- Author, Soutik Biswas
- Role, Da BBC News na Índia
O sol permanece um pouco acima ou logo abaixo do horizonte, enquanto altas montanhas projetam sombras escuras.
Crateras profundas guardam uma escuridão que parece eterna. Algumas dessas áreas foram protegidas da luz solar por bilhões de anos.
Nessas regiões, as temperaturas chegam a surpreendentes -248º C, porque a Lua não tem atmosfera para aquecer a superfície.
Até agora, nenhum ser humano pôs os pés neste mundo completamente inexplorado.
O polo sul da Lua, segundo a Nasa (agência espacial americana), é intrigante e cheio de “mistério e ciência”.
Não é de se admirar que haja uma “corrida espacial” para alcançar esse ponto no sul da Lua, longe dos locais de pouso das missões tripuladas que visitaram o satélite há algumas décadas, agrupados ao redor do equador.
Nesta semana, a Índia planeja pousar uma sonda robótica Chandrayaan-3 perto do polo sul.
Era a primeira missão lunar da Rússia em quase 50 anos.
Informações preliminares mostraram que a sonda de 800 kg “deixou de existir como resultado de uma colisão com a superfície da Lua”, afirmou a Rússia, em comunicado.
A Índia também está planejando uma missão conjunta do Exploração Polar Lunar (Lupex) com o Japão para explorar as regiões sombreadas ou o chamado “lado escuro da Lua” até 2026.
Por que o polo sul está emergindo como um destino científico atraente? Os cientistas dizem que um dos principais motivos é a água.
Os dados coletados pelo Lunar Reconnaissance Orbiter, uma espaçonave da Nasa que orbita a Lua há 14 anos, sugerem que o gelo de água está presente em algumas das grandes crateras permanentemente sombreadas que poderiam potencialmente sustentar vida.
A água existe como sólida ou em vapor na Lua por causa do vácuo – a Lua não tem gravidade suficiente para manter uma atmosfera.
A missão lunar Chandrayaan-1 da Índia foi a primeira a encontrar evidências de água na Lua, em 2008.
A história da água
“Ainda não foi comprovado que o gelo d’água é acessível ou manipulável. Em outras palavras, existem reservas de água que podem ser extraídas economicamente?”, questiona Clive Neal, professor de geologia planetária na Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos.
A perspectiva de encontrar água na Lua é empolgante de várias maneiras, segundo os cientistas.
A água congelada não contaminada pela radiação do Sol pode ter se acumulado em regiões polares frias ao longo de milhões de anos, levando ao acúmulo de gelo na superfície ou perto dela.
Isso fornece uma amostra única para os cientistas analisarem e entenderem a história da água em nosso sistema solar.
“Podemos abordar questões como de onde veio a água e quando, e quais são as implicações para a evolução da vida na Terra”, diz Simeon Barber, cientista da The Open University do Reino Unido, que também trabalha na Agência Espacial Europeia.
Existem outras razões “pragmáticas” para acessar a água na superfície da Lua ou logo abaixo dela, diz o professor Barber.
Muitos países estão planejando novas missões com seres humanos à Lua, e os astronautas precisarão de água potável e saneamento.
Transportar equipamentos da Terra para a Lua envolve superar a atração gravitacional da Terra.
Quanto maior o equipamento, mais propulsores e carga de combustível seriam necessários para alcançar um pouso bem-sucedido na Lua.
As novas empresas espaciais comerciais cobram cerca de US$ 1 milhão (R$ 4,9 milhões) para levar um quilo de carga útil para a Lua.
“É US$ 1 milhão por litro de água potável. Os empreendedores espaciais, sem dúvida, veem o gelo lunar como uma oportunidade de fornecer aos astronautas água de origem local”, diz Barber.
Mas isso não é tudo.
As moléculas de água podem ser quebradas em átomos de hidrogênio e oxigênio, e ambos podem ser usados como propulsores para disparar foguetes.
Mas primeiro os cientistas precisam saber quanto gelo existe na Lua, em quais formas e se ele pode ser extraído de maneira eficiente e purificado para torná-lo seguro para beber.
Além disso, alguns pontos no polo sul são banhados pela luz solar por longos períodos de tempo, até 200 dias terrestres de iluminação constante.
“A energia solar é outro recurso [para estabelecer uma base lunar e equipamentos de energia] potencial que o polo possui”, diz Noah Petro, cientista do projeto da Nasa.
O polo sul lunar também fica na borda de uma enorme cratera de impacto.
Com um diâmetro de 2.500 km e atingindo profundidades de até 8 km, esta cratera é uma das formações mais antigas do sistema solar.
“Ao pousar no polo, você pode começar a entender o que está acontecendo com esta grande cratera”, diz Petro.
Navegar no polo lunar com trajes espaciais e ferramentas de amostragem em um ambiente de luz e temperatura distintamente diferente em contraste com os locais equatoriais previamente explorados também promete fornecer informações valiosas.
Mas os cientistas são cautelosos em chamar o que está acontecendo de “corrida para o polo sul”.
“Essas missões foram planejadas por décadas e foram adiadas muitas vezes. A corrida não é crítica para nossa compreensão da Lua. A última vez que houve uma corrida espacial real, acabamos perdendo o interesse na Lua depois de três anos e não retornamos à sua superfície em 50 anos”, diz Vishnu Reddy, professor de ciências planetárias da Universidade do Arizona.
As missões indiana e russa também tinham alguns objetivos comuns, apontam os cientistas.
Ambos pretendiam pousar com espaçonaves de tamanho semelhante na região polar sul, mais ao sul do equador do que qualquer missão lunar anterior.
Após uma tentativa mal sucedida de pouso em 2019, a Índia buscará mostrar sua capacidade de precisão de pouso na Lua próximo do polo.
Também visa examinar a exosfera da Lua – uma atmosfera extremamente esparsa – e analisar o regolito polar, um acúmulo de partículas soltas e poeira acumulada ao longo de bilhões de anos que repousam sobre um leito rochoso.
Os objetivos do Luna-25 incluíam a análise da composição do regolito polar, bem como um exame de elementos de plasma e poeira da exosfera do polo lunar.
Para ter certeza, o local de pouso do orbitador indiano está “um pouco longe do polo real”.
“Mas os dados [que ele vai fornecer] serão fascinantes”, diz o professor Neal.
A Rússia e a China têm planos de construir uma estação espacial lunar para desenvolver instalações de pesquisa na superfície do satélite, em órbita ou em ambos.
A Rússia está planejando mais missões Luna.
Já a Nasa está enviando instrumentos em aterrissadores comerciais para ir a lugares além da Lua.
O Japão está se preparando para enviar um módulo de pouso inteligente (a missão SLIM) em 26 de agosto – uma missão de pequena escala para demonstrar técnicas precisas de pouso lunar por um pequeno explorador.
E, claro, o programa Artemis da Nasa visa levar astronautas de volta à Lua em uma série de voos espaciais, mais de meio século após a última missão Apollo.
“A Lua é como um quebra-cabeça gigante. Temos algumas das peças, cantos e arestas com base em amostras e dados de meteoritos lunares. Temos uma imagem de como é a Lua, mas essa imagem está incompleta”, disse Petro. “A Lua ainda está nos surpreendendo.”
Fonte: BBC
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