- Author, Yolande Knell
- Role, Da BBC News em Jerusalém
- Twitter, @YolandeKnell
Foi um dia que quebrou o senso de invencibilidade e poderio militar de Israel, minando a segurança sentida por cada um de seus cidadãos.
Quando vi os “alertas vermelhos” pela manhã no meu telefone avisando sobre a chegada de foguetes de Gaza, nem eu nem ninguém tinha ideia da escala do ataque.
Mandei uma mensagem aos meus colegas — alguns dos quais estavam ausentes devido ao feriado judaico do Yom Kippur (Dia do Perdão) — dizendo que iria para o escritório.
Logo eu estava lutando para absorver o impacto do que falava no ar, mesmo quando as palavras saíam da minha boca.
O intenso ataque de mísseis que me fez entrar e sair várias vezes do abrigo antiaéreo do escritório acabou sendo uma cobertura para uma série de ataques sem precedentes, complexos e há muito planejados.
Vimos imagens chocantes de combatentes do Hamas andando de moto por buracos abertos na cerca de Gaza, saltando de parapente no sul de Israel, invadindo bases militares fortemente fortificadas e se filmando nos jardins de kibutzim invadidos.
Durante horas dolorosas, frequentadores da rave atacada pelo Hamas ligaram para emissoras de TV israelenses descrevendo massacres enquanto se escondiam de homens armados no agora famoso festival Supernova Universo Paralello Edition.
Moradores apavorados compartilharam vídeos de esquadrões palestinos percorrendo as ruas de Sderot, no sul de Israel.
Seria o dia mais mortal nos 75 anos de história de Israel, com pessoas assassinadas sistemática e impiedosamente.
De alguns dos kibutzim perto de Gaza, mais tarde surgiram imagens revelando o massacre a sangue frio de famílias inteiras.
Estima-se que cerca de 1,4 mil pessoas tenham sido mortas.
O significado do momento também não se perdeu — já que a investida do Hamas ocorreu quase exatamente 50 anos depois que um ataque surpresa do Egito e da Síria no dia mais sagrado do calendário judaico, o Yom Kipur (Dia do Perdão), desencadeou uma grande guerra regional.
A dor e o choque para os israelenses comuns, ainda evidentes agora, estavam totalmente à mostra quando fui a Ashkelon em 8 de outubro.
Enquanto as forças de segurança israelenses continuavam a combater homens fortemente armados literalmente ao longo da estrada e as sirenes de foguetes não paravam de soar, no hospital, pais procuravam ansiosamente e em lágrimas por seus filhos desaparecidos.
“Arrase Gaza!”, gritou uma mãe atormentada.
No início da guerra, havia uma sede de vingança e um desejo urgente de restaurar a dissuasão de Israel diante de seus inimigos.
No entanto, sondagens indicam que isso pode ter mudado, devido a temores crescentes sobre o impacto que bombardeios intensos e uma invasão terrestre em grande escala poderiam ter sobre os reféns capturados pelo Hamas.
Acredita-se que cerca de 240 pessoas estejam em poder do grupo palestino: israelenses e estrangeiros, soldados e civis, idosos, jovens e crianças. Manifestações e apelos para trazê-los para casa estão se tornando mais urgentes.
Depois de sobreviver ao pesadelo dos ataques do Hamas no kibbutz de Nir Oz, a vida de Hadas Kalderon agora se transforma em uma campanha desesperada para trazer para casa seus dois filhos, Erez, que completou seus 12 anos como refém em Gaza, Sahar, de 16 anos, e o ex-marido de Hadas, Ofer.
Sua mãe, Carmela Dan, e sua sobrinha, Noya, que também foram sequestradas, foram encontradas mortas.
“Nem tenho tempo para lamentar [por] minha mãe e minha sobrinha porque tenho que lutar por meus filhos e pelo pai deles que ainda está vivo”, disse Hadas em entrevista recente à BBC. Ela defende que Israel interrompa sua ação militar até que os reféns estejam seguros.
Mas o governo israelense rejeitou os apelos por um cessar-fogo sem a libertação de todos os sequestrados e continua bombardeando Gaza pelo ar.
Na segunda-feira, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, disse que mais de 10 mil pessoas foram mortas no território palestino desde que a ofensiva militar de Israel começou.
Mais de 4 mil dos mortos eram crianças, acrescentou o órgão.
O que acentuou ainda mais o choque de 7 de outubro foi a percepção de que os militares de Israel, tidos como os mais fortes do Oriente Médio, e suas renomadas forças de inteligência não conseguiram prever os ataques.
Várias suposições de longa data que eles – e lideranças políticas – tinham, se revelaram seriamente falhas.
Depois que Israel se retirou de Gaza em 2005 e o Hamas assumiu o controle total do território em 2007, as autoridades israelenses tentaram limitar a ameaça que o grupo representava junto com a Jihad Islâmica – um grupo menor, também designado como terrorista por potências ocidentais.
Tornou-se comum ouvir especialistas em defesa se referirem à estratégia de Israel em Gaza como “cortar a grama”.
Por essa visão, Israel conseguiria reduzir de tempos em tempos com ações pontuais a capacidade militar das facções armadas palestinas — com as eventuais mortes de civis sendo vistas como causalidades inevitáveis.
Houve grandes conflitos em Gaza em 2008, 2012, 2014 e 2021.
No entanto, nos dois confrontos mais recentes, ambos de curta duração, em agosto do ano passado e maio deste ano, o alvo era a Jihad Islâmica — e os militares de Israel tiveram o falso consolo de o Hamas não ter aderido.
A suposição era de que o grupo palestino que prega o extermínio de Israel não queria uma escalada de violência.
Israel também acreditava que pesava a seu favor ter concedido autorizações de trabalho a cerca de 18 mil moradores de Gaza e permitido que o Catar desse ajuda e pagasse os salários dos funcionários públicos do Hamas.
Mas essa avaliação se revelou perigosamente errada.
Agora, parece claro que o Hamas estava realmente ganhando tempo enquanto aperfeiçoava seu arsenal, incluindo foguetes e drones de longo alcance, além de sua extensa rede de túneis subterrâneos.
A ideia de que a tecnologia israelense tivesse contido a ameaça do Hamas — particularmente com a barreira bilionária que foi construída em torno de Gaza, repleta de câmeras, sensores e uma base profunda de concreto para protegê-la contra túneis — também se mostrou errada.
No mês passado, milhares de combatentes atravessaram essa barreira em pelo menos 30 pontos.
Com a guerra ainda em curso, é cedo para listar todos os erros cometidos que levaram ao massacre de 7 de outubro.
Israel continua em estado de luto, com os corpos de alguns dos mortos — queimados ou mutilados — ainda não identificados e mais soldados sendo mortos no campo de batalha dentro de Gaza.
No entanto, parece provável que, ao fim desta guerra, uma ampla investigação será realizada.
Depois de um ano turbulento na política israelense, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, terá que responder a muitas perguntas.
Muito depende do quanto efetivamente Israel pode alcançar com seus novos objetivos de guerra — desmantelar o Hamas em Gaza e libertar os reféns — além de lidar com as crescentes ameaças representadas pelo Irã e pelo Hezbollah.
Fonte: BBC
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