“Conheces o país onde floresce o limoeiro, onde por entre a rama escura ardem laranjas de ouro?”, escreveu Goethe (1749 – 1832) em seu diário “Viagem a Itália” – de quando, à época, andava por Palermo (Sicília). O lugar é também conhecido como Conca d’Oro (bacia dourada), pela grande quantidade desse fruto. Encantado com a variedade de cores da região, o pensador alemão voltando à sua terra, começou a escrever “a Teoria das Cores” (publicada em 1810) – considerada por ele sua obra científica mais importante. É que além de escritor e poeta foi também cientista. Com trabalhos no campo da anatomia humana e animal, ótica, geologia, mineralogia, química, botânica. Ele considerava que a natureza e a arte eram regidas pelas mesmas leis (Lei da polaridade e da intensificação). E sua obra poética só poderia ser avaliada e interpretada à luz de sua visão da harmonia entre homem e natureza. Mas essa é outra história.
O fato é que Goethe não sabia vir, aquela fruta, de terras bem longe daquela ilha do Mediterrâneo. Seus primeiros registros indicam a Índia, de onde provavelmente teria migrado para a Pérsia – onde recebeu seu primeiro nome, laimún. Ao Mediterrâneo chegou só por volta do século I, quando os romanos, a partir do Mar Vermelho, descobriram uma rota marítima para as Índias. Ali, durante muito tempo, foi apenas decoração de jardins. Pela beleza dos frutos e das flores brancas de miolo amarelo, mais parecendo feitas de cera. Assim se deu até que os árabes, no século IV, ensinaram a usá-lo na culinária, ao natural ou seco em sal, numa conserva que levava também seu próprio suco, ingrediente para muitas receitas. Aqueles árabes ensinaram também a cultivar a fruta. E técnicas sofisticadas de irrigação. Por conta disso escreveu o poeta árabe Ibn Zaffir, que viveu por aquelas bandas, na corte do Rei da Sicília Frederico II (século XIII): “Na Sicília, as árvores tem a cabeça no fogo e os pés na água”.
O limão siciliano (Citrus limonun Risso) chegou à América na segunda viagem de Cristóvão Colombo, quando o navegador genovês esteve no (atual) Haiti. E ao Brasil no século XVI, trazido pelo colonizador português – junto com laranja, maçã, pera, tangerina e uva. Seu cultivo foi hegemônico até fins da década de 50, quando foi suplantado pelos limões pequenos de casca bem verde (Citrus auratifolia), ainda hoje mais comuns entre nós – e que, segundo entendidos, nem limão é, mas apenas uma das variedades da laranja-lima. Só mais recentemente limões sicilianos passaram a surgir novamente nas prateleiras dos supermercados de todo o país. E podem ser usados de muitas maneiras. Em pratos salgados: crustáceos, galinhas, ostras, peixes, porcos; também maionese, massa, molhos, saladas (cruas ou cozidas), sopas. E pratos doces: biscoitos, bolos, caldas, compotas, cremes, geleias, pudins, recheios, tortas, sorvetes, suspiros. Restaurantes italianos se encarregaram de divulgar algumas receitas famosas, como Linguine al limone (com creme de leite, manteiga, parmesão, limão siciliano), Antipasto de peixe cru (cortado finamente e temperado com limão) e Crostata di limone (torta recheada com creme de limão). Sem esquecer um licor de fama, o Limoncello. Enfim, do limão siciliano, podemos dizer ser pau pra toda obra; que todos os pratos ganham, com ele, um sabor muito especial, salvando muitas vezes o resultado final da receita. “O limão livra a cara de muito prato”, assim disse o grande chef francês Eric Ripert. E de muito cozinheiro também, deveria dizer. Sobretudo aqueles de fim de semana.
Receita
Linguine ao limone
Ingredientes:
400g de linguine
300g de presunto magro (cortado em cubos)
1 colher de sopa de manteiga
400ml de creme de leite fresco
100g de parmesão ralado
1 limão siciliano
Sal e pimenta-do-reino a gosto
Preparo:
Cozinhe o linguine em bastante água com sal
Em panela refogue, na manteiga, o presunto (cortado em cubos pequenos)
Acrescente creme de leite, parmesão e raspas da casca do limão.
Deixe no fogo até que o queijo fique completamente dissolvido
Escorra o linguine e junte ao molho. Misture bem. Tempere com sal e pimenta.
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Fonte: Folha PE
Autor: Letícia Cavalcante