- Author, Aldert Vrij
- Role, The Conversation*
Você já se perguntou se seria capaz de passar em um teste de detecção de mentiras? Ou imaginou como seria interpretar a linguagem corporal das pessoas?
Interpretar a linguagem corporal pode ser ótimo para adicionar tensão às cenas de interrogatório nos filmes de ação, mas a verdade é que não há muitas evidências de que você possa detectar mentiras observando a linguagem corporal de alguém.
Quando você tenta descobrir se alguém está mentindo em uma entrevista, suas fontes são o comportamento que a pessoa apresenta ou as informações que ela fornece.
A detecção de mentiras não-verbais (linguagem corporal) é mais popular do que a detecção de mentiras verbais, uma vez que as pessoas pensam que os mentirosos são capazes de controlar seu discurso, mas não seu comportamento. Mas os sinais verbais de dissimulação são muito mais reveladores.
As pessoas geralmente supõem que os contadores de mentiras vão ficar ansiosos. Por exemplo, que um mentiroso pode desviar o olhar do entrevistador, mexer as mãos, suar ou engolir saliva com frequência.
Não há evidências científicas para essa crença. O problema é que quem fala a verdade também fica nervoso durante uma entrevista e pode apresentar o mesmo comportamento daqueles que mentem.
Os mentirosos estão mais preocupados com sua credibilidade, enquanto quem diz a verdade é mais propenso a pensar que a verdade vai transparecer.
No entanto, se os contadores de mentiras e as pessoas sinceras optarem por estratégias de linguagem corporal, elas vão fazer a mesma coisa: evitar mostrar sinais de nervosismo.
Mas as táticas verbais usadas por quem mente e quem fala a verdade diferem.
Aqueles que dizem a verdade estão dispostos a fornecer informações. Normalmente, eles não fornecem todas as informações que sabem de cara, porque não sabem quanto se espera que devam fornecer. Também podem não ter motivação para fornecer muitas informações.
Quem fala a verdade acha que sua honestidade é óbvia para os observadores. Por que se esforçar tanto para fornecer detalhes que eles consideram irrelevantes quando a verdade é clara?
Além disso, a princípio, eles podem não conseguir lembrar de tudo que está armazenado em sua memória.
Estratégias diferentes
Os contadores de mentiras tentam manter suas histórias simples.
Eles temem que o que venham a dizer possa dar pistas aos investigadores que possam ser checadas.
Eles receiam não serem capazes de repetir tudo o que disseram quando forem interrogados novamente mais tarde, ou que uma mentira elaborada exija muito tempo para pensar.
Estudos que analisam a dissimulação mostram que não apenas as pistas verbais são mais reveladoras do que as não-verbais em relação à dissimulação, como também as pessoas são melhores na detecção de mentiras quando ouvem a fala do que quando observam o comportamento de alguém.
Os protocolos de entrevista na maioria das áreas — como os usados nos controles de fronteira e pela polícia — foram desenvolvidos por pesquisadores com o objetivo de explorar as diferentes estratégias verbais usadas por quem diz a verdade e quem mente nas entrevistas.
O protocolo que os entrevistadores escolhem normalmente depende das evidências.
Se o entrevistador tiver evidências independentes (por exemplo, um e-mail mostrando que alguém participou de um evento), o uso estratégico da evidência (SUE, na sigla em inglês) é a melhor opção.
É quando os entrevistadores fazem perguntas sobre o evento sem revelar as evidências que possuem.
As pessoas que falam a verdade e que não têm nada a esconder vão falar abertamente e fornecer detalhes, enquanto quem está mentindo vai negar que compareceu ao evento, hesitar em fornecer detalhes e pode se esquivar das perguntas.
Os mentirosos são mais propensos a contradizer as evidências do que quem diz a verdade.
A abordagem profissional
Às vezes, os entrevistadores não têm evidências, mas é possível que o entrevistado possa fornecê-las.
Ao usar uma técnica de entrevista na qual se verifica a informação (VA, na sigla em inglês), os entrevistadores perguntam aos entrevistados se eles podem fornecer evidências que possam ser checadas.
Pesquisas sobre esta abordagem mostram que quem fala a verdade é mais propenso a fornecer tais evidências (por exemplo, mencionando outras pessoas que estavam no evento) do que quem está mentindo.
Suponha que o tema da investigação não seja se o entrevistado compareceu a um evento, mas se o entrevistado está dizendo a verdade ou não sobre o que discutiu com alguém no evento.
As técnicas SUE e VA não são apropriadas para esta situação. Um e-mail mostrando que alguém participou do evento não vai revelar o que aconteceu lá. Se o entrevistado não gravou a conversa, não será capaz de oferecer informações verificáveis.
Nessa situação, pode-se utilizar a avaliação de credibilidade cognitiva (CCA, na sigla em inglês), um protocolo de entrevista que considera apenas a qualidade do depoimento.
Em uma entrevista CCA, pede-se inicialmente ao entrevistado para contar o que aconteceu em um breve período de tempo.
Depois, se oferece ao entrevistado indicações que aumentam as expectativas sobre o que dizer (você pode deixar ele ouvir, por exemplo, a gravação de alguém dando a quantidade de detalhes que você gostaria de ouvir), aumentam sua motivação para falar (dando a impressão de que você está ouvindo a melhor história que já escutou na vida) ou ajudam a refrescar sua memória (pedindo às pessoas que esbocem detalhes do que vivenciaram enquanto relatam suas experiências).
Em uma entrevista CCA, os entrevistados são convidados a contar sua história várias vezes. Pesquisas sobre a técnica CCA mostram que quem fala a verdade oferece mais informações adicionais durante as sucessivas respostas do que os mentirosos, que mantêm suas histórias simples.
É impossível dizer que informação está dentro da cabeça de alguém.
Por enquanto, os pensamentos das pessoas são privados, pois simplesmente não temos a tecnologia para desvendar o que alguém está pensando.
Pode ser menos glamouroso do que um aparelho detector de mentiras, mas simplesmente ouvir o que alguém tem a dizer pode revelar mais sobre o estado de sua mente do que essa pessoa gostaria.
*Aldert Vrij é professor de psicologia social na Universidade de Portsmouth, no Reino Unido.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).
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