- Author, Alex Taylor
- Role, BBC News
“Sinto falta dele a cada minuto”, desabafa Klas Bergling, pai do DJ, durante uma videochamada sincera e profundamente pessoal.
“É claro que falo com ele todos os dias. Mas…”, ele faz uma pausa, “eu admito que às vezes fico bravo com ele. Por que você fez isso? Por que nos deixou?”
Avicii, cujo nome de batismo era Tim, alcançou uma fama tão explosiva quanto os sintetizadores vibrantes em seu sucesso Levels.
O sucesso de 2011, que traz uma amostra alegre de uma música de Etta James, catapultou o sueco, então com 22 anos, à fama.
Nos cinco anos seguintes, à medida que a dance music evoluiu para o gênero onipresente e líder das paradas conhecido como EDM, com Levels como seu hino, Avicii se tornou seu garoto-propaganda, loiro e de maçãs do rosto salientes — segundo alguns relatos, ganhando US$ 250 mil (cerca de R$ 1,3 milhão) por noite em suas turnês.
Mas, aos 26 anos, ele se aposentou das apresentações.
Em mensagem aos fãs, ele mencionou sua saúde física e mental — sem detalhar toda a extensão de seus problemas, que envolviam ansiedade, pancreatite, dependência de álcool e de analgésicos.
Apesar de um período de recuperação, produzindo música longe dos holofotes, Tim continuou lutando com demônios interiores em sua busca por respostas existenciais.
Agora, sua família quer que as pessoas conheçam Tim longe dos holofotes, lançando um livro com fotos para homenagear seu legado.
Faz parte dos esforços da família através da Fundação Tim Bergling, criada em sua memória em 2019, para abrir o debate sobre a crise de saúde mental entre os jovens.
Klas, que fez a curadoria cuidadosa das fotos de Tim desde a infância até o sucesso, explica: “Queremos ajudar as pessoas a ver além da fama de Avicii. É também por isso batizamos seu álbum póstumo de Tim“.
Refletindo sobre a profunda conexão que os fãs ainda sentem com o DJ, demonstrada pelas milhares de cartas e mensagens em homenagem ao jovem em seu site, Klas diz: “Tim significou muito para os jovens — sua música, suas letras e sua pessoa.”
“No início, não entendi o porquê, mas então um fã disse: ‘Tim era autêntico’. Eu entendi. Muitos jovens se identificam com essa autenticidade, sua honestidade e suas lutas.”
Estrela millennial
Tim conquistou a fama de um jeito bem “millennial”, a sua geração: postando músicas online.
Ele adotou o nome Avicii em 2008, uma referência às camadas do inferno no budismo, depois de descobrir que já havia alguém usando o seu nome na plataforma MySpace.
Ele teve por um breve período um contrato com o DJ Pete Tong, da BBC Radio 1, após vencer um concurso de talentos.
Mas Tim lutou contra a ansiedade desde cedo, muitas vezes tendo pensamentos catastróficos e temendo ter câncer.
O uso de maconha despertou nele o medo de enlouquer e a dissociação.
Klas lembra que Tim teve intensas “questões de identidade” durante a adolescência.
Depois de alguns encontros com um psicólogo, Tim sentiu-se melhor. No entanto, as turnês exacerbaram sua ansiedade.
Uma mensagem de texto reproduzida na biografia de Tim de 2021 revela as preocupações do pai: “Olá Tim, espero que sua inspiração seja suficiente para esta grande turnê, com shows todos os dias. Do seu velhote.”
A agenda agitada cobrou seu preço.
Como Levels teve quase 20 milhões de visualizações no YouTube antes de seu lançamento oficial, a turnê de Tim incluiu apresentações nos EUA, Nova Zelândia, Austrália e Ásia, muitas vezes fazendo vários shows em diferentes cidades no mesmo dia.
Tentando se acalmar, Tim recorria ao álcool.
“Encontrei a cura mágica de apenas tomar alguns drinques antes de continuar”, disse ele no documentário Avicii: True Stories.
Essa dependência cresceu à medida que ele viajava. Em 2013, ele disse à revista GQ: “Você está viajando, mora em uma mala… Chega a um lugar, e há álcool de graça em todo canto”.
Em 2012, ele embarcou em uma viagem de 26 dias pelos EUA, o que provocou dores de estômago por causa do consumo de álcool.
Ele foi hospitalizado e recebeu a prescrição de opioides para tratar do agravamento da pancreatite — iniciando um ciclo de problemas de saúde e dependência.
No ano seguinte, na Austrália, sua pancreatite retornou, mas ele recusou a remoção da vesícula biliar para evitar o cancelamento de mais compromissos.
Ele recebeu prescrição de opioides novamente. Seu apêndice eventualmente rompeu, forçando uma cirurgia.
