No vai e vem do transporte público, por onde milhares de pessoas circulam diariamente, a rotina do deslocamento é, certamente, exaustiva para muitos que, cansados, se isolam em seus passatempos favoritos: celulares, fones de ouvido, livros. O hábito do horário, do trajeto e da correria naturaliza a ansiedade e o desejo de chegar rápido ao ponto final, onde o ciclo estabelecido pelo cotidiano continua ocorrendo até o dia seguinte. Ritual que nos afasta dos que estão ao nosso lado e na mesma situação.
Apesar da rotina, a imprevisão do futuro pode fazer o caminho ganhar sentido diferente. Foi o que aconteceu com um grupo de mulheres que utilizam o Metrô do Recife diariamente para chegar até seus locais de trabalho. Elas, que até então faziam o mesmo trajeto, mas não se conheciam, começaram a compartilhar vivências do dia a dia, se tornaram amigas e levaram a convivência para fora dos vagões.
De acordo com a empregada doméstica Dorgicleide Gomes, de 54 anos, mais conhecida como Cleide, a amizade surgiu em 2018, durante o trajeto de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Elas, que atuam como domésticas ou cuidadoras, se encontravam, na maioria das vezes, no metrô sentido Centro e também no sentido Jaboatão dos Guararapes, onde a maioria mora.
“A gente se encontrava logo cedo, por volta das 6h, que é a hora que, geralmente, estamos na estação. A maioria descia em Afogados e ia conversando no ônibus. Muitas trabalham na Madalena, em Boa Viagem, na Torre e em Casa Amarela”, afirmou Cleide, que disse fazer o trajeto com mais alegria sempre que está na companhia das amigas.
Cleide contou também que foi ela quem teve a iniciativa de formar o grupo, que iniciou com 20 mulheres e, agora, conta com 30 integrantes. “Eu comecei a ter mais comunicação com as meninas, trocando palavras do dia a dia. Quando eu percebi, estava rodeada de várias colegas e resolvi fazer um grupo no WhatsApp. Também propus fazermos um jantar“, disse Cleide.
Cleide (esquerda) é uma das organizadoras do encontro. Foto: Cortesia
O primeiro encontro aconteceu naquele mesmo ano, sendo repetido em 2019 e 2020, com a adesão de novas componentes, que foram apresentadas por mulheres que já faziam parte do grupo. Nesse sábado (19), uma confraternização, com direito a amigo secreto, foi realizada em uma churrascaria no bairro de Cavaleiro, em Jaboatão dos Guararapes, com a presença de 16 delas. As demais não puderam comparecer por motivos diversos.
A diarista Geni Justino de Almeida, de 54 anos, foi uma das que esteve no jantar. Moradora de Socorro, Jaboatão, ela pega o mesmo transporte que as demais mulheres diariamente e, desde 2020, integra o grupo.
“Como a gente não tem confraternização de empresa, a gente fez a nossa. O encontro foi maravilhoso. Fui a primeira a chegar e ainda levei duas novas amigas. Isso é muito bom. Todo ano a gente quer se reunir”.
Sentino-se acolhida, Geni disse que a amizade com as demais usuárias do modal, iniciada de modo inusitado, tornou o trajeto mais divertido. “É bom saber que eu tenho elas. Eu lembro delas, elas lembram de mim. Eu me sinto bem. Já faz parte do meu dia a dia”, afirmou a diarista.
Foto: Cortesia
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