• Mariana Alvim
  • Da BBC News Brasil em São Paulo

Crédito, Alexandre Cruz-Noronha/Washington Post via Getty

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Em foto de julho de 2022, ciclistas passam perto de um foco de incêndio em Rio Branco (AC); queimadas urbanas são frequentes no Estado principalmente entre julho e setembro

Em outubro de 2022, o governo do Amazonas declarou que todos os 62 municípios do Estado estavam sofrendo por uma seca que deixou rios, como o famoso Solimões, repleto de bancos de areia, e a população com dificuldade para navegar e para acessar água potável.

Naquele momento, 19 cidades foram consideradas em situação de atenção, 41 em alerta e duas em estágio de emergência — o mais grave.

O exemplo recente, vindo de um dos Estados brasileiros que fazem parte da Amazônia Legal, mostra que as ameaças que rondam a floresta vão muito além do desmatamento.

Esse é o alerta de um estudo publicado nesta quinta-feira (26/01) na revista científica Science, uma das mais importantes do mundo: outras formas de degradação que têm interferência do homem já destroem boa parte da floresta e devem ser, em 2050, uma das principais fontes de emissão de carbono, independente do aumento ou da diminuição do desmatamento.

O estudo estima que 38% da Floresta Amazônica é hoje afetada por algum tipo de degradação:

  • os incêndios;
  • a seca (intensificada pelas mudanças climáticas);
  • a extração seletiva de madeira (legal ou ilegal; “seletiva” porque são retiradas algumas árvores que são interessantes comercialmente, deixando outras em pé);
  • e os chamados efeitos de borda (mudanças nas florestas próximas a áreas desmatadas, portanto uma consequência direta do desmatamento).

“A área degradada na Amazônia e as emissões de carbono de degradação são iguais ou até maiores do que as de desmatamento”, afirma à BBC News Brasil o líder do estudo, David Lapola, pesquisador do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e doutor pela Universidade de Kassel, na Alemanha.

Crédito, RAPHAEL ALVES/AFP via Getty Images

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Pescadores em um córrego formado a partir do lago Aleixo, na área rural de Manaus, durante seca; a foto é de outubro de 2015

A pesquisa na Science considerou a área da Amazônia tanto no Brasil quanto em países vizinhos e teve como base estudos anteriores e imagens de satélite. O período analisado vai de 2001 a 2018.

Com autoria de 35 pesquisadores brasileiros e estrangeiros, o estudo diferencia o desmatamento e a degradação. Enquanto, no primeiro, a floresta sofre grande alterações para dar lugar a um novo uso — por exemplo, uma área que é queimada para virar pasto —, a degradação se diferencia por envolver alterações mais contidas na cobertura florestal e por não ter o objetivo de transformar o uso daquela terra.

Na produção científica, está outra diferença: segundo os autores, o desmatamento tem recebido muito mais atenção do que a degradação.

“Na Floresta Amazônica, a extensão e os efeitos de longo prazo de tais distúrbios antropogênicos [a degradação] no ciclo terrestre do carbono terrestre, no funcionamento dos ecossistemas e nos meios de sobrevivência das populações locais estão começando a ser compreendidos e diferenciados dos impactos do desmatamento”, diz um trecho do estudo, que tem também a participação, além da Unicamp, de pesquisadores do Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia (Ipam) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).