- Claudia Hammond
- BBC Future
Todos nós provavelmente concordamos que ser gentil é bom, ético e agradável — mas será que isso leva ao sucesso profissional?
Afinal, gentileza não é colocar os interesses das outras pessoas em primeiro lugar?
Vamos analisar três pessoas conhecidas: James Timpson, dono da rede de sapatarias Timpson; Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia; e Gareth Southgate, um dos técnicos mais bem-sucedidos da história da seleção masculina de futebol da Inglaterra.
Todos eles são, sem dúvida, “vencedores” nos seus respectivos campos de atuação, mas todos colocam a bondade no centro da sua estratégia de sucesso.
O que eles descobriram é que uma abordagem de maior compaixão e aparente suavidade — seja para os negócios, a política ou o esporte — traz resultados positivos, beneficiando não apenas as pessoas que trabalham para eles, mas eles próprios.
A noção tradicional de que você precisa ser implacável, determinado e focado antes de qualquer coisa, se quiser ser bem-sucedido, está sendo desconstruída.
Há cada vez mais evidências científicas de que pessoas gentis podem ser vencedoras.
Em 2020, fiz parte de uma equipe da Universidade de Sussex, na Inglaterra, que realizou um dos maiores estudos do tipo sobre comportamentos públicos de bondade.
Mais de 60 mil pessoas de 144 países aceitaram responder a um extenso questionário chamado The Kindness Test (Teste da Bondade, em tradução livre), que foi lançado nos programas de rádio que apresento — All in the Mind, na Rádio 4 da BBC, e Health Check, no Serviço Mundial da BBC.
Quando perguntei onde as pessoas observavam a maioria dos gestos de bondade, o local de trabalho se saiu bem, terminando em terceiro lugar, depois da casa e dos recintos médicos — dois ambientes em que as pessoas presenciavam atos cordiais, e a gentileza era verdadeiramente valorizada.
Isso significa que um ambiente com fama de ser selvagem e impessoal, onde as pessoas concorrem por cargos, pode abrigar mais empatia e consideração do que se pensa.
Precisamos ter em mente que este foi um estudo de autosseleção — e, à primeira vista, uma pesquisa conduzida por uma consultoria de marca com 1,5 mil profissionais do Reino Unido apresentou resultados menos positivos. Apenas um em cada três participantes concordou inteiramente que seu chefe imediato era gentil, e um quarto deles considerou o líder da sua organização rude.
Mas, analisando os resultados com mais detalhes, verificamos que os participantes que tinham chefes gentis eram mais dispostos a afirmar que permaneceriam na empresa pelo menos por mais um ano, que o trabalho produzido pela sua equipe era excelente e que a sua empresa tinha bons resultados financeiros.
Ao mesmo tempo, 96% dos funcionários que participaram da pesquisa afirmaram que ser gentil no trabalho era importante para eles, o que sugere que a gentileza realmente importa, se uma organização deseja ter sucesso.
Esta ideia é confirmada pela pesquisa do psicólogo americano Joe Folkman, especializado em psicometria (o ramo da psicologia que se dedica a testes e medições). Ele estudou as avaliações de feedback de mais de 50 mil líderes e concluiu que os chefes considerados mais agradáveis pelos seus funcionários também costumavam apresentar melhores avaliações de eficácia.
E talvez o mais revelador seja que eram muito raros os casos em que alguém tinha uma avaliação baixa em agradabilidade e alta em eficácia — havia apenas uma chance em cada 2 mil de isso acontecer.
Folkman também concluiu que empresas com líderes agradáveis apresentavam resultados melhores em uma série de avaliações positivas, incluindo a lucratividade e a satisfação dos clientes.
É significativo que, no campo da pesquisa empresarial, a liderança gentil seja mais frequentemente chamada de liderança “ética” — talvez porque soe menos suave.
Mas, seja qual for o nome dado, estudos demonstraram que ela pode gerar uma atmosfera de trabalho mais positiva e melhor desempenho dos funcionários.
O comportamento positivo pode influenciar o ambiente de trabalho, segundo um estudo do psicólogo organizacional Michelangelo Vianello, da Universidade de Pádua, na Itália. Ele visitou um hospital público perto de Pádua e perguntou aos enfermeiros sobre seus chefes, de forma confidencial, incluindo até que ponto eles eram justos e abnegados e se defendiam suas equipes.
Quando a avaliação era positiva, os enfermeiros eram mais dispostos a manifestar o desejo de fazer algo de bom por alguém, para serem mais parecidos com seu chefe ou para se tornarem pessoas melhores.
Há evidências de que até mesmo pequenos gestos de bondade e cooperação de qualquer pessoa podem fazer a diferença no ambiente de trabalho.
Existe na psicologia algo chamado “comportamento de cidadania organizacional”. Um exemplo disso pode ser consertar a impressora, em vez de deixá-la quebrada para o próximo colega arrumar, ou regar as plantas no escritório. Essas ações não são exigidas como atribuições do cargo, mas, se as colocarmos em prática, o ambiente de trabalho fica um pouco melhor para todos.
E elas têm mais importância do que você imagina. Em 2009, o pesquisador Nathan Podsakoff, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, sintetizou em uma meta-análise as conclusões de mais de 150 estudos diferentes.
Os resultados foram claros. Esse tipo de comportamento, embora pequeno isoladamente, foi associado a um melhor desempenho no trabalho, produtividade, satisfação dos clientes e eficiência.
Existe uma área em que você pode pensar que não há vantagem em ser gentil — o mundo da política, no qual reina o “salve-se quem puder”. Mas, mesmo na política, há evidências de que um estilo mais gentil ou cordial ainda pode levar você ao topo, como Jacinda Ardern mostrou na Nova Zelândia.
Mas e os políticos mais indelicados, como Donald Trump? Seu sucesso não mostra que uma abordagem mais dura acaba por prevalecer?
Entre 1996 e 2015, o acadêmico Jeremy Frimer analisou a linguagem empregada pelos membros do Congresso americano durante os debates em plenário. No seu estudo, ele demonstrou que os índices de aprovação dos congressistas homens e mulheres eram menores quando eles eram incivilizados nos seus discursos, e aumentavam quando eles eram mais educados e generosos.
Mais recentemente, a equipe de Frimer analisou as reações aos tuítes de Donald Trump, antes dele ser expulso da plataforma, concluindo que poucos dos seus apoiadores “curtiam” ativamente seus tuítes mais grosseiros.
Os tuítes não os impediram de apoiar Trump, mas eles continuaram a apoiá-lo apesar — e não por causa — da incivilidade dele.
É claro que há vários exemplos de pessoas que se dão bem na vida e são egoístas e grosseiras com os demais.
Mas a questão é que, apesar do que observamos no programa O Aprendiz ou na série Succession, você não precisa ser desagradável e insensível para ter sucesso nos negócios ou em outros setores altamente competitivos da vida.
Você não vai ser um vencedor simplesmente por ser gentil, claro — também é preciso motivação, dedicação e habilidade —, mas há cada vez mais evidências de que demonstrar um pouco de gentileza enquanto busca seu objetivo, não é impedimento para o sucesso.
* Claudia Hammond é autora do livro The Keys to Kindness: How to be kinder to yourself, others and the world (“As chaves para a bondade: como ser mais gentil com você, com os outros e com o mundo”, em tradução livre), publicado pela editora Canongate.
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