Klas enfatiza a necessidade de uma mudança sistêmica na indústria musical, mas tem o cuidado de evitar apontar culpa individual.
“Ainda acho que gravadoras, pessoas em turnê, agentes e empresários deveriam realmente comprovar que estão em boa forma. É assim que os artistas devem ser tratados”, afirma o pai.
Embora reconheça algumas mudanças positivas desde a morte de Tim, observando que “hoje em dia, os gestores suecos das grandes gravadoras estão mais conscientes”, Klas sublinha que são necessárias medidas mais abrangentes para garantir o bem-estar dos artistas.
A culpa dos sobreviventes
Os problemas de saúde de Tim coincidiram com seu sucesso comercial.
Seu álbum de estreia, True, que introduziu sons country, trouxe sucessos como Wake Me Up e Hey Brother.
Em 2015, o seu estado mental deteriorou ainda mais com abuso de remédios, explosões de raiva e comportamento errático.
Apesar de prometer que seu segundo álbum, Stories, seria o seu melhor, seus problemas levavam a atrasos, discursos niilistas no palco e confrontos com paparazzi.
Naquele verão, Klas e o grupo gestor do DJ sabiam que algo precisava ser feito.
Com um terapeuta, planejaram uma intervenção em Ibiza. Em uma entrevista ao jornal Times, Klas disse que sentia ter traído seu filho.
Eu pergunto o que ele quis dizer na época.
“Você confronta seu filho, que não tem ideia do que vai acontecer”, relata o pai.
A reação angustiada de Tim foi evidente.
“Você vê que ele percebe que algo está sendo planejado nas suas costas.”
Mas foi uma intervenção necessária, diz Klas.
“Não havia dúvidas sobre fazer isso, mas chegar a esse ponto não é fácil.”
Tim, sempre teimoso, parecia confuso, pensando que estava sendo criticado apesar de trabalhar sem parar.
Depois de horas de resistência, ele concordou em ir para a reabilitação, dizendo a Klas: “Eu tinha decidido há horas, mas só queria testar você”.
Klas sorri, orgulhoso da “bravura” do filho. Após a reabilitação, Tim lutou para escapar do que descreveu como a “máquina que era Avicii” e parou de trabalhar com seu empresário.
O documentário Avicii: True Stories, concluído antes de sua morte, mostra Tim em uma praia, aparentemente tranquilo e longe de turnês.
A notícia do suicídio teve que ser incluída como um acréscimo pós-roteiro chocante.
Klas admite que a tristeza é agravada pelo fato de que “minha esposa e os irmãos dele estavam felizes por ele estar melhorando em muitos aspectos”.
“Pode parecer contraditório, mas era isso. Ele estava melhorando”.
Klas explica que a culpa é “um fardo muito grande” para os sobreviventes do suicídio (enlutados pela morte de alguém que se matou), que muitas vezes se perguntam: “O que eu fiz errado?”
Mas ele reconhece, como lhe disseram os terapeutas, que “muitas vezes você não consegue fazer nada”.
Projeto de 50 anos
A Fundação Tim Bergling financia uma linha telefônica nacional de prevenção ao suicídio na Suécia, enquanto o governo trabalha em uma legislação para aprimorar as pesquisas sobre o suicídio.
Tudo isso faz parte de um plano de 50 anos de Klas para consolidar o legado de seu filho.
Num show em homenagem ao DJ, Klas prometeu colocar o suicídio no topo da agenda política.
“Tentamos trazer o maior número possível de jovens, bem como de políticos”, diz Klas.
“Um dos momentos mais impactantes foi um grande grupo de pais que haviam perdido seus filhos por suicídio subindo ao palco. Foi um momento muito forte.”
“O mais importante é quebrar o estigma que os jovens enfrentam. [Com] um mundo instável e devastado por guerras como a próxima geração enfrentará, é aí que penso que podemos ser úteis”, diz o pai.
Desde a morte de Tim, a arena de Estocolmo foi renomeada como Avicii Arena, e os concertos Together for a Better Day continuam em sua memória.
Refletindo sobre a influência duradoura de Tim, Klas diz: “Mesmo que ele não esteja mais conosco, ele ainda está muito conosco”.
*Caso seja ou conheça alguém que apresente sinais de alerta relacionados ao suicídio, confira alguns locais para pedir ajuda:
– Para jovens de 13 a 24 anos, o Unicef oferece também o chat Pode Falar;
– Em casos de emergência, outra recomendação de especialistas é ligar para os Bombeiros (telefone 193) ou para a Polícia Militar (telefone 190);
– Outra opção é ligar para o SAMU, pelo telefone 192;
– Na rede pública local, é possível buscar ajuda também nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPA) 24h;
– Confira também o Mapa da Saúde Mental, que ajuda a encontrar atendimento em saúde mental gratuito em todo o Brasil.
Fonte: BBC
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