- Author, Cristina J. Orgaz @cjorgaz
- Role, Da BBC News Mundo
As Ilhas Faroé ficam no Atlântico Norte, entre o triângulo formado por Islândia, Noruega e Reino Unido.
O território dinamarquês é um arquipélago rochoso composto por 18 ilhas vulcânicas habitadas e conectadas entre si por túneis subaquáticos, balsas, calçadas e pontes.
Verde e pontilhado de ovelhas, o pequeno território é uma parte semi-independente da Dinamarca que goza de muita autonomia.
As Ilhas Faroé têm seu próprio governo e parlamento e gerem seu próprio sistema tributário.
No esporte, as ilhas — com seu passado viking — têm sua própria seleção nacional de futebol, filiada à Uefa, União das Federações de Futebol da Europa, e como tal, membro da Fifa.
Mas, ao contrário da Dinamarca, as Ilhas Faroé não são membros da União Europeia. Eles negociaram tratados separados de comércio e pesca com seus vizinhos e administram seu próprio sistema de bem-estar social, cujo padrão já é bastante elevado nos países nórdicos.
É justamente a indústria pesqueira que sustenta a maior parte da economia há décadas.
Os faroenses são um povo marítimo especializado no oceano, pesca, transporte marítimo, navegação, aquicultura, oceanografia, biologia marinha e biotecnologia, bem como engenharia e física relacionados ao mar.
Uma das principais vantagens da autonomia local é o sistema tributário próprio.
Considerado um dos mais eficientes do mundo, o regime fiscal dá pouquíssimas dores de cabeça aos seus habitantes, que em sua maioria não precisam declarar imposto de renda todos os anos.
Um sonho para quem abomina a burocracia e os papéis que acompanham o cumprimento das obrigações fiscais.
Seu sistema centralizado arrecada automaticamente os impostos e desembolsa os auxílios sem que os contribuintes e beneficiários precisem fazer nada. Por exemplo, o sistema faz automaticamente o cálculo de contribuição e benefício de um cidadão que tenha perdido o emprego.
Um desempregado não contribui para a sociedade da mesma forma que o dono de uma empresa. Além disso, quase sempre a carga tributária recai sobre quem tem mais renda. Os subsídios são direcionados às camadas mais vulneráveis.
Como as autoridades conseguem fazer todos esses cálculos e se adaptar à mudança das circunstâncias diárias de seus cidadãos?
“Aparentemente é um sistema tributário muito eficiente de administrar. E o principal motivo é a simplicidade. Não há deduções, créditos ou exceções ao tratamento tributário comum como as que existem em quase todas as jurisdições do mundo”, explica Giullio Allevato, professor da Faculdade de Direito da Universidade IE, da Espanha.
Simplicidade e automação
Em outras palavras, o código tributário das Ilhas Faroé não contempla deduções de imposto de renda, com raríssimas exceções.
Isso torna o sistema muito simples e permite que seja automatizado porque todos os cálculos são muito mais simplificados.
Assim fica muito fácil para o contribuinte e para a Receita determinar a base de cálculo e o imposto a ser pago.
Outra das premissas do sistema tributário é o tamanho da população, que não chega a 50 mil pessoas.
Em um país como Estados Unidos ou Brasil, uma população desse tamanho seria adequada para um pequeno município, não para um país.
Um terço dos cidadãos das Ilhas Faroé vive na capital, Tórshavn.
Tecnologia de ponta
“Estamos falando de uma jurisdição muito pequena. Ela não tem todas as complexidades sociais, políticas e econômicas que a maioria dos países europeus ou os EUA possuem”, diz Allevato.
Outro motivo do bom funcionamento do sistema fiscal é a digitalização da Receita, com a eliminação de muita papelada.
“As Ilhas Faroe são muito avançadas tecnologicamente e têm capacidade de acessar e processar uma grande quantidade de dados. E isso ajuda muito a melhorar a eficiência do sistema tributário”, diz.
Um sistema assim contrasta com o da maioria dos países do mundo, onde o empregador ou a empresa são responsáveis por reter os impostos e transferi-los para o Estado.
As empresas acabam se vendo obrigadas a investir muito em recursos administrativos para cumprir a lei.
Nas Ilhas Faroé, acontece o oposto.
O governo é capaz de calcular os impostos devidos por quase todos os contribuintes sem a necessidade de intervenção do empregador.
A Receita tem acesso a informações relevantes de natureza tributária, bancária, trabalhista e previdenciária.
“Em outros países, o código tributário está cheio de regras especiais, desvios do sistema. São muitas deduções, muitos créditos, muitos tratamentos tributários especiais, o que torna tudo muito mais complexo de administrar”, diz o especialista.
“Ler o código tributário em nossos países é algo que muitas vezes só os especialistas podem fazer, em vez do contribuinte comum. E isso também torna mais complexo o trabalho da Receita.”
Allevato diz que falta vontade política para reformar os complicados sistemas tributários dos países ocidentais.
“Na maioria dos casos, os gastos tributários são apenas resultado de pressões de lobby, favores, benefícios especiais concedidos a certas indústrias ou certos contribuintes que podem pressionar os governos”, diz ele.
O professor diz que há muitas leis e interesses envolvidos.
Contribuintes cautelosos
“A resistência à digitalização do fisco é muitas vezes também resultado da pressão do lobby e do sentimento de certos contribuintes que não querem que o fisco se torne eficiente, que saiba tudo. Eles preferem não divulgar os dados de sua vida privada.”
O mero fato de as Ilhas Faroé serem um país pequeno não significa que isso necessariamente simplifica seu regime tributário.
“Existem outros países pequenos onde o sistema tributário não funciona. Portanto, este é um país pequeno que na verdade implementou um sistema tributário muito simples e permitiu que a autoridade tributária fosse eficiente porque havia cultura para isso e porque havia a vontade política.”
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