- Juliana Gragnani e Julia Braun
- Da BBC News Brasil em Londres e São Paulo
Em um grupo de WhatsApp que reúne pessoas de diferentes opiniões políticas, um usuário compartilha um link para um vídeo mostrando o presidente Jair Bolsonaro (PL) fazendo um discurso no que parece ser uma loja da Maçonaria. “Que absurdo! Eu, como cristão, não voto mais!”, diz ele.
Outra pessoa rebate: “Se quer ver realmente um lado religioso nas campanhas, veja matéria de ontem”. O link que encaminha é de uma “reportagem” sobre um vídeo que acusa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de ser satanista.
Esse diálogo ilustra a guerra entre campanhas que já dominou as redes nos dois primeiros dias de campanha para o segundo turno.
Eleitores devem escolher entre Bolsonaro e Lula para a Presidência do país no dia 30 de outubro.
Os episódios dessa segunda fase de campanha repetem a fórmula, dessa vez tirando informações de contexto para atacar a imagem de ambos os candidatos.
O vídeo compartilhado por bolsonaristas foi gravado por um influenciador que se define como satanista e não tem ligação com o ex-presidente nem com suas propostas de governo.
Em frente a uma bandeira com o rosto de Lula, ele diz que apoiadores de Bolsonaro “estão arruinados”. O vídeo foi publicado no TikTok, onde o influenciador tem quase um milhão de seguidores.
O vídeo viralizou quando foi compartilhado em massa por bolsonaristas, ao lado de mensagens como a de que o Brasil estaria correndo um “risco espiritual” caso Lula seja eleito.
Nesta terça (4), o influenciador publicou outro vídeo dizendo que sua fala foi tirada de contexto. “O candidato Lula não tem qualquer ligação com nossa causa espiritual”.
A campanha de Lula reagiu e publicou uma nota desmentindo ligação do candidato com o satanismo.
“Bolsonaristas soltaram um vídeo que tenta ligar Lula e o satanismo. Essa relação não existe. Espalhar isso é abusar da boa-fé das pessoas de fé”, disse, em nota. “Lula é cristão, católico, crismado, casado e frequentador da igreja. Não existe relação entre Lula e o satanismo.”
Mas o vídeo já havia alcançado milhões por meio de páginas bolsonaristas no Instagram.
Mais de 2,2 milhões de pessoas haviam visualizado o conteúdo publicado pelo perfil da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) na tarde de segunda-feira. Sob o vídeo, ela escreveu: “A guerra é espiritual! É o bem contra o mal!”.
E o mesmo conteúdo foi visto 1,1 milhão de vezes na página do pastor e deputado federal Marco Feliciano (PL-SP).
O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o senador eleito Cleitinho (PSC-MG) também publicaram o vídeo em suas redes.
Reação de apoiadores
Nas redes, apoiadores de Lula buscaram contra-atacar, divulgando um vídeo em que o mesmo influencer aparece criticando, e não apoiando, o candidato do PT.
Mas o maior contra-ataque foi a divulgação do vídeo de Bolsonaro fazendo um discurso em uma loja maçônica.
Sem data, a gravação mostra Bolsonaro se apresentando como deputado federal e dizendo que não estava “candidato a nada”, indicando que é anterior a 2019.
Nas imagens, o atual presidente afirma que o Brasil vive uma ameaça tão grave, ou até mesmo maior, do que a corrupção, a questão “ideológica”.
O vídeo foi compartilhado por diversos perfis em redes sociais como Twitter, Facebook, Instagram, TikTok e Kwai.
Um dos posts, compartilhado por uma página que se descreve como de notícias sobre o mundo pop, tem mais de 8,5 milhões de visualizações e 170.000 curtidas.
A mesma página também repostou algumas notícias antigas sobre aliados de Bolsonaro e a maçonaria. Uma das mensagens fala sobre a deputada Carla Zambelli, que se casou em 2020 em uma cerimônia maçônica, e outra sobre o vice-presidente general Hamilton Mourão, maçom há mais de duas décadas.
Em 2018, Mourão incluiu em sua campanha como vice de Bolsonaro visitas a templos dessa fraternidade de homens.
No Facebook, o deputado federal e ex-candidato à Presidência da República André Janones publicou um texto em que faz referência ao vídeo de Bolsonaro na Maçonaria.
“Urgente: satanistas ateus da Maçonaria pedem que Bolsonaro seja eleito para representá-los!”, diz a mensagem, que já tem 3.400 compartilhamentos.
No TikTok, a hashtag sobre o assunto já tem mais de 5.000 visualizações. Já no no Twitter, tinha pelo menos 1.000 menções até o início da tarde.
A campanha de Bolsonaro ainda não se pronunciou sobre as postagens. A reportagem procurou a Presidência, mas até o momento da publicação ainda não tinha obtido resposta.
Em resposta ao questionamento da BBC News Brasil sobre o tema, o pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo e aliado de Bolsonaro, disse que não vê problemas no presidente visitar uma loja de maçonaria. “Ele é presidente de todos, qual o problema?”, afirmou.
Muitos grupos religiosos, como parte dos evangélicos, comparam a maçonaria a uma seita. O Vaticano já afirmou que os princípios maçônicos são incompatíveis com a doutrina da Igreja Católica.
Em seu site, porém, a Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil afirma que a maçonaria não é “uma seita ou religião”.
“Ela também não se enquadra como uma sociedade secreta, visto que nossas organizações têm estatutos registrados em cartório, sites oficiais, endereços com fachadas etc.”
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