- Felipe Llambías (@felipellambias)
- BBC News Mundo
Depois de atingir lucros espetaculares durante a pandemia, o mercado de ações vem registrando um ano ruim em 2022.
Os investidores vêm sofrendo perdas, mesmo aqueles que apostaram em papéis considerados seguros, como os das empresas de tecnologia, que vinham trazendo bons resultados há anos — até agora.
No centro de Nova York, nos Estados Unidos, rodeada pelas luzes e painéis eletrônicos da Times Square, fica a Nasdaq, a bolsa de valores especializada em empresas de tecnologia. Até 15 de junho, o índice Nasdaq (que reflete as oscilações do conjunto de ações comercializadas naquela bolsa) caiu quase 32%.
“É uma das maiores quedas já sofridas pela Nasdaq em toda a sua história”, afirma Eduardo Carbajal, professor de economia e finanças do Instituto Tecnológico de Monterrey, no México. E esse cenário não melhorou no mês de junho.
Nem as chamadas “big techs”, como a Meta (controladora do Facebook), Amazon, Netflix, Apple e Alphabet (controladora do Google), escaparam, sofrendo quedas percentuais na casa de dois dígitos.
O que está acontecendo?
Os mercados são voláteis. O ânimo dos investidores, o que eles esperam que aconteça no futuro, é o que determina os preços das ações na bolsa. E, em 2022, a tendência dos investidores tem sido de desfazer-se desses ativos, porque eles entendem que não receberão o retorno esperado.
“Minha hipótese é que muitas empresas de tecnologia estavam supervalorizadas”, defende Carbajal. “Não é possível que a Tesla tivesse um valor de mercado mais alto que qualquer empresa historicamente produtora de automóveis.”
Existem vários fatores influenciando o ânimo atual dos investidores. O primeiro é a inflação alta, um fenômeno generalizado no mundo em 2022.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o índice anual chegou a 8,6% em junho, o maior dos últimos 40 anos. A inflação traz incertezas, o que é ruim para os mercados.
Para tentar conter a onda inflacionária, os bancos centrais estão aumentando as taxas de juros, o que encarece o custo de capital. Em Washington, o Federal Reserve (o Banco Central norte-americano) decidiu aumentar os juros e dá sinais que indicam que manterá essa tendência.
Isso afeta principalmente as empresas que, aproveitando as taxas de juros muito baixas dos últimos anos, receberam injeções de dinheiro.
“Quando as expectativas mudam e as taxas de juros aumentam, essas ações costumam sofrer mais que as de empresas com mais peso em índices como o Dow Jones, de companhias mais tradicionais”, explicou à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) Nicolás Max, diretor da empresa argentina Criteria Asset Management.
A alta do custo do crédito também tornou mais atraentes os investimentos em bônus do Tesouro norte-americano, o que fez com que parte do fluxo de capitais fosse redirecionado para esse tipo de ativo, que é visto como mais seguro. Mas isso esfria a economia e reduz as expectativas de lucros das empresas, tornando suas ações menos atraentes.
Esses dois fatores somados produzem uma bomba econômica conhecida como estagflação: a redução da atividade econômica com constante alta de preços. E, quando as pessoas têm menos dinheiro no bolso, elas tendem a gastar menos em artigos não essenciais.
Aliado a isso, os confinamentos impostos na China devido à covid-19, a guerra na Ucrânia e a possibilidade de novas crises sanitárias aumentam as dúvidas na equação.
As ‘big techs’
“O tamanho da queda é determinado pelas ações que têm maior peso e dominam a Nasdaq”, diz Max.
Essas gigantes da tecnologia são o Facebook, Apple, Amazon, Netflix e Google, que formam um grupo de empresas chamado de FAANG. E, além delas, existe outra empresa mais tradicional entre as grandes: a Microsoft.
“Observamos no primeiro semestre do ano quedas dos lucros com relação às expectativas de ações muito representativas dos índices de tecnologia, como o Facebook, o PayPal e a Netflix”, afirma Max.
O valor de mercado do Facebook, Apple, Amazon, Microsoft e Google somados caiu US$ 2,7 bilhões (R$ 13,8 bilhões) entre o início de 2022 e o dia 19 de maio, segundo o jornal The New York Times.
“Os preços das ações estão retornando aos seus níveis possivelmente reais”, afirma Carbajal. E as grandes empresas detêm um poder de arrasto que sempre coloca em alerta as empresas menores, que acabam caindo como peças de dominó.
O estranho nessa história é que, apesar da queda das empresas de tecnologia, elas continuam com os caixas abertos e seguem gastando.
Isso se reflete em aumentos significativos de salários para seus funcionários em 2022 e até em novas contratações em algumas empresas, além de novos investimentos em projetos, segundo vem informando a imprensa norte-americana.
“As empresas que lideram a Nasdaq são bastante sólidas e, quando tudo isso passar, elas terão forte poder de recuperação. Uma amostra são os projetos que estão desenvolvendo”, explica Carbajal.
Mas haverá recuperação?
O humor dos investidores ainda não parece ter chegado ao fundo do poço, o que afetará o preço das ações das empresas cotadas na Nasdaq.
“Daqui até o final do ano, não prevemos melhorias das condições macroeconômicas que possam nos fazer imaginar que [a queda] será contida ou que será atingido um nível mínimo”, segundo Carbajal.
Para Max, “a pergunta é se a economia americana está ou não se encaminhando para uma recessão, qual a gravidade da desaceleração econômica e, portanto, qual será o nível da desaceleração dos lucros das empresas daqui por diante. Essa incerteza é basicamente o que pesa.”
“Caso persistam as pressões sobre os preços, as autoridades monetárias dos Estados Unidos enfrentarão um cenário no qual a recessão será o preço a pagar para manter sua credibilidade intacta e as ações ainda terão um caminho a percorrer na sua tendência de queda”, conclui ele.
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