Lady Gaga, Shawn Mendes, Blake Lively, Karen Elson, Eminem, Kate Middleton e Mike Nichols — estas são apenas algumas pessoas que falaram sobre suas experiências como vítimas de bullying na escola e a dor que isso causou a elas na infância e em etapas posteriores da vida.
Meus algozes na escola eram uma dupla de Daniels, na zona rural de Yorkshire. Eles tinham o hábito de imitar e zombar de tudo o que eu dizia, de modo que eu mal ousava falar em sala de aula.
Qualquer pessoa que tenha sido vítima de bullying quando criança entenderá os sentimentos de vergonha que este tipo de experiência pode trazer. E as consequências não param por aí.
Pesquisas recentes sugerem que os efeitos do bullying infantil podem durar décadas, com mudanças duradouras que podem nos colocar em maior risco de problemas de saúde mental e físicos.
Tais descobertas estão levando um número cada vez maior de educadores a mudar seu ponto de vista sobre o bullying — de um elemento inevitável do crescimento para uma violação dos direitos humanos das crianças.
“As pessoas costumavam pensar que o bullying nas escolas é um comportamento normal e que, em alguns casos, poderia até ser algo bom — porque forma o caráter”, explica Louise Arseneault, professora de psicologia do desenvolvimento da Universidade King’s College London, no Reino Unido.
“Demorou muito tempo para [os pesquisadores] começarem a considerar o comportamento de bullying como algo que pode ser realmente prejudicial”.
Diante desta mudança de mentalidade, muitos pesquisadores estão testando vários programas para combater o bullying — com algumas estratégias novas animadoras para criar um ambiente escolar mais gentil.
Mente inflamada, corpo inflamado
Pode haver pouca dúvida de que o bullying é um sério risco para a saúde mental das crianças a curto prazo, com as consequências mais notáveis sendo ansiedade elevada, depressão e pensamento paranoico.
Embora alguns destes sintomas possam desaparecer naturalmente quando o bullying acaba, muitas vítimas continuam sofrendo um risco maior de problemas de saúde mental.
De acordo com um artigo recente da Harvard Review of Psychiatry, uma mulher que sofreu bullying quando criança tem 27 vezes mais chance de ter transtorno de pânico no início da vida adulta.
Entre os homens, o bullying na infância resultou em um aumento de 18 vezes em pensamentos e comportamentos suicidas.
“Existem todas essas associações, que são sólidas e reproduzidas em diferentes amostras”, diz Arseneault.
O bullying também tem consequências prolongadas para a vida social das pessoas: muitas vítimas acham mais difícil fazer amigos na vida adulta e são menos propensas a viver com um parceiro de longo prazo.
Uma possibilidade é que tenham dificuldade de confiar nas pessoas ao seu redor.
“As crianças que sofreram bullying podem interpretar as relações sociais de uma forma mais ameaçadora”, observa Arseneault.
Por fim, há os custos acadêmicos e econômicos. O bullying prejudica as notas das vítimas, o que, por sua vez, reduz suas perspectivas de emprego — o que significa que são mais propensas à instabilidade financeira e ao desemprego no início da vida adulta e na meia-idade.
A pesquisa de Arseneault sugere que o estresse resultante pode afetar o corpo por décadas após o ocorrido.
Ao analisar dados de um estudo longitudinal de 50 anos, ela descobriu que o bullying frequente entre os sete e 11 anos estava associado a níveis acentuadamente mais altos de inflamação aos 45 anos.
É importante ressaltar que a relação permaneceu mesmo depois que ela controlou uma série de outros fatores, incluindo alimentação, prática de atividade física e tabagismo.
Isso é importante, uma vez que a inflamação elevada pode prejudicar o sistema imunológico e contribuir para o desgaste dos nossos órgãos, levando a condições como diabetes e doenças cardiovasculares.
Juntas, estas descobertas sugerem que as tentativas de eliminar o bullying não são apenas um imperativo moral para aliviar o sofrimento imediato das crianças, como podem oferecer benefícios a longo prazo para a saúde da população.
Quando eu estava na escola no Reino Unido nos anos 1990 e início dos anos 2000, não havia campanhas sistemáticas para combater o bullying de forma mais ampla. Os professores puniriam certos comportamentos — se fossem observados.
Mas a responsabilidade era do aluno de relatar o problema, o que significa que muitos casos foram ignorados.
Alguns professores endossariam tacitamente o bullying, fechando os olhos para questões óbvias, enquanto outros — uma minoria rara, mas tóxica — se aliaram ativamente aos agressores.
Certos tipos de bullying também podem ser tolerados porque refletem preconceitos sociais mais amplos.
Por exemplo, uma proporção significativa de filhos de mães lésbicas relatou em um estudo longitudinal ser alvo de provocações ou bullying por causa do seu arranjo familiar, embora o apoio parental tenha amortecido o impacto. Os jovens LGBTQ também são mais propensos a sofrer bullying e outras agressões na escola.
