Nesta última segunda (15), a Premier League comemorou os 30 anos da sua primeira rodada. Em 15 de agosto de 1992, era dado o pontapé inicial ao que viria a se tornar a mais forte e poderosa liga de futebol do mundo. Mas antes do ‘glamour’ e do dinheiro, o futebol inglês viveu seu momento mais cinzento na década de 80.
Política e futebol lado a lado: A ‘Dama de Ferro’
Em 1979, Margaret Thatcher assumiu como primeira-ministra britânica. Apelidada de ‘Dama de Ferro’, pelas duras medidas tomadas e que afetavam diretamente a classe trabalhadora, Thatcher teve um papel de destaque na mudança do futebol inglês.
A primeira-ministra se elegeu prometendo acabar com os sindicatos, que na época eram a base das torcidas organizadas, os ‘hooligans’. Suas decisões de privatização e de fechamento de indústrias que não davam lucro não agradavam a classe trabalhadora, especialmente em cidades como Liverpool.
Incêndio em Bradford, briga em Heysel
Em 1985, durante uma partida entre Bradford City e Lincoln City pela terceira divisão inglesa, o estádio Valley Parade pegou fogo. Não se sabe como o fogo se iniciou (suspeitasse de um cigarro aceso no lixo), mas ele rapidamente espalhou na arquibancada do estádio que era de madeira.
Ao ver o incêndio, os torcedores tentaram sair, mas encontraram as saídas fechadas ou bloqueadas para impedir o acesso daqueles sem ingresso. Em menos de cinco minutos, a arquibancada principal estava coberta em chamas. O resultado da tragédia foi de 56 mortos e ao menos 265 feridos.
Dias depois, Liverpool e Juventus se enfrentaram pela final da Copa dos Campeões (atual Liga dos Campeões) no Estádio de Heysel em Bruxelas, na Bélgica. O estádio já havia recebido finais da Copa anteriormente, mas não se encontrava em condições de sediar um jogo de tamanha proporção. Para piorar, muitos torcedores dos ‘Reds’ entraram sem pagar, causando superlotação.
As torcidas estavam separadas apenas por um alambrado e poucos policiais tentavam manter a ordem. Os torcedores da Juventus, espremidos pela falta de espaço, pulavam para tentar escapar mas caiam na torcida do Liverpool, gerando ainda mais confusão. Antes do apito inicial, 39 pessoas – em sua maioria torcedores italianos – morreram, e mais de 600 ficaram feridos.
A UEFA colocou a culpa nos ‘hooligans’ e baniu os times ingleses de competições europeias por cinco anos, o Liverpool recebeu seis. O governo Thatcher aceitou. Ambos ignoraram o fato de que o “hooliganismo” não era o principal fator das tragédias, e sim a péssima condição dos estádios.
Para Thatcher, lutar contra os ‘hooligans’ era combater os sindicatos devido a estreita ligação entre os dois, mas o que havia era uma generalização. Todo torcedor era um ‘hooligan’ e de sindicato, o que não era a verdade. Mas o governo não queria saber, como diz este artigo do jornal britânico ‘The Guardian’ de 2012.
“Nos anos 1980, muitas pessoas poderosas do Reino Unido consideravam os torcedores como nada além de hooligans, que deveriam ser policiados da maneira mais robusta possível”
Em 1989 foi criado o ‘Football Spectators Act’, que obrigava os torcedores a ter um licença para assistir aos jogos, mas era só uma tentativa de elitizar o futebol. Não funcionou. Meses depois aconteceu a maior tragédia do futebol inglês, Hillsborough.
Os 97 de Hillsborough
Homenagem as vitimas do Desastre de Hillsborough. Foto: AFP
Pela semifinal da Taça da Inglaterra, Liverpool e Nottingham Forest se enfrentaram no Estádio de Hillsborough, em Sheffield. O estádio tinha capacidade para pouco mais de 35 mil pessoas e foi dividido entre as duas torcidas. O que se viu em seguida foi mais uma superlotação, desespero e mortes.
Primeiro que o estádio do Sheffield Wednesday, assim como Heysel, não tinha condições de receber jogos importantes por problemas de infraestrutura. Segundo que a torcida dos ‘Reds’, que eram maioria, foram designados para a menor porção do estádio. Terceiro que a polícia não tinha controle sobre a situação.
Vendo o grande fluxo nas catracas da estreita entrada, a polícia decidiu abrir os portões do setor chamado Leppings Lane, que já estava cheio. Sem nenhum controle do policiamento, torcedores, com e sem ingressos, tentaram entrar no estádio, sem ter conhecimento que lá na frente as pessoas estavam sendo pressionadas umas contra as outras e pelo alambrado.
A partida, que estava no início, foi paralisada e os torcedores começaram a escapar para o campo, mas já era tarde demais. 95 pessoas morreram esmagadas na maior tragédia do futebol inglês. A 96ª pessoa morreu em 1993 e a 97ª morreu em 2021
O Relatório Taylor
Após a tragédia, o Chefe de Justiça da Inglaterra, Lord Justice Taylor, deu início às investigações sobre os acontecimentos. Foi concluído que “apesar de outras causas, a razão principal para o desastre foi a falta de controle policial”. O relatório também apontou falhas na infraestrutura do estádio.
Além da investigação, o Relatório Taylor fez 76 recomendações para melhorar a infraestrutura dos estádios, incluindo a de que todos os espectadores devem estar sentados.
Com as mudanças em ação, os times da primeira divisão, liderados pelo ‘big-five’ da época (Manchester United, Liverpool, Tottenham, Everton e Arsenal) se uniram para criar uma liga própria. Independente da Federação Inglesa, a liga podia negociar seus direitos sozinha e criar uma divisão financeira mais justa entre os times. Em 1992, 22 clubes saíram da chamada ‘Football League’ e formaram a ‘FA Premier League’.
30 anos depois, a liga mais poderosa do mundo
Atual campeão, o Manchester City dominou os últimos 10 anos de Premier League. Foto: Oli Scarff / AFP
Atualmente a Premier League é referência no mundo, movimentando bilhões de libras por ano, seus clubes são os mais ricos e possuem verdadeiras seleções de craques. Mas as tragédias que levaram antecederam sua criação jamais foram esquecidas.
Veja também
Sport EsportesSport anuncia venda do zagueiro Isac, da base, para o RB Bragantino
Com mais de 700 inscritos, Jogos da Pessoa Idosa 2022 começam nesta quarta (17)
Fonte: Folha PE