, colaborou com o documentário Exame de Conciência, que expõe o caso de pedofilia na Igreja Católica espanhola e foi distribuído pela Netflix.
“O que me motivou foi que na minha escala de valores, na minha escala ética e moral, não era aceitável que uma instituição, por mais poder, prestígio ou influência que tivesse, se comportasse daquela forma.”
“Eles se comportaram como uma organização mafiosa, criminosa. Da porta para fora, faziam um discurso sobre os valores cristãos humanistas, cuidado dos vulneráveis, a defesa dos direitos das crianças. Da porta para dentro, cometeram mil e um crimes. Eu sabia que, eticamente, tinha que relatar o que havia acontecido e que era importante que a verdade fosse conhecida.”
Depois de 20 anos tentando, de diversas maneiras, Miguel só precisou fazer uma denúncia pública.
“Era a única ferramenta de poder que eu tinha. Quando tive a primeira crise, consultei uma advogada e ela explicou que, de acordo com a legislação aplicável na época, o meu caso expirava três anos depois da maioridade, ou seja, aos 21 anos. Legalmente eu não poderia fazer nada. As portas da justiça estavam fechadas. E foi isso que aconteceu na maior parte dos países.”
Mas sua estratégia valeu a pena. Ele fez parte do grupo de ativistas de todo o mundo que participou do primeiro encontro anti-pedofilia organizada pelo papa Francisco em Roma, em fevereiro de 2019.
Além disso, as suas denúncias encorajaram outras vítimas a contar suas histórias e, diante das evidências, a igreja decidiu convocar uma comissão independente para uma realizar uma investigação interna.
“Em setembro de 2019 os resultados foram publicados e o que a comissão independente disse foi que o meu agressor tinha sido um predador sexual. Que ele abusou de pelo menos 12 crianças ao longo de 30 anos. E não só isso, mas não foi o único caso de abuso sexual ocorrido em Montserrat.”
Miguel decidiu, então, passar a dedicar seu ativismo à questão da imprescritibilidade dos crimes sexuais contra menores, pois acredita que a prescrição legal tem sido a grande aliada dos abusadores e daqueles que os acobertam.
Dessa ideia surgiu a campanha “Abuso não prescreve” na plataforma Change.org.
“Consegui 560 mil assinaturas e demorou muito para que os políticos se interessassem. Mas em 2021, foi finalmente aprovada uma lei que ampliou o prazo de prescrição para 17 anos, para que as vítimas tenham mais 17 anos para denunciar em casos ocorridos após a entrada da lei em vigor.”
Embora o prazo tenha sido prorrogado, esses crimes continuam a prescrever na Espanha. E por isso ele buscou aconselhamento de outros países que legislaram a favor da imprescritibilidade. A ideia era fornecer elementos para o relatório da Defensoria Pública que começou a ser elaborado em 2022.
“Há outros países como Peru, Equador, Chile e Colômbia que já aprovaram a imprescritibilidade total. Os ativistas espanhóis continuam a lutar para que os prazos de prescrição sejam completamente eliminados. É uma luta muito dura e muito longa porque os políticos não estão dando muito apoio.”
O relatório
Em março de 2022, o Congresso espanhol solicitou à Defensoria Pública a criação de uma comissão independente, a ser presidida pelo próprio Congresso, que preparasse um relatório sobre as denúncias de abusos sexuais na Igreja Católica espanhola.
No dia 27 de outubro, um ano e sete meses após essa atribuição, o defensor Ángel Gabilondo apresentou ao Congresso um material de 779 páginas intitulado “Relatório sobre abusos sexuais no âmbito da Igreja Católica e o papel dos poderes públicos. Uma resposta necessária”.
A comissão recebeu o testemunho de 487 vítimas, que estão anônimas no texto.
Além disso, como parte da investigação, foi realizado um estudo com uma amostra de 8.000 pessoas residentes em Espanha.
O objetivo foi tentar quantificar a magnitude do problema e, com base nos dados recolhidos, concluiu-se que 1,13% da atual população adulta sofreu abusos na Espanha por parte de religiosos católicos.
