Os gatos não têm culpa da sua natureza felina. Caçam outros animais por instinto ou por necessidade. Dizem os veterinários que eles nunca se despojam inteiramente da índole agressiva e selvagem. Matam para comer ou sem fome. Por mais fartos que estejam não cansam de estapearem suas vítimas como se fossem um brinquedo.
Diríamos deles, como já se disse das crianças, que até na maldade são puros. Vem-me à lembrança o primeiro poema que li, nos meus tempos de alfabetização, narrando com beleza a crueldade inocente de um infante:
“Meu filho quando tu fores
Ao jardim de tua irmã
Não quebres as débeis flores
Que nascem pela manhã
Olha quando vens de lá,
A rosa diz a Açucena
Que és de uma índole tão má
Que nem das flores tens pena!”
Pois bem, adotei três gatos que perambulavam desprotegidos pelas ruas. Cada qual com personalidade própria e peculiaridades diferentes. Todas adoram ser acariciados. O de nove anos pula sobre mim, pupilas dilatadas, ou sobe em cima da mesa onde escrevo ou leio algum escrito e deita sobre os papéis sem pedir licença, reclamando carinho e atenção.
Não sinta segurança nos afagos desse indivíduo. Ele é imprevisível e traiçoeiro. Subitamente põe as orelhas para trás, cara de quem não gostou, abre a boca e sopra o ar no rugido como se quisesse inflar o universo, mostrando os dentes e convencendo de que tem bons pulmões. Seguem-se dentadas e unhadas rápidas, fortes, que tiram sangue. É preciso observá-lo atento para evitar esses repentinos ataques sanguinolentos.
Os outros dois, com pouco mais de ano, dóceis e aparentemente inofensivos, aqui e ali aparecem brincando com cadáveres ainda quentes de passarinhos que apanham dentro do apartamento não se sabe como.
Para mim, que sofro até com a morte de uma barata, é doloroso vê-los depenarem uma rolinha na agonia da morte. Mas para ambos, matar rolinhas, cigarras, borboletas, é muito divertido e natural. Eles não têm ideia do sofrimento alheio. Ralho enfurecido com os dois, ou com os três (o mais velho não é santo) e os absolvo. Eles não podem deixar de ser o que são!
José de Siqueira Silva é Coronel da reserva da PMPE
Mestre em Direito pela UFPE e Professor de Direito Penal
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21/11/2022 às 08:58