Um dia a mais de descanso foi o que tirou o atacante João Figueiredo do centro dos terremotos que atingiram Turquia e Ucrânia no início de fevereiro, tragédia que completa dois meses nesta quinta-feira.
Ele jogava no Gaziantep FK, time da cidade que foi epicentro dos tremores e que acabou pedindo para sair do Campeonato Turco, tamanha a extensão do desastre por lá e na província de Hatay. Em conversa com o Globo, o jogador de 26 anos fala sobre a retomada da carreira em Istambul e como o país tem lidado para tentar superar o trauma.
— Foi um baque no país todo, foi muito grande a tragédia. Em Hatay, cidades foram destruídas, não tem mais ninguém. A Turquia se uniu muito pela recuperação, para ajudar as famílias, no socorro das pessoas. É difícil superar, mas o país está andando, levando como ensinamento — conta ele, que lembra de tremores menores que atingiram o país na sequência:
— Aqui ainda tem alerta de terremoto. Uns 15 dias atrás, teve outro terremoto naquela zona. Foi mais fraco, mas ainda tem alerta.
Após a tragédia, o Gaziantep FK e o Hatayaspor deixaram o campeonato e ganharam imunidade ao rebaixamento por essa temporada. Como vários companheiros de clube, Figueiredo se transferiu. Foi para o Basaksehir, da capital Istambul, que já tinha interesse em contratá-lo antes da tragédia.
No novo clube, já está em ação desde o mês passado. Nesta quarta-feira, a equipe, que é quarta colocada na liga, bateu o líder Galatasaray pelas quartas da Copa da Turquia (3 a 2), com o brasileiro de titular. Na temporada do futebol turco, ele tem nove gols e uma assistência. Depois do terremoto, não conseguiu voltar a Gaziantep.
— Quando quis voltar, a cidade estava fechada, só aceitando voo militar, o aeroporto estava fechado. Foi um amigo turco que pegou as coisas no meu apartamento de lá, malas e móveis, e trouxe para cá. Eu não cheguei a voltar.
Foi um livramento, como diz o jogador, o episódio que o tirou da cidade no dia do terremoto. Na véspera da tragédia, ele resolveu passar um dia a mais de folga após partida contra o Antalyaspor, fora de casa, na cidade litorânea de Antália. O terremoto fez companheiros de clube perderem casas e um motorista do clube perdeu um familiar na tragédia. Em Hatay, o atacante Atsu, ex-Chelsea, foi uma das vítimas fatais.
— Foi o momento mais impactante da minha vida. Foi um susto. Pelo fato de a minha família estar no Brasil, eu resolvi não voltar para cidade, como a maioria dos jogadores voltou. Eu e mais dois amigos ficamos em Antália. Aqui estava no inverno e lá em Gaziantep é uma região muito fria. Antália é a parte das praias, um clima melhor. Resolvemos ficar por lá e aproveitar o dia de folga. Acordei com minha mãe me ligando, meu empresário, amigos, o diretor do clube e eu sem saber. Depois que fui entender, e quando caiu a ficha que por sorte ou por livramento, como podemos dizer (eu escapei). Foi um momento muito triste para toda a Turquia e para mim também.
Família de volta e retomada
Sem a família na época do ocorrido, ele comemora o retorno da esposa e da filha para o país — eles aguardaram até que a bebê pudesse fazer a viagem de avião antes de se reunir. Agora morando na capital da Turquia, a adaptação tem sido tranquila.
— Aqui na Turquia o pessoal é parecido com o Brasil, muito comunicativos e acolhem muito bem. A liga é muito forte, grandes jogadores jogam ou já passaram por aqui. É um mercado alternativo, gosto muito e sou feliz aqui. A Turquia está evoluindo no futebol. Economicamente estava em crise, mas está se recuperando. É um país muito grande.
João é cria do Atlético-MG. Saiu cedo do do futebol brasileiro, em 2018, e mesmo com propostas do país, desbravou mercados alternativos na Europa. Atuou no Kauno Zalgiris, da Lituânia, no OFI Creta da Grécia e no Al-Wasl, dos Emirados Árabes, antes de rumar à Turquia. Ele lembra que sentiu dificuldades na Lituânia, quando não falava inglês nem tinha companheiros brasileiros ou tradutor. Mas hoje, diz que se diverte conhecendo novas culturas, as quais gosta de estudar. Quanto a uma possível volta ao futebol brasileiro (ele chegou a receber propostas), a vontade existe para o futuro, mas hoje a opção é permanecer no velho continente.
Em Istambul, encontrou uma cidade naturalmente mais movimentada e com mais falantes de inglês — agora, é fluente na língua. Quanto à famosamente conhecida paixão nas arquibancadas dos turcos, ele confirma:
— Eles são malucos por futebol. Não só nos clássicos, nos outros jogos os estádios estão sempre cheios, há muita pressão para ganhar. De todas as equipes, não só dos grandes. Contra os grandes, é incrível a atmosfera, como no jogo de ontem. Estádio cheio, jogo bom. A torcida aqui é muito fanática, se compara com a do Brasil.
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Fonte: Folha PE