“A mídia, ao extrapolar os dados, deu números de 230 mil vítimas de pedofilia por parte de religiosos na Espanha e aproximadamente 400 mil de abusos sexuais em instituições católicas”, explica Miguel.
O cardeal Juan José Omella, presidente da Conferência Episcopal Espanhola (CEE) e arcebispo de Barcelona, rejeitou esses números, em postagem em sua conta no X (antigo Twitter).
Disse que “os números extrapolados por alguns meios de comunicação são mentiras e têm a intenção de enganar” e prometeu: “Não nos cansaremos de pedir perdão às vítimas e de trabalhar pela cura delas”.
O relatório do defensor é o primeiro oficial sobre a questão no país, que também tem sido criticado pela demora na resposta a um fenómeno de interesse público e de escala global.
O atraso é reconhecido no texto. “O nosso país está entre os últimos da Europa Ocidental a criar uma comissão e a produzir um relatório. Entre os países mais próximos, tanto a França (2021) quanto Portugal (2023) já o fizeram.”
“Mas muito antes, mudando de continente, vale lembrar que o Canadá criou uma comissão parlamentar em 1989 e apresentou um primeiro relatório em 1992 (ampliado em 2007), e os Estados Unidos os seguiram (2004).”
Miguel não estranha a demora.
“Durante 40 anos, a Espanha foi uma ditadura católica, onde o poder civil e o poder religioso eram irmãos siameses. Não se sabia onde começava um e terminava o outro, e havia uma enorme resistência por parte da imprensa e das autoridades civis na hora de investigar esses acontecimentos.”
Mas a Espanha enfim deu um primeiro passo e Miguel foi parte do processo. Na verdade, no relatório da Defensoria Pública, analisam seu caso e como seu ativismo conseguiu colocar o assunto na ordem do dia e obter a modificação do prazo de prescrição.
“Consegui que uma equipe jurídica chilena muito poderosa, que redigiu a lei chilena de imprescritibilidade, escrevesse um documento técnico-jurídico de 120 páginas recomendando uma lei de imprescritibilidade na Espanha.”
“Entreguei esse relatório à comissão de investigação da Defensoria Pública. Tive uma reunião com Ángel Gabilondo para explicar a medida.”
Mas ele sente que não foi totalmente ouvido.
“Ao ler o relatório, verifica-se que as vítimas em múltiplas ocasiões e de múltiplas formas pedem a imprescritibilidade, mas continuam a não nos ouvir e continuam a não incluí-la nas recomendações.”
Miguel está dedicado a fazer essa mudança para contribuir, de alguma forma, para a proteção das novas gerações.
“O principal problema é que o abuso sexual infantil é sempre um abuso de poder. E quanto maior a assimetria entre a criança e o adulto, mais difícil é denunciá-los e revelá-los sendo criança ou adolescente.”
“Para poder contar sua história com segurança e não sofrer retraumatizações secundárias, é fundamental estar empoderado.”
“Em muitas ocasiões, é preciso ter feito terapia. Você tem que contar a história para o círculo interno e encontrar um círculo que o proteja e ajude. Você tem que ser independente financeiramente. É preciso ter recursos pessoais e financeiros.”
E essas condições que Miguel descreve são alcançadas, na maioria dos casos, somente anos depois de os abusos terem ocorrido.
“As evidências científicas nos mostram que são necessárias décadas para que as vítimas consigam denunciar estes acontecimentos. É por isso que existem campanhas muito ativas em grande parte do mundo para ampliar ou eliminar o prazo de prescrição para crimes de pedofilia.”
A luta de Miguel é motivada pelo menor que ele era, que ninguém conseguiu proteger de ser abusado, e que se tornou um adulto que teve que trabalhar incansavelmente para enfrentar seu trauma.
“Quando você fica mais velho, você vê o impacto que o abuso sexual teve em sua vida e compara como foi a sua vida e como poderia ter sido se você não tivesse sido abusado sexualmente.”
“Você tem que lamentar a perda das múltiplas oportunidades que outras crianças da sua idade desfrutaram, mas que você não pôde porque estava deprimido, angustiado, traumatizado, trancado em um quarto sem ver ninguém.”
Fonte: BBC
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