Em apenas 5 dias, o clipe de Shakira em que faz inúmeras indiretas a seu ex, o jogador Gerard Piqué, já atingiu 133 milhões de visualizações no YouTube e se tornou a segunda música mais popular do momento no Spotify.
Assim como novos hits de cantoras como Miley Cyrus, Taylor Swift e SZA que também alfinetam os ex, a música colocou Shakira no topo das paradas e a tornou o assunto do momento.
Esse tipo de alfinetada, aliás, não é de hoje: a cantora brasileira Joelma fez indiretas para o ex-marido Ximbinha em 2016 e continua falando da traição até hoje; a canadense Alanis Morissette estourou nos anos 1990 com a música You Oughta Know.
No caso de Shakira, a artista colombiana tirou proveito do fato de que, embora sejam um tema recorrente na música pop, músicas sobre traição chamam muito mais atenção quando o ex em questão também é uma celebridade mundialmente reconhecida. No caso de Shakira, é o ex-jogador do Barcelona Gerard Piqué. No caso de Miley Cyrus, o ex é o ator Liam Hemsworth.
Com batida animada e letra cheia de ironias, a música de Shakira foge do tom confessional ou meloso de canções sobre término. E deixa bem claro que a cantora já imaginava que a canção seria um sucesso e que pretendia mesmo tirar proveito da situação: “Você me fez ter a sogra como vizinha/ Com a imprensa na porta e devendo à Receita Federal/ Você achou que me machucou, mas eu fiquei mais forte/ As mulheres não choram mais, as mulheres faturam”.
Se artistas podem transformar uma traição em mais fama e dinheiro, quais os riscos e resultados de expor os detalhes de um relacionamento e uma traição na vida real de quem não é celebridade?
‘Não tente reproduzir isso em casa’
A psicóloga Maria de Fátima José-Jesus, professora da Unifesp, explica que expor publicamente uma traição em geral é um mecanismo de defesa para tentar controlar uma situação que saiu do controle.
Se vingar expondo a intimidade, explica ela, é uma forma de soltar as emoções através da impulsividade. Apesar da satisfação momentânea, a vingança e a agressividade em uma exposição do tipo não ajudam a superar o trauma e a dor de uma traição.
Segundo ela, usar da criatividade – não só a música, mas a pintura, a escrita e outras formas de expressão – para lidar com um trauma de relacionamento pode ser muito positivo se esses meios ajudarem as pessoas a acessar esses sentimentos mais profundos que surgem nessas situações. Mas não ajudam se forem uma forma de negá-los.
“Lidar com um fim de relacionamento é um processo de luto, parecido com o que acontece quando morre uma pessoa. É preciso trabalhar os sentimentos, não negar as suas emoções – como dizer que ‘as mulheres não choram, as mulheres faturam'”, explica a psicóloga.
Fátima explica também que uma traição é algo que tende a afetar a autoestima das pessoas. “Mas lidar com isso negando os sentimentos e falando em termos financeiros é uma forma errada de lidar com o sofrimento psicológico”, afirma. No clipe da cantora colombiana, deram o que falar as frases “Você trocou uma Ferrari por uma Twingo / Você trocou um Rolex por um Casio”.
Piqué também foi incapaz de ignorar a provocação e chegou em um evento dirigindo um Twingo – um modelo de carro popular da Renault que atualmente não é vendido no Brasil.
Antes de recorrer a um sistema de defesa na impulsividade, diz Fátima, é preciso procurar ajuda psicológica e pensar no efeito que uma exposição da intimidade terá sobre você e sobre outras pessoas – como filhos, por exemplo.
“É preciso evitar tomar decisões no meio do pânico de descobrir uma traição e ver um relacionamento desmoronar. Até porque uma traição não acontece do dia pra noite, é um processo”, afirma.
Danos morais e crimes
Para quem não é famoso como o ex-casal Shakira e Piqué, simples indiretas nas redes sociais não têm grandes consequências do ponto de vista jurídico. Mas se pessoa traída for além, divulgando a traição do parceiro com todas as letras, a consequência jurídica pode ser pior para quem expõe do que para quem trai.
Isso porque juridicamente a traição não confere nenhum direito a quem foi traído do ponto de vista do divórcio, explica o advogado Anderson Albuquerque, especializado em direito de família.
“Traição é um ato imoral, não ilegal”, explica.
No entanto, diz o advogado, a pessoa traída pode tentar pedir uma indenização por danos morais caso a traição tenha gerado uma humilhação pública. “A pessoa traída pode argumentar que a traição expôs sua imagem ao ridículo, mas é preciso provar o prejuízo”, explica o advogado, sócio do escritório Albuquerque e Alvarenga.
Da mesma forma a pessoa que expõe publicamente uma traição do parceiro pode ser processada e ter que pagar indenização por danos morais caso o parceiro comprove que isso prejudicou sua imagem e causou danos concretos em sua vida.
A questão é que o prejuízo causado pela divulgação da traição é, em geral, mais fácil de comprovar do que dano à imagem trazido por uma traição em si.
Caso a exposição da traição envolva a divulgação de imagens ou vídeos íntimos, com cenas de nudez ou sexo, quem expõe pode responder criminalmente – a pena para do crime de divulgar imagens pornográficas ou nudes sem consentimento é de um a cinco anos.
A pena é aumentada quando quem divulga tinha um relacionamento com a vítima, como no caso de alguém que expõe uma traição.
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