- Author, Stephen Hughes
- Role, The Conversation*
Recentemente, funcionários que trabalhavam no funeral de uma mulher de 82 anos de idade declarada morta em uma casa de repouso de Nova York, nos Estados Unidos, descobriram que, na verdade, ela estava viva.
O incidente ocorreu pouco depois de outro caso similar, no Estado americano de Iowa.
Uma mulher de 66 anos de idade com demência precoce foi declarada morta por uma enfermeira. Mais tarde, ela foi encontrada lutando para respirar, quando os funcionários do funeral abriram o saco plástico que guardava o corpo.
Felizmente, é algo muito raro. Mas causa profundo medo, o que pode explicar um antigo costume marítimo.
Quando um marinheiro morria e a lona que serve de mortalha era costurada, o último ponto era dado atravessando o nariz do falecido.
Eles consideravam que uma agulha atravessando o nariz seria um estímulo suficientemente forte para acordar qualquer marinheiro que porventura ainda estivesse vivo.
Felizmente, a confirmação da morte nos dias de hoje é muito menos cruel.
A ausência de batimentos cardíacos e sons de respiração por um certo período de tempo, a presença de pupilas fixas e dilatadas e falta de reação a qualquer estímulo devem indicar a morte de uma pessoa.
Todos os médicos aprendem como fazer isso e todos estão cientes das suas obrigações.
Mas, infelizmente, tem havido casos em que a morte foi confirmada com estes processos, mas o paciente exibiu sinais de vida posteriormente.
Ao longo dos anos, já vi isso acontecer. Um dia, no hospital, um colega declarou uma idosa como morta, mas, pouco tempo depois, ela começou a respirar novamente e seu pulso foi rapidamente restaurado.
Em outro incidente inesquecível, a equipe médica de emergência foi convocada desta forma: “parada cardíaca. Necrotério. Não é brincadeira!”
Uma mulher havia tomado uma overdose de barbitúricos receitados para tratamento de epilepsia. Ela havia sido examinada por um médico geral que certificou a sua morte.
Mas, ao chegar ao necrotério, uma das suas pernas foi vista se contorcendo. Seguiu-se um constrangimento torturante. E, se me lembro bem, ela se recuperou.
Falhas no procedimento adequado de confirmação da morte explicam alguns casos de pessoas declaradas mortas por engano.
Exames superficiais por profissionais distraídos podem facilmente fazer com que batimentos cardíacos não sejam ouvidos e respirações rasas e espaçadas não sejam identificadas.
Vale a pena ser cuidadoso. Mas alguns remédios que receitamos aos pacientes podem dificultar a tarefa.
Drogas, toxinas e água fria
Acredita-se que medicamentos sedantes protejam, de alguma forma, o cérebro contra lesões. Esta prática é adotada na anestesia em procedimentos cirúrgicos importantes, particularmente se for necessário suspender a circulação por algum tempo.
O que é menos útil e tem potencial de causar alarme são as overdoses de sedativos, que reduzem a capacidade de reação e debilitam a respiração e a circulação, gerando a impressão de morte enquanto protegem o cérebro da hipoxia (a falta de oxigênio). Posteriormente, quando a droga é liberada do corpo, a pessoa pode acordar.
O diazepam (nome comercial Valium) e o alprazolam (nome comercial Xanax) já fizeram pessoas serem declaradas mortas por engano.
Certas toxinas podem ter efeito similar. Os bokors, praticantes do vodu, aparentemente administravam pós às suas vítimas para fazer com que elas parecessem estar mortas. Esses pós supostamente continham pequenas doses de tetrodotoxina de baiacus para paralisar a vítima, que provavelmente era raptada antes do enterro e escravizada.
Poderiam os danos neurológicos do processo de “zumbificação” ser os responsáveis pela imagem popular dos zumbis?
A imersão em água fria também pode gerar a ilusão de morte devido ao seu efeito de reduzir os batimentos cardíacos. É bem documentada a sobrevivência após períodos consideráveis de tempo na água.
No atendimento de emergência, já se ensina há muito tempo que pacientes com hipotermia não são declarados mortos antes de serem aquecidos. Existem relatos de boa recuperação neurológica após imersão em água fria por até 70 minutos.
Os desmaios também podem enganar o médico na hora do exame. Durante os desmaios, ocorre a ativação do nervo vago (o nervo craniano mais longo do corpo), o que reduz os batimentos cardíacos e a pressão sanguínea.
Isso pode justificar um caso muito triste relatado em Honduras. Uma adolescente grávida foi declarada morta de susto ao ouvir um disparo na vizinhança, mas foi ouvida gritando dentro do túmulo um dia depois do funeral. É bem possível que ela tenha acordado depois de um desmaio prolongado.
Muitos casos deste tipo parecem ocorrer fora da Europa. As variações locais dos procedimentos de confirmação médica da morte podem ser a explicação. Talvez ocorram erros quando as pessoas têm menos possibilidade de pagar honorários médicos.
Seja qual for a causa, estes casos aparecem na imprensa porque são sensacionais e atraem a atenção do público, mas, na verdade, eles são muito raros.
* Stephen Hughes é professor de medicina da Universidade Anglia Ruskin, no Reino Unido.
Você precisa fazer login para comentar.