A Polícia Civil do Paraná divulgou na sexta-feira (15/7) a conclusão do inquérito que investigava o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda pelo agente penal federal Jorge Guaranho, ocorrido no domingo (10/7), em Foz do Iguaçu.
Guaranho foi indiciado por homicídio duplamente qualificado (agravado) por motivo torpe e por colocado outras pessoas em perigo. A pena para esse tipo de crime pode variar entre 12 e 30 anos de prisão.
De acordo com as investigações, o crime aconteceu no domingo (10/7), em um clube onde Arruda comemorava seu aniversário de 50 anos de idade com uma festa temática em homenagem ao PT e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Imagens das câmeras de segurança mostram que Guaranho, que declarou apoiar o presidente Jair Bolsonaro (PL), chegou ao local de carro dando gritos em direção à festa. Arruda e outras pessoas saíram em direção ao carro, e Guaranho vai embora.
Minutos depois, o agente penal voltou ao local armado e trocou tiros com Arruda. O guarda municipal morreu, e o agente penal federal foi alvejado e está internado em estado grave em um hospital de Foz do Iguaçu.
Desde que o caso veio a público, uma das principais questões em torno do crime é se ele foi causado ou não por ódio ou por motivo político. O crime ocorreu a pouco mais de três meses das eleições presidenciais e envolveu apoiadores dos dois pré-candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto mais recentes: Lula e Bolsonaro.
Políticos e até mesmo membros da família de Arruda vêm dando declarações contraditórias, ora negando que o crime tenha tido razão política, ora confirmando esta tese.
A delegada responsável pelo caso, Camila Cecconello, disse que Guaranho foi ao local da festa para fazer uma provocação de teor político aos participantes da comemoração, mas ela descartou que o crime tenha sido cometido por ódio.
“Não há provas suficientes nos autos suficientes que indiquem que ele voltou porque ele queria cometer um crime de ódio contra uma pessoa ou pessoas de outro partido político que não o dele”, disse a delegada.
O fim do inquérito da polícia civil marca uma nova fase do caso. O relatório deverá ser encaminhado ao Ministério Público (MP) que, por sua vez, ficará encarregado de decidir se denuncia ou não Guaranho pelo crime. Nesta fase, o MP poderá solicitar mais provas à polícia caso avalie necessário.
Confira algumas perguntas que as investigações sobre o caso deverão responder.
Qual foi a motivação?
Para a delegada Camila Cecconello, não há indícios de que Guaranho matou Arruda por ódio ou por motivação política. Durante entrevista coletiva sobre o caso na sexta-feira, a delegada se baseou no depoimento da mulher do agente penal federal para descartar essa possibilidade.
“O que temos é o depoimento da esposa que disse que ele ia voltar porque se sentiu humilhado porque a vítima teria jogado pedras e terras no interior do carro e acertado a esposa. O que temos é a alegação da esposa, não temos a alegação da subjetividade do autor. Então, é difícil falarmos em crime de ódio, que ele matou pelo fato de a vítima ser petista”, disse a delegada.
A advogada e mestre em Direito Juliana Bertholdi avalia, porém, que uma análise mais aprofundada de provas podem mudar a percepção sobre qual foi o motivo que o levou a matar Marcelo Arruda.
“É claro que provas como o histórico pessoal e conteúdo do seu telefone vão nos trazer indícios e informações importantes para que a gente possa definir a motivação. Em todo crime de homicídio, a gente tem um dolo. Neste caso, há uma disputa de narrativas entre uma motivação política e uma motivação gerada por uma discussão banal”, diz a advogada à BBC News Brasil.
A advogada afirma, contudo, que independentemente da conclusão da Polícia Civil, o MP pode interpretar o caso de forma diferente e qualificar a morte de Arruda como crime de ódio ou político.
“O MP tem liberdade pra decidir como vai capitular [classificar] esse delito na denúncia. O inquérito é uma das peças informativas que vão embasar a denúncia, mas ele não tem caráter vinculativo. O MP pode ir numa direção diferente”, disse Bertholdi.
Uma das principais dúvidas que surgiram desde o início das investigações é sobre se o crime teria sido premeditado.
As dúvidas surgiram após a divulgação pela polícia de que testemunhas afirmaram que Guaranho tomou conhecimento da festa de Arruda por meio de um colega que teria lhe mostrado as imagens do evento em seu celular.
De acordo com a delegada Camila Cecconello, o colega de Guaranho tem acesso às imagens das câmeras do clube por ter um cargo no local onde a festa era realizada.
Só depois disso é que o agente penal federal se dirigiu ao local da festa em seu carro junto com sua mulher e sua filha.
Outro ponto que suscitou a hipótese de premeditação é o fato de que Guaranho teria tido tempo de planejar sua ação no momento entre a primeira discussão com Arruda e o seu retorno ao local da festa.
A delegada, no entanto, descartou essa hipótese.
“É complicado falar que ele premeditou, porque a primeira vez que ele vai no local a gente vê que ele vai para provocar. Para provocar e pra falar da ideologia política dele e para provocar vítima. Nesse primeiro momento, a gente não vê que ele foi com a intenção de efetuar disparos, tanto é que ele não efetua”, disse a delegada.
Para o advogado e professor de Direito da Fundaçao Getúlio Vargas (FGV) Davi Tangerino, o MP pode requerer mais provas.
“Se achar que ainda há provas a serem produzidas, o MP deve determinar que a polícia o faça. A perícia do celular, por exemplo, pode ajudar a elucidar a questão da premeditação”, diz.
O que foi descoberto no telefone do assassino?
De acordo com a delegada Camila Cecconello, a polícia ainda não conseguiu acesso ao conteúdo do celular de Guaranho. Ela explicou que, após o agente penal federal ser internado, o aparelho foi entregue à sua mulher, que disse à polícia que só entregaria o equipamento com uma ordem judicial.
Camila disse que a polícia obteve uma ordem, e o telefone foi apreendido, mas que, por estar bloqueado por uma senha, ele teve de ser encaminhado ao instituto de criminalística que atende a Polícia Civil do Paraná.
A delegada disse que optou por não aguardar o resultado dos laudos, porque eles poderiam demorar mais tempo do que o previsto para a conclusão do inquérito: dez dias.
A advogada Juliana Betholdi diz, no entanto, que os laudos sobre o celular de Guaranho ainda poderão ser usados pelo MP antes de fazer a denúncia.
“Esses laudos não se perdem. Se o MP entender que ter esses dados é importante, ele pode, sim, ter acesso e usar essas informações no decorrer da ação penal”, diz a advogada.
A delegada da Polícia Civil do Paraná Iane Cardoso disse na sexta-feira que um inquérito foi instaurado para apurar as responsabilidades de três homens que foram filmados agredindo Guaranho após ele ter sido alvejado, enquanto estava caído no chão, depois da troca de tiros que matou Arruda.
“Os três já foram identificados, confirmaram as agressões perpetradas e foram ouvidos”, disse.
Segundo ela, a polícia ainda aguarda o resultado do exame de corpo de delito em Guaranho e dados do prontuário médico para avaliar quais danos as agressões causaram ao agente penal federal.
Dependendo do grau das agressões detectadas, o trio poderá ser indiciado pela Polícia Civil.
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