As escolas, no entanto, tendiam a ignorar o bullying homofóbico no passado.
Felizmente, pesquisas em andamento podem fornecer agora algumas estratégias antibullying comprovadas que podem ajudar.
O Olweus Bullying Prevention Program é um dos programas mais amplamente testados. Foi desenvolvido pelo falecido psicólogo sueco-norueguês Dan Olweus, que liderou grande parte das primeiras pesquisas acadêmicas sobre vitimização infantil.
O programa se baseia na ideia de que casos individuais de bullying são muitas vezes produto de uma cultura mais ampla que tolera a vitimização. Como resultado, tenta abordar todo o ecossistema escolar para evitar que o mau comportamento prospere.
Como muitas outras intervenções, o Programa Olweus começa com o reconhecimento do problema. Por este motivo, as escolas devem preparar um questionário para perguntar aos alunos sobre suas experiências.
“Saber o que está acontecendo é muito importante e pode orientar seus esforços de prevenção ao bullying”, diz Susan Limber, professora de psicologia do desenvolvimento da Universidade Clemson, na Carolina do Sul, nos EUA.
O Programa Olweus incentiva a escola a estabelecer expectativas muito claras do que é um comportamento aceitável — e as consequências se violarem essas regras.
“As [sanções] não devem ser uma surpresa para a criança”, diz Limber.
Os adultos devem atuar como exemplos positivos a seguir, que reforçam os bons comportamentos e mostram tolerância zero para qualquer forma de vitimização.
Também devem aprender a identificar os locais dentro da escola onde o bullying é mais provável de ocorrer e supervisioná-los regularmente.
“Todos os adultos da escola precisam de algum treinamento básico sobre bullying — as pessoas que trabalham na cantina, os motoristas de ônibus, os inspetores”, indica Limber.
Nas salas de aula as próprias crianças realizam reuniões para discutir a natureza do bullying — e as formas como podem ajudar os alunos que são vítimas deste mau comportamento.
O objetivo, com tudo isso, é garantir que a mensagem antibullying esteja enraizada na cultura da instituição.
Ao trabalhar com Olweus, Limber testou o programa em vários cenários, incluindo a implementação em larga escala em mais de 200 escolas na Pensilvânia.
Suas análises sugerem que o programa resultou em 2 mil casos a menos de bullying em dois anos. É importante ressaltar que os pesquisadores também observaram mudanças na atitude geral das populações escolares em relação ao bullying, incluindo maior empatia pelas vítimas.
Os resultados de Limber não são os únicos a mostrar que campanhas sistemáticas contra o bullying podem gerar mudanças positivas.
Uma meta-análise recente, que analisou os resultados de 69 ensaios, concluiu que as campanhas antibullying na escola não apenas reduzem a vitimização, como também melhoram a saúde mental geral dos alunos.
Curiosamente, a duração dos programas não pareceu prever suas chances de sucesso.
“Até mesmo algumas semanas de intervenção foram eficazes”, diz David Fraguas, do Instituto de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital Clínico San Carlos, em Madri, na Espanha, que foi o principal autor do estudo.
Apesar das fortes evidências, estas intervenções ainda não foram incorporadas aos programas nacionais de educação da maioria dos condados.
“Não estamos fazendo o que sabemos agora ser eficaz”, diz ele.
Compartilhar é cuidar
O bullying não acaba na escola, é claro, e Limber argumenta que os pais e cuidadores devem estar atentos a sinais que indicam que pode haver um problema.
“Você deve ser proativo e puxar o assunto — não espere que ele apareça”, diz ela.
“Você pode fazer isso como parte de uma conversa do tipo: ‘Como vão as coisas com seus amigos? Você tem algum problema?’.”
Ela enfatiza que o adulto deve levar a sério as preocupações da criança — mesmo que pareçam triviais de uma perspectiva externa —, ao mesmo tempo que mantém a cabeça fria.
“Ouça atentamente e tente manter suas emoções sob controle enquanto escuta.”
O cuidador deve evitar fazer sugestões precipitadas de como a criança pode lidar com o problema, já que isso às vezes pode dar a sensação de que a vítima é de alguma forma culpada pela experiência.
Se for o caso, o pai ou responsável deve iniciar uma conversa com a escola, que deve elaborar imediatamente um plano para garantir que a criança se sinta segura.
“A primeira coisa é se concentrar nessa criança e em suas experiências.”
Crescer raramente será fácil: as crianças e os adolescentes estão aprendendo a gerenciar as relações sociais e isso virá acompanhado de mágoa e aborrecimento.
Mas, como adultos, podemos fazer um trabalho muito melhor ensinando às crianças que certos tipos de comportamento nunca são aceitáveis: não há ninguém para culpar, a não ser os próprios agressores.
Estas lições poderiam ter um impacto generalizado na saúde e na felicidade de muitas gerações futuras.
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